Kojima ½ — Investigando o caos da participação de Hideo Kojima na BGS 2025

Kojima ½ — Investigando o caos da participação de Hideo Kojima na BGS 2025

Com um mercado cada vez mais competitivo e sufocante, eventos que superam uma década como a Brasil Game Show não evitam sua própria porção de complicações. Na tentativa de ganhar destaque e mais uma vez alavancar sua posição de prestígio entre os grandes eventos de games na América Latina, a BGS 2025 arriscou trazer o diretor-celebridade Hideo Kojima para uma agenda repleta de ações, incluindo um encontro com fãs, um Q&A aberto um convite para participar do júri em um Desfile de Cosplay. Também trouxeram como peças-chave da edição o diretor Naoki Hamaguchi, conhecido pela trilogia Final Fantasy XIII e remakes de Final Fantasy VII, e a lendária compositora Yoko Shimomura de Kingdom Hearts, Parasite Eve, e diversos outros.

O evento, no entanto, demonstra cada vez mais dificuldade para justificar sua dimensão, optando pela troca de espaços – dos cinco pavilhões do Expo Center Norte (aprox. 80 mil m²) aos do Complexo do Distrito Anhembi (aprox. 67 mil m², excluindo a marquise de 7.911 m²). É uma redução de cerca de 15% – e uma presença cada vez menor das grandes distribuidoras e figuras conhecidas da indústria. A Xbox optou por se ausentar a partir de 2022 e a PlayStation vem fazendo apenas ativações de pequeno escopo desde 2023.

Apesar disso, a redução de escala e de ilustres presenças não é acompanhada por uma redução do hype ou de visitantes, levando a um conflito de expectativas versus realidade que começa a desabrochar na comunidade. A edição deste ano terminou com uma reputação notoriamente negativa pelo público geral. Foram alegadas falta de organização por parte da feira, despreparo e ausência de comunicação em relação às oportunidades oferecidas para conhecer estes convidados, agravada pelo desastroso Meet & Greet de Hideo Kojima que ocorreu no sábado (11). O encontro marcado não apenas foi organizado de forma caótica, como ainda é envolto de muito mistério e desinformação; considerando isso, o Recanto do Dragão buscou iluminar a história do que aconteceu naquele dia.

A Circunstância Kojima

Com uma margem de 1h30 de antecipação, o Portão 1, dedicado à visitantes VIP, Cosplayers e Imprensa foi aberto. De imediato, começou a correria da multidão que ansiava por garantir sua vaga na fila do Meet & Greet TCL. Menos de cinco minutos se passaram e uma fila considerável cercava todas as entradas frontais do estande, possivelmente superando as limitadas vagas que seriam atendidas por Kojima. Era um oceano de fãs; de influenciadores a cosplayers, trajados com adornos da Kojima Productions, colares, pôsteres, jogos e bandanas, até mesmo com algumas réplicas de BB Pods em escala real. Mas a recepção à todos foi como tomar uma porta na cara.

Na ponta das filas, convergia uma massa de visitantes exasperados que rodeavam uma funcionária terceirizada do evento, que se dispôs a explicar a situação para todos, conforme publicado pelo influenciador Felipe Goldenboy no X. Segundo ela, aproximadamente às 6h da manhã, a equipe da BGS passou a recolher visitantes que já estavam aguardando pelo início do evento do lado de fora do Distrito Anhembi, direcionando-os ao pavilhão do Portão 5 (público geral), onde ocorre a Cerimônia de Abertura (diariamente às 11h30). Lá, entre as 6h e 10h da manhã, houve a distribuição de 200 pulseiras aos primeiros que chegaram no local do evento, além da catalogação de cada indivíduo junto de seu documento pessoal e um item que gostaria de presentear ou ter autografado por Kojima. 

Áudio extraído de vídeo do TikTok, para preservar anonimato da funcionária.

