Destiny 2: The Final Shape — sonhos e esperanças | Análise

Destiny 2: The Final Shape — sonhos e esperanças

Eu tive um sonho onde eu conseguia tudo que queria.

Destiny 2: The Final Shape tem como trilha em seu trailer promocional a música remixada de forma emocionante e terrivelmente épica “everything i wanted” da cantora Billie Eilish. O que isso diz sobre o jogo Destiny 2 e mais especificamente sua talvez ultima expansão: A Forma Final?

Talvez um pouco da ideia da melancolia e de uma dor proveniente da lamúria do que poderia ter sido… um sentimento que a expansão estranhamente busca provocar no seu curto mas envolvente tempo de duração… provocando o jogador a entender os sofrimentos da mente de alguns dos personagens mais emblemáticos da série?

Honestamente eu não quero nem tentar buscar um significado denso e profundo para a música tendência de trailer de Destiny da vez, mas tenho a certeza absoluta que alguém buscou e vai continuar buscando isso na hora de colocar alguma música no trailer emocionante da vez, tal qual ocorre desde o lançamento de Destiny com Immigrant Song do Led Zeppelin.

Destiny 2: The Final Shape ou, como foi localizado aqui, Destiny 2: A Forma Final foi desenvolvido e publicado pela Bungie. É uma expansão do jogo Destiny 2 lançada em 4 de Junho de 2024 para Playstation 4/5 Xbox One, Series X|S e PC.

Falar sobre Destiny 2: The Final Shape é falar sobre finais. Não necessariamente sobre o fim da vida do jogo como serviço que é Destiny 2, mas ao menos o fim do ciclo expansional dele centrado na dicotomia entre Luz e Treva e o enfim o tão prometido embate com a figura mística e antagônica chamada de Testemunha, sendo assim o caminho fica livre para quem sabe a Bungie enfim conseguir lançar seu Destiny 3 (uau) ou coisa do gênero? Só o tempo responde esse tipo de pergunta, mas eu realmente espero que esse seja o próximo passo.

The Final Shape tem toda a sua campanha centrada nos eventos que ocorrem dentro do Coração do Viajante. Isso mesmo, a grande entidade misteriosa de formato esférico que salvou a humanidade nos tempos mais cruéis da Era Dourada. O que isso significa para como o vídeo game Destiny 2 lida com todos esses eventos? The Final Shape acaba soando como uma grande viagem onírica com dezenas de paisagens surrealistas (tem muitas mãos espalhadas aos redores) e que não se prende a uma facção ou espécie de inimigos específicos. Se aproveitando disso como uma oportunidade de diversificar o campo de batalha com inimigos que acompanharam toda a vida da franquia de dois jogos.

Ainda sim, é na presença dos novos inimigos que se renovam algumas das dinâmicas já pré-estabelecidas no loop de gameplay. A Facção dos Horrores, criações provindas de experimentos da Testemunha com a Luz e mais especificamente os Cascos, Soturnos e Tecelões são de fato inimigos cativantes na forma que interagem com o jogador nos confins da campanha de The Final Shape.

O Prismático, o mais novo poder concedido na campanha, oferece alguns bons quebra-cabeças entre os combates, e esse não é o tipo de coisa que eu falo pra todo Puzzle de Campanha de Destiny (The Witch Queen que o diga). As dinâmicas dentro da esfera mecânica de Destiny 2 se focam tematicamente nessa ideia do equilíbrio entre a Luz e a Treva pela maneira que o jogador vai se expressar no combate…apesar disso, na maior parte do tempo vai servir mais pra você quebrar o escudinho de alguns inimigos bestas.

Mas eu creio que esse seja o limiar do que eu conseguiria expressar as reiterações mecânicas e sistêmicas que Destiny 2 recebeu. Esse nem sequer é o que eu mais gosto de Destiny e de forma alguma é o foco desta análise, já que eu gostaria de falar sobre O Coração Pálido.

No Coração Pálido do Viajante habita toda a jornada do Guardião e de seus camaradas de Vanguarda. Zavala, Ikora, Corvo… e Cayde-6. Sim, aquele Cayde-6. Aquele assassinado na Expansão Renegados (que você não pode jogar nunca mais na sua vida) pelas mãos do Príncipe Uldren Sova. Cayde-6 que agora se une a aquele que um dia foi seu assassino; para entender e enfrentar os terrores e ameaças da Testemunha que espreitam dentro do peito do Viajante.

Esse talvez seja um dos arcos mais cativantes que eu já vi correr dentro da campanha principal de Destiny 2. Não por ser espalhafatoso ou sequer minimamente tenso; o elo entre esses dois caçadores foi concedido fora de tela e ainda sim, me causaram pequenos e introspectivos arrepios.

Mesmo os lapsos de descontrole e crises suicidas do Zavala são justificados ao decorrer que entendemos melhor a sua história e suas dores. Esses são arcos que cativam dentro do que Final Shape idealiza como um final justo.

The Final Shape

Ao invés de soar como o grande final épico multivérsico naquele jeitinho Avengers: Endgame que a grande indústria passou a amar e principalmente Destiny em seus tempos de Activision Blizzard, The Final Shape tenta olhar dentro do Viajante e portanto dentro de si mesmo para contar essa história.

Algo é diferente da forma que The Final Shape tenta lidar; uma ruptura emocional e estrutural que talvez só caiba em aspectos da própria franquia ser comparável à campanha de The Taken King, mas eu não acho que seria uma comparação justa. Destiny 2: The Final Shape promove como centro de sua campanha um espaço para entender um pouco a motivação e as melancolias dos próprios personagens.

