Kung Fu Panda é uma das minhas franquias de filmes favoritas. O seu segundo filme não é só meu favorito da franquia, mas o meu favorito no geral. Kung Fu Panda me ensinou muito sobre eu mesma, e sempre foi muito importante pra mim. O primeiro filme ilustra poeticamente a sua mensagem, usando um protagonista muito bem construído para representá-la. Po é desastrado, brincalhão, engraçado e nada convencional, mas essas coisas são forças que só ele pode trazer, que o faz especial. A mensagem do primeiro filme diz que você é especial, por ser você mesmo. Não existe um ingrediente secreto, porque algo é especial somente por você acreditar que é especial, por ser o que é. É isso que significa ser o Dragão Guerreiro, e o Po só é o Dragão Guerreiro por ser o Po, e mais ninguém pode ser quem ele é. Ele é especial mesmo sem poderes especiais, apenas um panda gordinho amigável e engraçado. O primeiro filme nos apresenta dois personagens principais carismáticos e únicos em um universo muito bonito que, embora simples, se mantém profundo.
Kung Fu Panda 2 é uma continuação direta da mensagem do primeiro filme, porque após o Po aprender que ele é especial simplesmente por ser quem é, parte para uma jornada para definitivamente descobrir QUEM ele é. No segundo filme, ele aprende que não é sobre seu passado, suas fraquezas, forças ou medos que definem quem você é, mas quem você decide ser no presente. Esse filme tem uma das cenas mais emocionantes que eu conheço no cinema, o espetacular momento que Po alcança uma resolução sobre sua identidade e cria uma incrível conexão entre o personagem e você (o espectador). Esta mensagem é finalmente concretizada quando perguntam para ele quem ele é. Ele responde dizendo: “Eu sou Po”.
Esse segundo filme expande o universo da série de um modo mais sentimental, e traz um vilão complexo e realista, desenvolve os personagens apresentados no filme anterior e traz uma experiência divertida e agradável, sentimental e por vezes séria, buscando tudo de melhor que uma sequência pode ter. Na superfície, Kung Fu Panda é uma série de filmes engraçados, com músicas boas, visuais bacanas, lutas impressionantes e personagens interessantes, mas não precisa cavar muito para encontrar a beleza de suas mensagens e ensinamentos, mesmo as menores como o sentimento de paz interior.
No entanto, o que me levou a escrever esse texto não foi apenas falar bem de uma das minhas obras favoritas, mas, como o título deixa claro, eu quero falar sobre o terceiro filme, porque é uma franquia constituída por três capítulos. Esse terceiro filme parte de uma cena final de Kung Fu Panda 2, que revela que o clã dos pandas continua vivo, e é isso que possibilita a história se desenvolver nesse terceiro episódio. O filme também é divertido, (um pouco) engraçado, as músicas são incríveis, e as lutas ainda são excelentes, embora um pouco menos legais que os dois primeiros. Mas… é só isso. É um filme vazio que, se você não se importar com nenhuma das coisas que eu falei sobre os dois primeiros, vai te arrancar alguns sorrisos, mas ele não é nada mais que isso. Enquanto a franquia pode te ensinar muita coisa e mudar sua vida, Kung Fu Panda 3 é só mais um filme.
Eu queria dizer que ele é pelo menos legalzinho, mas o maior problema desse filme é jogar fora tudo que os dois primeiros criaram, construíram e passaram para as pessoas. Eu não diria que Kung Fu Panda 3 foi lançado apenas pelo dinheiro, mas realmente parece que foi. Eu poderia falar bastante sobre como esse é um filme completamente previsível, ou como ele não é tão engraçado quanto os anteriores, ou como eles usam muito mal um vilão bem interessante, mas nada disso importa de verdade, pois isso não faria um filme ruim. O problema é que Kung Fu Panda 3 não só esquece de desenvolver algo significante na franquia, como também destrói o desenvolvimento das mensagens já criadas e estabelecidas no passado.
No começo do filme, em uma conversa com o Mestre Shifu, Po é questionado sobre duas coisas muito interessantes caso você tenha entendido a mensagem dos dois filmes anteriores. Shifu diz que ele tem que “aprender o que é ser o Dragão Guerreiro”, e “descobrir quem você é”. Isso soa familiar? Aparentemente, o primeiro filme e a mensagem belíssima dele não foram o suficiente para o Po entender o que é ser o Dragão Guerreiro, porque ele resume tudo em apenas socar e chutar bandidos. E, é claro, toda a dor e aprendizados com o passado dele no segundo filme não trouxeram a resolução de quem ele é. Se isso não fosse ruim o suficiente, pelo menos o filme podia trazer uma nova maneira de trazer essas mensagens, e ele de fato o faz. Mas o problema nisso é que agora elas são superficiais, esquecíveis e, principalmente, vazias; não significam nada.