“Como o evento tinha previsão de abertura para 13h, eu cheguei às 10h30 da manhã, um horário que achei razoável. Até porque, quando cheguei ao estande e me deparei com uma fila grande, ainda assim estava bem próximo do início. […] Montamos uma fila informal e aguardamos lá, até que às 15h outras pessoas começaram a se aproximar e nos informar sobre a existência das pulseiras, de que provavelmente não conseguiríamos falar com o Kojima e que elas foram distribuídas durante a manhã.” – Relato de visitante

“Estava bastante gripada, então não fui tão cedo quanto gostaria […] mas o evento só abre cerca de meio-dia para VIPs, então não tem porque chegar às seis da manhã. Até porque é a primeira vez que a BGS acontece nesse lugar (Distrito Anhembi), então eu não tinha ideia de que horas abriria, de como era a estrutura do local. Cheguei cerca de 9h ou 10h e fui para a fila de sempre (do Portão 1), e ninguém sabia sobre como seria no Meet & Greet, apenas que seria no palco da TCL e é isso. Fomos revistados e esperamos num cercadinho até umas 11h30; quando abriu, nunca corri tanto na minha vida. Cheguei no palco da TCL e fiquei em algo como a décima pessoa da fila. Tava explodindo de felicidade… mas aí vieram nos informar de que tudo já havia sido distribuído e que não adiantava mais tentar.” – Luma Victória (@lumavs)

A história foi corroborada por um visitante que conseguiu uma pulseira, e preferiu não ser identificado. Ele relatou ao RDD que um funcionário rondava o lado externo do evento em busca de interessados pelo Meet & Greet, conduzindo-os à área onde ocorreria a distribuição. Ele afirmou que “sabia da distribuição de senhas pois acompanhava as notícias no Instagram da BGS e no aplicativo”, e presumiu que deveria chegar cedo para entrar no evento e ficar à frente da fila do estande Meet & Greet TCL, mas foi tranquilizado quando encontrou a baixíssima movimentação fora do evento ao chegar às 8h da manhã, sendo então encaminhado para o salão da cerimônia.

Em conversa conosco, o youtuber Blader Koyotte explicou que foi necessária a apresentação do ingresso do evento para ter acesso ao salão; finalizada essa distribuição, todos os visitantes foram orientados para retornar às filas de fora, aguardando normalmente até o horário da Cerimônia de Abertura. Foram também tranquilizados com relação a necessidade de comparecer ao Meet & Greet apenas no horário especificado de abertura (17h).

“Tinham aberto o Portão Cinco, a entrada de quem tem ingresso comum, onde precisava passar por várias grades e entrar no salão da Cerimônia de Abertura da BGS. Ali, bem do lado do palco […] tinham várias cadeiras, mas não havia nenhuma sinalização ou indicação de que seria ali a distribuição das pulseiras para o Meet & Greet do Kojima. […] A gente precisava mostrar o ingresso ou uma credencial, passar por uma catraca e sentar em uma das cadeiras. Eles pediram nosso documento, tiraram uma foto da pulseira junto dele para “comprovar” que éramos donos. […] Nisso esperei até umas 11h, fui uma das últimas fileiras a receber.” – Blader Koyotte

  • Youtuber Blader Koyotte com um inscrito no local onde foram distribuídas as pulseiras.

Olhemos pela perspectiva contrária, a dos desavisados: a Brasil Game Show “abriu” no sábado do dia 11 de outubro apenas às 13h. Neste horário, a fila do Meet & Greet de Hideo Kojima já estava lotada de pessoas. Muitas sequer sabiam da existência das seletas pulseiras distribuídas. Milhares de fãs, cosplayers e turistas que entravam no evento ficavam abalados com descontentamento e frustração, tentando compreender o que ocorreu durante a manhã e, ainda por cima, se tal informação sequer era verdadeira. Seria um dia de gastos e despachos em vão. A confirmação veio apenas às 13:42, quando o aplicativo da Brasil Game Show notificou que “os fãs chegaram na madrugada e esgotaram as vagas para o Meet & Greet”.

