Em 25 de outubro de 2024, Call of Duty: Black Ops 6 foi lançado. Em 14 de novembro de 2025, Call of Duty: Black Ops 7 foi lançado. Desenvolvido pela Treyarch, Raven Software, Beenox, Activision Central Design, Activision Central Technology, Activision Shanghai, Demonware, Digital Legends, High Moon Studios, Infinity Ward, e Sledgehammer Games e publicado pela Activision Blizzard, é o 22º jogo principal da franquia.
Devido ao número de empresas necessárias para manter Call of Duty saindo anualmente, diferentes desenvolvedores costumam revezar a posição de liderança ano a ano. Esta é a segunda vez que dois jogos da mesma subfranquia são desenvolvidos um atrás do outro, mas a situação atual é diferente da dobradinha Modern Warfare II (2022) e Modern Warfare III (2023). Neles, a Infinity Ward cuidou de MWII (2022) com um tempo de desenvolvimento regular de três anos enquanto MWIII (2023) foi chefiado pela Sledgehammer, que teve apenas 16 meses para concluir o projeto.

O golpe duplo de Black Ops é bizarro. Ambos sexto e sétimo jogos iniciaram desenvolvimento ao mesmo tempo e ambos foram chefiados pela Treyarch pro Multiplayer e Zombies e Raven Software para a campanha, mas a disparidade entre as campanhas deles dá a entender que Black Ops 6 recebeu uma atenção muito maior da Raven do que o Black Ops 7.
Além disso, boa parte das artes em 2D de Black Ops 7 foram geradas por IA. De desenhos em gabinetes de fliperama, posters de shows e garotas estilo anime da campanha aos calling cards do multiplayer, o jogo está infestado de artes horríveis que quebram qualquer senso estético que ele poderia ter. O destaque fica para os próprios calling cards, que foram gerados com aquele pastiche que mistura os estilos da Pixar, Ghibli e algum ingrediente secreto para torná-las em abominações inconfundíveis.

Eu tenho pena do pessoal da Treyarch, mas em específico da Raven Software, que conseguiu formar um sindicato após três anos de negociação e agora devem definhar os próprios jogos com IA generativa. Esta não foi uma decisão vinda dos estúdios de desenvolvimento: a Activision Blizzard, sob controle da Microsoft, demitiu boa parte dos artistas 2D responsáveis pela arte de Call of Duty, e alegadamente forçou os restantes a fazerem um curso de IA para substituírem o trabalho de seus ex-colegas. Aquela conversinha de que IA não irá substituir empregos de artistas é cada vez mais ridícula.
BO6 teve a tarefa de conectar os fios entre o primeiro Black Ops e o quinto, Cold War. Ele fez isso com uma narrativa independente cheia de personagens novos que também trazia antigas fixações de volta como Frank Woods e Russell Adler.
Black Ops 7, por sua vez, tenta atar o segundo e o sexto Black Ops. Ele faz isso.

Nota: Esta análise contém spoilers de Call of Duty: Black Ops II (2012) e Call of Duty: Black Ops 7 (2025). Economizei desta vez.
David “Section” Mason e companhia estão de volta! E, para maximizar o fanservice, personagens que não poderiam ficar vivos ao mesmo tempo em um dos diversos finais de Black Ops II estão vivos, ao mesmo tempo!
Lembra do Menendez, um dos vilões mais marcantes e justificados da história dos videogames? The dead speak! Ele está de volta como um deepfake de IA criado pela Guild, uma organização criminosa de Black Ops 6 que virou uma empresa trilionária em algum momento dos 45 anos que separam ambos os jogos.

Por que a Guild traria de volta em 2035 a imagem de um terrorista que morreu 10 anos antes? Hmm… pra ferrar com a cabeça do Section em específico. O mundo de Black Ops 7 gira em torno do esquadrão dele, o Specter One, parte do JSOC. Section é acompanhado por Harper, Samuels (também de BOII), e uma mulher chamada 50/50, que é a única nova adição.
Este é o terceiro Call of Duty com um modo coop, mas o primeiro a colocá-lo em primeiro plano. Jogar a campanha solo significa andar por aí com o Section sozinho enquanto ele conversa com seus companheiros fantasmas como se estivessem ali. É o contrário da abordagem do reboot de Painkiller, que obriga o jogador solo a ser acompanhado por bots. É estranho!