É claro, eu fico bem irritada por desconstruírem a mensagem do 2, especialmente quando o Po vai recitar quem ele é, quando questionado mais uma vez. Ele responde:
“Eu tenho feito a mesma pergunta. Serei eu o filho de um panda, o filho de um ganso? Um aluno, um professor? Acontece, que eu sou todos eles.”
Essa fala não é só genérica e previsível, mas como também não carrega metade do impacto de uma resposta muito mais simples e cheia de emoção. Ele citou títulos e rótulos que tem, e disse que é isso o que ele é. Não existe mensagem nenhuma nessa fala, mas quando ele diz:
“Eu sou Po.”
Ele quis dizer que é, simplesmente, ele mesmo, e nada mais que isso, porque ele não precisa ser mais nada. Ele é especial só por ser o Po, é uma conexão direta com a mensagem do primeiro filme, bonita, perfeita, não precisa mudar. Quando ele diz que é apenas os rótulos que as pessoas colocaram nele, ele se rebaixa a algo insignificante, uma pessoa simplória e rasa, e muda a mensagem para algo não só vazio, mas inexistente, porque não tem o que tirar dessa frase.
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O que me incomoda não é só a mensagem do 2, mas o completo descaso com o primeiro filme. O que é ser o Dragão Guerreiro? E a resposta vocês já sabem: é ser você mesmo, único como é, “não existe ingrediente secreto“. Por ser o Dragão Guerreiro, Po não recebeu nada especial, só um pergaminho em branco. Ele se tornou o Dragão Guerreiro ele mesmo, com apenas o que sempre foi, e não precisou de mais nada em nenhum momento para salvar a China. Po é o Dragão Guerreiro pelo esforço próprio e as coisas que aprendeu durante a vida, porque ele cresceu e deu tudo de si para cada vez mais se tornar numa versão melhor de si mesmo.
Mas, no terceiro filme, sabe o que é ser o Dragão Guerreiro? Claro, não é bater em bandidos como o Po por algum motivo achou que era, mas é… é ter… poderes especiais. Poder controlar uma energia misteriosa nova (introduzida nesse filme) chamada Chi, ser um mestre desse poder. Só o Dragão Guerreiro pode ser um Mestre do Chi. Ele conseguiu isso de uma profecia. Agora, ser o Dragão Guerreiro dá a ele poderes para além de seu próprio corpo, coisas místicas que além de não ter se esforçado para conseguir, não cumpre mais o objetivo de ser “apenas o Po”. Ele não é mais o Po, agora ele é o Dragão Guerreiro, e é ter o status de “ser o Dragão Guerreiro” que dá esse poder à ele. Entendem o que estou dizendo?
Isso não só faz a mensagem dos filmes simplesmente deixarem de existir, como machuca a experiência superficial dele também. As cenas emocionantes não tem emoção, elas tentam forçar um “hype” ou uma tristeza que não existe. Não só por serem previsíveis, mas porque não existe sentimento em nada que acontece na narrativa, não tem nada de novo em Kung Fu Panda 3. E, se não fosse por algumas cenas divertidas, não teria muito motivo para assisti-lo.
Além de tudo isso, até a parte superficial dele é inferior aos outros filmes. Por exemplo, ele não é tão engraçado quanto os outros. A comédia é um fator importante de Kung Fu Panda por causa da sua execução. Piadas em momentos sérios podem acabar com a cena, mas a comédia nos dois primeiros filmes era usada pra criar uma atmosfera e mantê-la balanceada, pra não ir muito para um lado nem para o outro. São pouquíssimos os momentos que o humor se torna intrusivo e passa por cima do sentimento que a cena quer passar, prejudicando ela, porque na maioria das vezes o humor deixa a cena intacta. Não tira o impacto dela, mas traz personalidade, traz um pouco do Po pra história e, de um modo geral, mantém a narrativa divertida e engajante sem ser séria demais, mesmo que tenham coisas realmente sérias acontecendo. Como o 3 não tem a parte importante emocional, a comédia parece vazia, e as piadas nem são tão engraçadas e originais como nos primeiros. Elas não trazem o mesmo sentimento e são muito previsíveis, o que prejudica o humor.
Eu posso falar o dia todo sobre Kung Fu Panda, mas o ponto é que Kung Fu Panda 3 não precisava existir. Não parece que faz parte da mesma franquia, e é como se esse fosse o primeiro, não o terceiro, pela sua execução. Talvez alguém que assista esse antes dos outros ache ele incrível ou, claro, uma criança gostaria muito dele, mas para alguém que foi profundamente impactada pelos filmes dessa franquia, eu só consigo olhar pra ele com tristeza e decepção. Obrigada por terem lido, beijos.