Cerca de 14h15, Hideo Kojima participou de uma coletiva de imprensa com membros seletos de portais de notícias que estavam cobrindo a BGS. Pouco depois, concedeu apenas duas entrevistas exclusivas, uma para a Rolling Stone Brasil e outra para a Revista GQ

No entanto, em meio ao caos, novas filas ainda eram fomentadas pelas informações conflitantes oferecidas à alguns, e pela incredulidade de outros frente à forma como a notificação foi orquestrada e veiculada ao público. Em nome da “esperança” de ainda conseguir um espaço na agenda do diretor, múltiplas massas desorganizadas percorriam os entornos do estande, ainda com diversos cosplayers e fãs que afirmavam ter ido ao evento “exclusivamente para ver o Kojima”. 

Cerca de 14h30, o caos tomou uma nova forma: na tentativa de unificar as centenas de pessoas que embrulhavam a estrutura, que bloqueavam todas as suas entradas e direções possíveis, um cosplayer optou por enumerar as mãos de cada um dos mais de 250 presentes por “ordem de chegada” com uma caneta, unificando as massas em uma fila única que praticamente cortava até o fim do pavilhão. Por conta de sua extensão, a fila saiu tanto do controle que, quando questionadas pela equipe do RDD, as pessoas que estavam nela sequer sabiam nos informar sobre a existência das pulseiras ou se ainda havia disponibilidade de vagas para o Meet & Greet, e negavam terem sido informados apropriadamente pelos funcionários do evento. O RDD tentou entrar em contato com o cosplayer responsável pela fila, mas não obteve respostas.

A equipe também tentou entrar em contato com diversos funcionários do estande do Meet & Greet e de outros setores do evento, e fomos informados que houveram “múltiplas tentativas” de informar a todos e dispersar as filas, justificando que não havia razão para fazerem aquilo além de “atrapalhar o fluxo do evento”, mas que estes “se recusaram a dispersar por vontade própria”. No entanto, visitantes nos relataram que não houve tal comunicação. Sequer sabiam se a fila secundária dos enumerados pelo cosplayer era real, se este era ou não um funcionário do evento, e que os comunicados dedicados à dispersão das filas não foram apropriadamente veiculados pelas caixas de som ao redor do estande.

“A falta de informação e transparência foi tanta que chegou a um ponto de ter quase três filas cercando as laterais (do estande). Então, ficamos quase a tarde inteira perdendo o evento em uma fila que nem existia. Isso se agravou às 16h quando alguém veio com crachá “da administração” [incorreto; era o cosplayer portando um crachá VIP] chamou a todos e começou a enumerar nossas mãos, como uma senha para a segunda fila, que no fim das contas foi barrada quando houve o início do Meet & Greet.” – Relato de visitante

Aos 6:59, o youtuber “Ruivo” percorre toda a fila secundária que havia se formado, cruzando até praticamente o fim do pavilhão.

O tempo passou e nada aconteceu. Às 17h, o telão do Meet & Greet TCL finalmente comprovava que as vagas do “Criador de Jogos Hideo Kojima” haviam “ESGOTADO”, e então ele atenderia sua função de exclusivamente tirar fotos com os 200 selecionados. Nos arredores, centenas de pessoas trajadas à ocasião, imbuindo criações pessoais de Death Stranding, Metal Gear e afins gritavam sem parar; não eram apenas urros por gratidão ou felicidade de encontrar seu ídolo, mas também vaias uníssonas contra o evento, enquanto Kojima se apresentava no palco. O coro ecoava xingamentos ao evento, dando vazão ao rancor acumulado pelos que se sentiram lesados pela organização. Foram necessários alguns minutos para as vaias se transformarem em aceitação. Gritos ao Kojima foram retomando o ambiente enquanto o convidado agradecia o carinho da plateia. Ele chegou a pilotar um drone para incluir todos num vídeo panorâmico.