Mais estranho ainda é o plano de Emma Kagan, a CEO da Guild. Sua escolha de Menendez como a face de uma psyop de terrorismo ativa Section como um míssil teleguiado e o faz descobrir seu plano logo na primeira missão do jogo. Qual era a jogada aqui, Kagan?

Então… a história de Black Ops 7 não quer saber disso. Ela é toda pautada no reuso de mapas e geometria passados; de campanhas e multiplayers de jogos anteriores até um mapa gigantesco da ilha fictícia de Avalon, que mais parece uma futura adição ao spinoff battle royale Call of Duty: Warzone do que algo feito sob medida para este jogo.
Tudo de Black Ops 7 parece corrido. Até o Multiplayer e Zombies da Treyarch. Para rechear a campanha num período de desenvolvimento reduzido, a Sledgehammer havia introduzido missões chamadas ‘Open Combat’ em MWIII (2023), onde o faro aguçado para cinematografia da série é abandonada em troca de missões abertas que pegam emprestado mecânicas do Warzone.

Elas podem ser divertidas. Fiquei feliz ao vê-las novamente em Black Ops 6 como missões consideradas e infrequentes! Até as de MWIII (2023) são, sabe, ok. Black Ops 7 as transborda no mapa de Avalon; diversas missões são apenas vinhetas em um canto do mesmo mapa, com inimigos posicionados sem muita direção, como numa base de Ghost Recon: Wildlands. Como você pode entrar de qualquer direção, as bases são mais pensadas para não deixarem pontos cegos do que direcionarem uma defesa efetiva. Não existe nem opção de dificuldade.
A movimentação expandida com habilidades e cooldowns não combina com este mundo militarista, mas abre o combate o suficiente para não ficar feio demais. Mesmo assim, é difícil atribuir algum senso de identidade à esta nova direção.

Não importa qual Call of Duty você jogue, suas campanhas sempre terão algo em comum: uma direção forte com foco na cinematografia e cenas coreografadas dentro da perspectiva em primeira pessoa. É algo que admiro até nos mais conturbados, como MWIII (2023). Nenhum outro jogo de tiro dirige suas batalhas como Call of Duty. Seus companheiros nas missões fornecem um norte de direção e ordens a serem seguidas e, como um soldado, você é encorajado a obedecê-las. O que importa é manter a ação fluindo.
Momentos de tensão, surpresa, ódio, espetáculo; todos são reforçados com esta estrutura rígida e linear. Ao menos você possui uma janela para improvisar e variar estratégias, mas ainda nos trilhos. Se um Call of Duty quiser tentar algo novo, ok. Como disse, o conceito Open Combat é legal para mim, e o próprio Black Ops 6 é cheio de mecânicas novas… mas o que Black Ops 7 chama de novo, eu chamo de campanha de Destiny. É mais uma tentativa de se conformar em moldes contemporâneos numa estrutura de menor orçamento do que algum semblante de inovação, seja lá o que isso significa.

São poucos os jogos que tem o puro poder monetário para fazer uma campanha em estilo Call of Duty. Battlefield volta e meia tenta fazer algo similar e a escrita sempre acaba conservadora e as missões compulsórias. Isso vale até para Battlefield 6, que tenta de tudo para capturar esta essência. Não existe substituto. Até com sua estrutura nova, Black Ops 7 possui cutscenes com uma direção mais aguçada que seu eterno concorrente… por mais que Battlefield 6 também tenha boas composições.

A maior dor da experiência de Black Ops 7 é ver o quão próximo ele chega de explorar os conceitos que apresenta. Eu amei o primeiro trailer! A ideia dos deepfakes da guilda e alucinações causadas pelo gás Cradle (introduzido em BO6) moldados para mexer com o estresse pós-traumático de cada soldado do Specter One abre espaço para meditações surreais e reinterpretações de eventos passados. Poderia ser um ótimo final para a série Black Ops!

Lembremos de Black Ops III e sua narrativa futurista, confusa, e maravilhosa onde mentes de soldados formam campos de batalha e corpos são nada mais que recipientes customizáveis. Não há tempo ou interesse para isso na narrativa de Black Ops 7.
O ritmo é acelerado, mas despido de tensão. As cutscenes são curtas e diretas. O diálogo nas missões é bruto e sóbrio. Os membros do Specter One são atacados por visões do Cradle vez após vez, e ele nunca consegue brincar com suas mentes. Quando Section vê Menendez, ele só quer tirá-lo da frente para cumprir seu objetivo. Quando Samuels revê o ataque de Los Angeles, ele só quer seguir em frente e completar seu objetivo. Os olhos nunca saem da missão principal, que é vagamente definida como ‘parar a Guild.’