Todavia imediatamente me vem a comparação súbita de como Destiny 2: The Final Shape lida com a ideia de dar fim ao seu arco à aquilo que Final Fantasy XIV: Endwalker fez. Dentro da genuína estrutura de JRPG de 60 horas que cada expansão de Final Fantasy XIV carrega, a Endwalker, que também finaliza um arco de uma década, busca em fatias largas de seu storytelling nos memorar e trazer a compreensão das ideias que personagens específicos da nossa jornada carregavam no peito, mas nunca expressaram; será que entendemos tarde demais?

Assim como Final Fantasy XIV, Destiny 2 desafiou os limites da crenças religiosas e dogmas estabelecidos pelo nosso próprio mundo e contexto que vivemos e cremos. Mas é claro que eu seria injusto em comparar o escopo e maturidade de como Destiny 2 consegue lidar com essas coisas. Final Fantasy XIV tem fórmula, espaço, tempo e dinheiro para ser introdutório, introspectivo mas ainda sim hiperbólico e impulsivo. Destiny 2 não.

Destiny nasceu do desejo de ser o videogame mais vivo da história da terra, portanto, ele já nasceu morto.

The Final Shape

A ideia de reviver Cayde-6 poderia ser a coisa mais execrável que Destiny 2 faria para fomentar a engrenagem publicitária gamer (assim como foi sua morte). Todavia, em meio as interações e que ideias sua presença estabelece, distante de Zavala e Ikora, não ficam grandes premissas ou desejos. Nem mesmo as piadinhas se encontram tão presentes em seu vocabulário quanto um dia foram; exceto em um momento que ele fala… Xablau… sim… lembra do Xablau?

Por que ser assim e não o contrário? Por que introspectivo e não exagerado e retinto de ouro que adveio de investimentos de grandes corporações focadas em criar jogos de serviço com ciclos decenais?

A resposta pode vir em diversas direções, mas principalmente em uma de extrema materialidade. Em 31 de Janeiro de 2022, foi anunciado que a Sony Interactive Entertainment adquiriria a Bungie por US$3.6 bilhões. Esse acordo se cravou em Julho de 2022 e transformou a Bungie em “uma subsidiária independente” e claro que sem demissões, já que um desses bilhões seriam utilizados para reter funcionários.

Em meio a esse processo a Bungie desenvolveu, em paralelo a The Final Shape, uma expansão bucha que se distanciaria do caminho da grande história principal, mas que permitiria o estúdio a desenvolver com mais calma sua grandiosa e épica expansão tida em seu nome como literal final. Assim nasceu Destiny 2: Lightfall. Assim caminhou a Bungie no ano de 2023…

Em outubro de 2023 a subsidiária independente Bungie desligou 100 de seus 1.200 funcionários, temendo a ideia de terem a liberdade do estúdio tomada pela Sony Interactive Entertainment. Destiny 2: A Forma Final passa a ser uma aposta arriscada não apenas para o gosto do público, mas também para a própria existência do estúdio como conhecemos.

The Final Shape

Assim estamos nos dias de hoje, assim estamos acompanhando o lançamento desse esforço coletivo chamado Destiny 2: The Final Shape. Mas o que isso diz respeito a minha experiência com o fruto desse trabalho que é produto de um ambiente que se esforça para industrializar aquele que produz tal qual um artesão produz seus artesanatos? O que já foi Destiny e o que é Destiny agora?

No fundo do meu peito e da quase uma década que eu jogo e me divirto em Destiny, apenas finalizando as campanhas e aproveitando só de uma fração dos conteúdos que se derivam de “se divertir com o Looting, Shooting e estatísticas e incentivos neurais satisfatórios do ato de dar tirinho no jogo” eu realmente me diverti e senti lapsos de gratidão em acompanhar aquele momento.

Presenciar a Excisão e compreender os sacrifícios e ações que levaram àquele final podem não ser necessariamente a coisa mais grandiosa que Destiny 2 já fez em sua existência, mas foi nisso que ele entendeu a importância de compreender o que acontece dentro de nosso coração, tal qual exploramos os confins do coração do Viajante.

É sobre valorizar as relações que fizemos dentro e fora do jogo que The Final Shape se encerra de forma digna. Acaba por não ser uma campanha maravilhosa e sem erros sequer, já que a natureza de como a estrutura em que Destiny funciona induz ao erro de forma contínua e ininterrupta em seu funcionamento.

Eu espero que as pessoas que desenvolveram e ainda trabalham em Destiny 2 estejam gratas por seu jogo. Eu espero que as pessoas que trabalharam em Destiny 2, mas tiveram seus empregos tomados pela dança de cadeira empresarial especulativa encontrem o seu lugar no mundo. Eu espero que todos aqueles que jogaram Destiny se divirtam no ato de jogar e interagir com essa franquia.

E, acima de tudo, eu espero que Destiny consiga contar uma nova história, uma boa história que diga cada vez mais sobre aqueles que desenvolvem o jogo. Para enfim se libertar das estruturas roteirísticas formulaicas baseadas em preceitos religiosos maniqueístas de personagens militares e atrozes; aqueles que destroçam seus inimigos repugnantes que vieram de outro lugar do mundo em nome de uma fé ou qualquer outra abstração. Eu espero que eles possam contar as suas próprias histórias, e eu realmente espero ouvir sobre elas, cada uma delas.

Eu espero que cada pessoa tenha sua história contada, e eu espero um dia ouvir a sua.

Uma cópia gratuita de Destiny 2: The Final Shape para a plataforma PC foi concedida pela Bungie para análise no Recanto do Dragão.