O momento esperado por todos chegou: com a abertura oficial do estande para os que haviam obtido a pulseira, a enorme fila secundária finalmente se dissolvia nos arredores. Segundo o relato de Blader Koyotte ao RDD, o procedimento esperado foi mantido, mas o volume de entrantes foi tanto que o protocolo de segurança rapidamente foi abandonado: “(os seguranças) falharam por não verificarem os números das pulseiras e as identidades, como feito no momento da distribuição. O funcionário só verificou se a pulseira havia sido rompida ou algo do tipo.” Em meio à desordem, um visitante chegou a entrar no Meet & Greet portando uma pulseira falsificada em casa.

“Na hora de entrar no Meet & Greet, eles conferiram minha pulseira e meu documento, mas apenas porque fui um dos primeiros […], já tinha combinado com amigos para chegarmos cedo e evitar o tumulto. Na medida que outros foram entrando, começou a ficar muito agitado, os seguranças começaram a apressar para não atrasar muito e é certo que nesse momento o rapaz que falsificou a pulseira conseguiu entrar. Aumentaram o fluxo e não conseguiram mais verificar os documentos. No meu caso, apenas conferiram pois fui um dos primeiros.” – Lucas / Blader Koyotte

O falsificador a quem Blader Koyotte se refere revelou seu plano de infiltração passo-a-passo em seu Instagram pessoal. Em conversa com a equipe do RDD, comentou que havia adiado sua chegada ao evento ao se deparar com a “tremenda decepção” de que as pulseiras haviam sido distribuídas de manhã sem a divulgação adequada, mas que conseguiu um scan da pulseira verdadeira através de um conhecido. Assim, tomou a iniciativa de reproduzi-la e adulterá-la no Photoshop. Ele a imprimiu em papel sulfite para só então ir ao evento.

O visitante, que preferiu não se identificar, confirmou a situação descrita por Blader Koyotte durante a abertura do Meet & Greet. Segundo ele, “havia um mar de gente do lado de fora das grades. Parecia um empurra-empurra infinito até chegar ao final e mostrar a pulseira branca no braço para entrar. [Para mim] foi só isso que foi preciso, e a partir daí já era garantido que eu conseguiria a foto, sendo que a fila andou bem rápido.”

Não bastasse a situação, relatos de insatisfação com a forma como o tão aguardado encontro com fãs foi conduzido passaram a circular, com os empulseirados exclamando que houve excesso de pressa e frieza com participantes, a ponto da ação terminar cerca de 20 minutos mais cedo que o previsto. Segundo o visitante de pulseira falsa, “os seguranças recolhiam (quaisquer pertences) e repetiam de forma séria que não era permitido tocar, falar, pedir autógrafo ou dar presentes diretamente ao Kojima. E assim que a foto era tirada, mandavam sair depressa do palco.” Tal relato foi corroborado por Blader Koyotte:

“Acho que a organização foi completamente desesperada, porque tinha tempo de sobra. […] Os (organizadores) estavam nos apressando demais, como se fôssemos uma esteira industrial: não era permitido trocar palavras, não podia levar (nenhum objeto) para tirar foto com ele e, claro, não teve autógrafos. Por exemplo, queria tirar uma foto com um livro em mãos, e não permitiram. Eles pegavam nossas mochilas, deixavam num canto e deixavam recolher só depois da foto. […] Foi totalmente anticlimático. Não ligavam se os fãs chegavam a olhar nos olhos do Kojima, não deu nem tempo pra nada. Uma experiência totalmente crua, (um tratamento) horrível, e eu acho inacreditável, inaceitável o pessoal ter sido feito de trouxa com aquela fila fantasma.” – Blader Koyotte

Passado o encontro, restava apenas uma mistura de regozijo com amargura, visto que muitos seguiam sem compreender o que havia acontecido na manhã daquele sábado. “Logo depois da foto, alguns inscritos começaram a me chamar na grade (fora do cercado do estande) para explicar como consegui minha pulseira, como tudo aconteceu, e isso foi muito chato”, lamenta Blader.