Isso torna a narrativa, de certa forma, surreal. Ambos o jogador e os personagens sabem exatamente o que é e o que não é uma alucinação desde o início. Ambos também sabem qual é a missão do mundo real que devem realizar. O jogador já jogou estas missões nos Call of Duties anteriores, e os personagens também já as viram de primeira mão. Ninguém sai afetado da experiência. Não importa se alucinação é de Section, Harper, ou Samuels. Todo o esquadrão compartilha do mesmo pesadelo.

Eu me surpreendo com a missão ‘Fracture’, que molda delírios voltados para cada um dos membros do Specter One; todos momentos familiares ao jogador com a exceção do de 50/50. É o fantasma de uma missão inexistente de um Call of Duty que nunca veremos, onde, para retornarmos ao padrão Black Ops 7, todo o diálogo fica no expositivo básico. A seção acaba antes de revelar qualquer traço de personalidade da novata.

Fazem oito anos desde Black Ops 4, que foi o último jogo futurista da franquia. Eu já estava com boas saudades das narrativas militares com um quê de ficção científica especulativa com inimigos robóticos e gadgets hiperletais. Em Black Ops 7, as diversas lutas contra chefes, rememorações à-la Like a Dragon: Infinite Wealth e upgrades entregues linearmente que não fazem diferença alguma na prática parecem decisões vindas da liberdade de um conceito de futuro próximo… mas elas não vazam para a narrativa. Mesmo os flashbacks são utilizados como panos de fundo para combates em arena.
Emma Kagan, a vilã CEO da Guild, nem tem a oportunidade de se destacar como vilã. Seu plano se resume a infectar o mundo com Cradle para criar paranoia e vender a cura. Simples assim. Nenhuma motivação extra ou particularidade dela. É atípico ver uma personagem com um design tão destoante para Call of Duty agir como uma caricatura de big tech sem nem uma tentativa de explicar o que na sua personalidade a levou às tatuagens e make gótica. Não tem um único CEO da vida real tão estiloso quanto a Kagan!

É por isso que venho com um certo pesar de advogar o diabo e conceder que essa campanha, sim, foi interessante para mim. Não dou a mínima para intencionalidade! A corrida contra a Guild dos operadores do Specter One é uma sequência de fugas dissociativas onde eles mal conseguem interagir com o mundo que habitam; iniciam suas missões com um objetivo que é completado enquanto eles ainda estão fora de si. A campanha em si facilita qualquer um a entrar neste mesmo estado.

Essa regurgitação de conceitos, missões, mapas e personagens que começam e terminam no mesmo lugar é a base que define Black Ops 7. Uma cachoeira de conteúdo que ousa jogar qualquer base criativa da série fora em troca de agradar os bolsos de sua nova chefe Microsoft. Um Call of Duty onde você mata a segurança privada de uma empresa, e não soldados.

Um jogo de tiro com temática militar onde os norte-americanos não precisam nem invadir um país de terceiro mundo. O primeiro Call of Duty narrativamente inofensivo. Se Frank Woods estivesse vivo, ele estaria bem irritado, mas eu diria que insistência deste jogo em desumanizar seus soldados com seus próprios passados é bem Black Ops.
Terminei a campanha solo, e depois de novo em coop com meus amigos Avatics e YSTMaster. Na experiência solo falta tempero, e na coop falta comprometimento. Ela passa reto bem fácil quando todo mundo trabalha para moer inimigos de todo lado. Nas palavras do Avatics, este é “o primeiro CoD em que não preciso prestar atenção no que faço.” Nas palavras do YSTMaster, Black Ops 7 pode ser descrito como “post-slop.”