“Fiquei feliz que o Kojima foi muito receptivo com os fãs; quando o primeiro foi tirar foto, (o visitante) estendeu para dar um aperto de mão, e o Kojima apertou, mas depois disso os funcionários começaram a insistir que “não pode tocar nele, não toquem nele”. O Kojima em si foi muito receptivo, ficou até surpreso quando subi com o colar do Death Stranding […]. Ele cresceu no meu conceito depois disso. […] Mas, quanto à BGS, eu realmente não tenho consideração nenhuma pela organização do evento, porque ela foi terrível, realmente péssima.” – Blader Koyotte

No dia seguinte, 12 de outubro, Hideo Kojima marcou presença na BGS durante a tarde, dessa vez com o compromisso de ser júri de um Concurso de Cosplay tematizado em Death Stranding, onde os cosplayers participantes tiveram a chance de conhecê-lo.

Depois disso, é claro, o evento acabou e o diretor continuou suas aventuras Sudeste afora, visitando o Rio de Janeiro para curtir um pouco mais do Brasil. Mas, para o público geral, o descontentamento se alastrou como fogo: grupos de Whatsapp preparando processos coletivos e reclamações no PROCON foram criados. Mesmo algumas teorias da conspiração começaram a se difundir entre os mesmos. Como as pessoas sabiam destas pulseiras? Afinal, a organização da BGS nunca oficializou elas em suas mídias sociais.

A teoria da conspiração das “informações privilegiadas”

21h. Sábado encerrado. De acordo com investigações da equipe do RDD, além do que foi relatado anteriormente, resta apenas desmistificar uma teoria da conspiração e elucidar uma ocasião em torno dos eventos que aconteceram da noite de sexta-feira ao fechamento do evento no sábado: a tese de que houveram “informações privilegiadas” disseminadas a uma panelinha de influenciadores e jornalistas,  além das teorias em torno da “festa da  IGN Brasil” e o encontro de influenciadores no escritório da PlayStation Brasil, que incluíram a apresentadora Bagi e o casal de influenciadores Akihito, sósia brasileiro do Kojima, e a maquiadora Annye, que toparam conversar com a equipe do Recanto do Dragão.

Começando pela teoria: seriam os 200 selecionados, agraciados com pulseiras que concedem acesso ao Meet & Greet, participantes de uma “panelinha secreta”? Grandes criadores de conteúdo que “por acaso” conseguiram roubar a vaga dos verdadeiros fãs? Diversas acusações foram direcionadas aos influenciadores e à imprensa como um todo, sob suspeitas infundadas de que informações privilegiadas circularam entre estes, particularmente culpabilizando participantes de uma festa realizada anualmente pela IGN Brasil na noite da sexta-feira. 

Com relação a isso, a equipe do RDD conversou com fontes que estiveram no local. Segundo relatos obtidos, o público presente era majoritariamente composto por profissionais da indústria que não necessariamente frequentariam todos os dias do evento, muito menos tinham interesse ou intenção de participar do Meet & Greet. Além disso, foi ouvido o argumento de que a festa terminaria na madrugada, e “ninguém iria se dispor a sair da festa 3h, 4h da manhã só para ir direto ao evento logo às 7h”.

Nossa equipe, que acompanhou as movimentações dentro e fora do núcleo de imprensa ao longo do dia, também constatou que o volume de jornalistas e influenciadores portando uma pulseira era bem rara. Um dos jornalistas (que não obteve uma pulseira) chegou a constatar que, mesmo com a oportunidade de dividir uma sala privada com a equipe de Kojima mais de uma vez, não foi capaz de sequer tirar uma foto individualmente com o criador, por conta de sua agenda e protocolos de segurança restritivos. Dito isso, não foram encontrados quaisquer indícios de que tenha ocorrido algum “vazamento de informações” ou favorecimento a participantes específicos do evento.

Tal conclusão é corroborada pelo youtuber Blader Koyotte e pelo próprio sósia do Kojima, Akihito. Ao RDD, Blader argumentou que ninguém do evento tinha qualquer conhecimento concreto para oferecer sobre os procedimentos quando eram questionados em dias anteriores, e que o único privilégio oferecido pela BGS foi sua credencial de criador de conteúdo com passe livre para todos os dias.

“(Ser influenciador) não afetou em nada conseguir acesso ao Meet & Greet. Meu canal talvez tenha a maior concentração de fãs hardcore do Kojima no Brasil, então é previsível que em certo nível alguns que chegariam lá mais cedo também tentariam me avisar antecipadamente. Meu amigo insistiu pra caramba, e foi só por isso que consegui. […] E, de fato, quando cheguei lá, tinham pelo menos uns 10 inscritos do canal, um até tirou foto comigo na fila. […] E assim, o fluxo de chegada de pessoas era muito baixo porque essa informação não foi difundida nos lugares, sabe? O Kaká (Vieira) do Ataque Crítico também só conseguiu porque eu o avisei. […] Tinham muitos visitantes comuns ali, que não eram fãs malucos pelo Kojima, sabe? Os que só viram a fila, perguntaram do que se tratava e decidiram ficar ali, mesmo não sendo ultra fã do cara. […] Onde estão esses tais influenciadores priorizados pelo Meet & Greet? Porque o Bruno Correia, a Bagi, a Ana Xisdê e o Akihito só conseguiram oportunidades graças à PlayStation Brasil, não teve nada ver com a BGS, e olha que eu e o Kaká nem temos números astronômicos, só somos influenciadores médios no máximo.” – Blader Koyotte

Na noite do dia anterior, os influenciadores Blader e Tulkas chegaram a perguntar aos funcionários responsáveis por organizar as filas do Meet & Greet sobre como seria a condução do grande encontro no dia seguinte, e o funcionário afirmou que nada havia sido decidido até o momento. 

“Eles iriam realizar uma reunião depois do fechamento do evento, às 21h, para decidir como seria feito no sábado. Estavam com receio (de distribuir as pulseiras) dentro do evento, pois seria injusto com quem teria credencial VIP, de Imprensa, Cosplayer e tudo mais, já que conseguem acesso com uma hora de antecedência. Também estavam pensando em anunciar a abertura da seleção durante o evento, quando todos já estivessem dentro, mas essa escolha obviamente seria terrível porque geraria uma correria danada, muitas pessoas seriam pisoteadas porque todos correriam até o estande na força bruta.” – Blader Koyotte

Kojima²: o relato de Akihito e Annye sobre o encontro dos “Kojimas”

O Recanto do Dragão presenciou toda a ação dos cerca de 40 minutos de Meet & Greet (do lado de fora do estande), acompanhando a comoção pública, e foi onde tivemos a oportunidade de pessoalmente conhecer Akihito, o “Kojima brasileiro”, além da maquiadora Annye Souza, que fazia o papel de videomaker do casal, ambos envoltos por uma maré de fãs que tentavam se aproximar para pegar uma boa vista do “Akihito japonês” no palco. Em meio à aglomeração, estava também uma mãe com seu bebê chamado Hideo, e até mesmo os dubladores da localização brasileira de Death Stranding 2, que surfavam pelos fãs na tentativa de chamar a atenção do rockstar dos games e tirar fotos com o sósia.

Em entrevista concedida exclusivamente ao RDD, Akihito e Annye afirmaram que o plano era desde o início fazer brincadeiras e interagir com fãs fora do estande durante o Meet & Greet, visto que sequer poderiam comparecer ao evento cedo para tentar assegurar vagas no encontro por morarem longe do evento, além de tratar de compromissos pessoais no dia. Durante a conversa, ressaltaram que lidaram com todos os problemas de qualquer outro visitante, afirmando que não houve nenhum tratamento “especial”: mesma entrada, mesmos acessos, mesmos horários, mesma experiência. Enquanto estavam no Meet & Greet, um fã até chegou a levantar o sósia nos braços para conseguirem a atenção de Kojima, mas o ato foi rapidamente barrado por um bombeiro no estande.