Em minhas palavras, Black Ops 7 é um maldito milagre. Como é possível que, nesse emaranhado de empresas, desenvolvedores, demissões em massa, um mandato de 30% de margem de lucro, uso de IA forçado, deadlines minúsculas, e um modo inteiro supérfluo conseguiu ver a luz do dia? Esta franquia recebe um jogo novo todo ano há 20 anos, e ela ainda acha novas formas de impressionar.
Endgame

Então… sobre o modo inteiro supérfluo. Você sabia que Call of Duty: Black Ops 7 possui um postgame da campanha que, na real, é um jogo completo extraction shooter coop ubigame RPG roguelike survivors instanciado que se passa num mapa de Warzone? Não estou inventando nada.
Após o final bem básico de Black Ops 7, que pega o único fio narrativo introduzido no jogo e o amarra de qualquer jeito, sobra algo. Um pequeno detalhe. A ilha de Avalon ainda está infectada com Cradle, e um novo CEO da Guild foi estabelecido. Hora de trabalhar mais.

Se o vômito de palavras acima não ajudou a descrever a experiência do Endgame, vou tentar explicá-lo com mais calma: você escolhe um personagem, entra no mapa de Avalon com apenas uma arma, e cumpre objetivos para ganhar novos níveis e armas. As partidas são temporizadas, e você só pode manter seu personagem para a próxima se extrair com sucesso ao limpar um local de pouso para uma aeronave pousar e te buscar. Se morrer ou falhar em extrair antes do tempo acabar, começa do zero na próxima partida. Ah, e você não pode machucar outros jogadores; é um modo estritamente cooperativo.

A estrutura lembra bastante a de um Ghost Recon: Wildlands, onde você pode alternar entre objetivos com toda a fluidez que o jogo pode oferecer e dentro da estrutura bem repetitiva, aproveita novas paisagens e desafios com o passar do jogo num ambiente gigantesco. A diferença é que o mundo do Endgame só pode ser explorado em partidas de menos de uma hora, tem objetivos muito mais repetitivos, mal tem narrativa, não permite stealth, não tem variação no design de encontros, e apaga todo seu progresso se o servidor cair. Pode demorar umas boas cinco, seis extrações até você ficar forte o suficiente para o chefe final do modo (ou seja, quase seis horas) na sua primeira vez. Doeu muito perder tantos personagens por problemas de servidor, ok?
O foco em elementos de RPG é a sacada mais estranha do Endgame. Você ganha níveis que vêm com seleções entre duas habilidades que chegam de forma semi-aleatória (você se prende numa pseudobuild conforme avança) para adquirir de imediato. Bem no estilo Vampire Survivors mesmo.

Para matar o chefe final, você deve ao menos ter nível 45 para aguentar a área onde ele habita, mas ainda é bem difícil matá-lo solo nessa altura. São quatro zonas no total, e a progressão entre elas é rígida. Os níveis necessários para cada zona nova dobram seu dano. Então, por exemplo, a segunda área só fica viável no nível 10, quando você ganha dano duplo permanente. Além disso, a raridade das armas também importa bastante para que você sobreviva.
É, em essência, uma esteira de progressão extrínseca. Você sai matando inimigos sem parar com a movimentação e combate impecáveis de um Call of Duty até chegar no nível necessário para terminar o modo. A sua divisão entre partidas instanciadas faz com que os últimos 15 minutos delas sejam gastos tentando achar uma extração no lugar de progredir, e o risco de perder tudo incentiva um estilo de jogo conservador e eficiente. Quando começa uma partida de Endgame, você deve virar uma máquina para performar sua tarefa.

O multiplayer de Call of Duty já tem um papel similar, não? Por trás da motivação competitiva das partidas, existem trocentos sistemas de experiência e ‘prestígio’ associados ao seu personagem e armas. O desbloqueio de novas skins de armas e calling cards requer que você complete desafios que por vezes até te atrapalham a ganhar uma partida. A satisfação de subir de nível é o suficiente para amortecer uma derrota.
Terminei o modo Endgame no nível 57, após algumas boas runs perdidas mais por desconexões que por mortes. Quando vi a arma lendária pular do corpo do chefe final, senti a mesma sensação de quando passei pro Prestígio 1. Como que os desenvolvedores conseguiram arranjar tempo para enfiar mais uma válvula de conteúdo no jogo? O Endgame tem a coragem de terminar num final em aberto para uma sequência (ou evento de Warzone). Deus, Black Ops 7 transformou seu postgame num post-slop.

Uma cópia gratuita de Call of Duty: Black Ops 7 foi concedida pela Activision Blizzard para análise no Recanto do Dragão.