“Estavam apenas fazendo seu trabalho, e uma funcionária até tentou nos ajudar a chegar mais perto do palco, enquanto passavam alguns dos presentes de fãs da fila (que não foram entregues à Kojima) para o Akihito” – Annye Souza

“Foi como se eu estivesse invisível.” – Akihito, o Kojima do Brasil

Em relação à comunicação com a organização da Brasil Game Show, o casal confirmou que não obteve sucesso em nenhuma das aproximações e sugestões feitas ao evento, nem mesmo as sugeridas pela equipe da PlayStation Brasil. Houveram apenas duas exceções: um espaço concedido para a realização de um mini-Meet & Greet com Akihito na quinta-feira (9), oportunidade conseguida por um colega do casal que trabalha em uma agência relacionada ao evento, e a tentativa frustrada de fazer uma finalização especial durante o Desfile de Cosplayers do domingo, fazendo alusão ao meme do “Absolute Cinema”, mas que possivelmente foi barrada por razões de direitos autorais. Segundo Annye, um dos jurados chegou a ser impedido de participar com seu cosplay de Snake, visto que as imagens estavam sendo capturadas para utilização oficial da Kojima Productions, atualmente sem vínculos com a Konami.

O mesmo problema de Uso de Imagem e Direitos Autorais foi levantado no encontro promovido pela PlayStation Brasil com outros influenciadores em seu escritório, o qual foi palco para diversas cenas icônicas entre os “Kojimas”. O casal relembrou de um momento em que, ao encontrar os dois, Kojima tentou por iniciativa própria fazer uma dancinha de TikTok, mas a equipe não permitiu sua publicação por conta de possíveis violações atreladas à sua imagem (conforme ilustrado pelo casal nessa postagem).

Falando sobre a oportunidade desse encontro, os influencers afirmaram que praticamente todas as movimentações foram graças à PlayStation Brasil, através da plataforma de influenciadores Playmakers, por onde apresentaram seu trabalho e foram então convidados para o evento exclusivo. Akihito nos conta que a aproximação teve início desde junho, e a PlayStation Brasil já havia expressado o interesse de aproveitar a união para fazer postagens especiais, incluindo a icônica pose dos Homens-Aranhas se apontando; o casal expressou gratidão por ter um “contato muito constante” e reuniões tanto para integrá-los à plataforma de influenciadores, quanto para prepará-los para o grande encontro com Hideo Kojima, sempre tranquilizando-os sobre os processos necessários.

Relatos de fontes que estavam no local afirmaram ao RDD que o foco do encontro foi a gravação dos conteúdos entre Hideo Kojima, a equipe de dubladores brasileiros, a influenciadora Bagi e o casal Akihito e Annye, sem oportunidades de fotos individuais ou uma coletiva de imprensa, além de uma foto em grupo e alguns brindes distribuídos.

“A PS Brasil foi quem fez tudo acontecer MESMO. Soube quando estava no Flow que eles tinham feito solicitações formais (à Kojima Productions), incluindo meu arroba e conteúdos que produzimos, para que esse encontro acontecesse na BGS, mas só ficamos sabendo mesmo na semana do evento.” – Akihito

O evento causou amargor entre seus visitantes, mas a presença de Akihito e Annye acalentou as mágoas dos fãs que os avistaram.

“Todo aquele carinho que o público não conseguiu direcionar ao Kojima […] foi direcionado ao Akihito, então recebemos muito carinho, tiramos muitas fotos, ouvimos relatos de gente falando que o ‘dia estava péssimo’;  […] mas no fim, nós pelo menos conseguimos trazer um pouco de quentinho pro coração da galera. Tivemos muitas interações e inclusive ganhamos muitos presentes que não conseguiram dar para o Kojima, e então deram para o Akihito… muito desse carinho que as pessoas têm pelo Kojima se refletiu em nós, e vivenciar essa comoção foi ótimo.” – Annye Souza

“(A recepção do público) foi super positiva. Você vê todos os engajamentos, as pessoas que vieram nos parabenizar. Foi imensamente positivo, mas o mais louco de tudo foi a identificação. Vi que teve uma conexão minha com o Kojima que fez com que o povo brasileiro se sentisse validado, tipo “não consegui falar com ele, mas pelo menos falei com o ‘Kojima brasileiro’ e ele conseguiu ver o Kojima real”, então as pessoas se sentiram validadas de tabela, como se todo o amor dado pra mim tivesse se transferido ao Kojima. Uma verdadeira reciprocidade com o povo brasileiro.” – Akihito

Mas, como nem tudo é feito de flores, não se pode esquecer do que ocorreu durante o evento. Annye finaliza criticando a postura pouco proativa da BGS, comentando sobre desencontros e resistências do evento em aproveitar a oportunidade para gerar ações únicas com visitantes:

Acredito que a organização perdeu bastante com a oportunidade de criar uma movimentação legal envolvendo o público, criar uma comoção de ‘nossa, olha o Kojima sósia encontrando o Kojima real!’ ou mesmo de fazer brincadeirinhas com o sósia enquanto o Kojima não conseguia estender tanto a agenda no evento.” – Annye Souza

Rescaldos do evento… e agora?

O zeitgeist dos eventos da indústria dos videogames, que se expandem constantemente ao longo dos anos, é algo difícil de ser capturado numa fotografia e então compreendido por completo. Eventos como a Brasil Game Show fazem suas movimentações para abraçar um público cada vez mais diversificado, com as mais diferentes expectativas, de diferentes pontos da América Latina. Porém, tentar abocanhar tudo também deixa muitas bolas caírem por terra.

A equipe do Game Lodge, a quem agradecemos pela ajuda e participação na produção desta reportagem, realizou um formulário de perguntas para o público geral que estava presente e as respostas apontavam com alguma clareza a opinião pública sobre a continuidade do evento.

Uma maioria considerável dos participantes do levantamento desejava encontrar os seus ídolos internacionais dos videogames e da cultura pop, além de presenciar novidades da indústria; no entanto, a sensação de vivenciar o evento não foi boa. Seja a frustração com a organização, seja a falta do que fazer: poucos brindes, poucos convidados internacionais, nenhum lançamento ou grande novidade. 

Acompanhamos ao longo do mês grupos de consumidores revoltados com o drama envolvendo a presença de Hideo Kojima. Alguns conseguiram receber o reembolso do próprio ingresso (dentro do prazo estipulado de sete dias), por se sentirem lesados na forma como foi oferecida a oportunidade de conhecer o ídolo.

Ao tentar agradar à todos, a BGS aparentemente agradou a poucos. Sobra então a sensação aos veteranos do evento de que a BGS é quase equiparada com uma data festiva anual, onde velhos amigos se reencontram e podem passear nos corredores lotados de produtos, atrações e visitantes.

Todo esse andar da carruagem corrobora com uma ideia que se desenvolve em todos os setores da grande indústria de games. Fragmentos de um colapso iminente de um grande mercado especulativo de jogos eletrônicos. 

Esta foi “a maior BGS de todos os tempos”, mas só em tamanho de B2B. De resto, diminuiu em todos os outros sentidos possíveis. Sua grande fonte de comoção pública foi uma intransigência e indisponibilidade em lidar com os seus próprios problemas organizacionais.

Ao longo da reportagem, a equipe do Recanto do Dragão tentou contato presencialmente e virtualmente múltiplas vezes com membros do Meet & Greet TCL e da organização do evento, mas não obteve respostas.

Reportagem editada por @drinkrust! Foto de capa por @lanyaners!