Levanta-se novamente! Sir Daniel Fortesque! O herói de Gallowmere — que caiu no primeiro confronto! A neblina da guerra e o passar do tempo conspiraram para transformar o alvo ambulante no salvador da pátria. Mas nós sabemos da verdade… porém, o destino deu-lhe uma segunda chance. Uma chance de esquecer a ignóbil realidade. Uma chance de derrubar Zarok, e fazer jus à lenda. Nós esperamos que consiga.

Conheça Daniel Fortesque — apreciador de vinhos caros, longas caminhadas pelo castelo e do colo do rei. Quem mais poderia liderar o exército do rei Peregrin na batalha pelo futuro de Gallowmere, do que o almofadinha bajulador? É claro que, sem qualquer tipo de surpresa, o herói de Gallowmere também foi o primeiro a cair, e para a primeira flecha que cruzou o campo de batalha. Quem poderia imaginar que este seria considerado o herói do povo, ao invés de Sturnguard, Ravenhooves ou mesmo o pobre Canny Tim?

É claro — a mentira sobre a vitória de Fortesque também se estende para a derrota de Zarok. O feiticeiro nunca teve seu fim, e agora, retorna para as terras europeias de Gallowmere para lançar seu mais poderoso feitiço, e conquistar o mundo sem qualquer herói a vista para pará-lo. No entanto, Zarok não contava com um simples detalhe…

Quando morrem, os heróis vão parar na casa de festas celestial, o Hall of Heroes. Muitos heróis se foram durante a grande guerra, ou mesmo alguns anos depois. Daniel Fortesque, no entanto, não é um herói. Seu corpo esquelético foi enterrado em sua cripta particular, e quando o feitiço do necromante dominou Gallowmere, Dan ressuscitou. A ironia do destino trouxe Daniel, e apenas ele, de volta aos assombrados campos do cemitério. O único capaz de salvar o povo do reino, é o homem que o condenou há anos.

MediEvil é um platformer 3D do PS1, e você conhecendo o jogo ou não, talvez entenda o que há de tão especial nele em pouco tempo. A história é uma reviravolta engraçada e criativa nas típicas lendas Arthurianas heroicas europeias. O cavaleiro nobre enfrenta cavernas, dragões e feiticeiros para salvar o reino, mas a ideia aqui é… diferente. Nosso cavaleiro “nobre” está morto, por sua própria incompetência. Seus inimigos são zumbis e fantasmas vindos do abismo, ressuscitados por um necromante para causar terror. Não há muitos personagens em MediEvil, pois todos os aldeões foram possuídos, e também não há um lindo céu azul para acompanhar sua jornada — o manto noturno cobre cada passo dos seus pés esqueléticos.

Uma típica aventura de RPG se transforma em um pesadelo. Os heroicos rufares de tambores são substituídos por melodias misteriosas e soturnas, que acompanham os visuais tenebrosos de Gallowmere — evidentemente inspirado em filmes stop-motion de argila da época. MediEvil não é exatamente “de terror”; da mesma forma que A Noiva Cadáver, Coraline ou (especialmente) O Estranho Mundo de Jack. Mas na sua infância, você teve medo. E eu também tive.

Não são muitos os jogos que buscam essa estética. Raramente o seu protagonista seria um esqueleto feio, rude e patético, passando por mausoléus e plantações de abóbora a fim de cortar zumbis e dilacerar espantalhos. Mas aqui, em Gallowmere, as coisas são bem diferentes.
Eu conheci MediEvil bem jovem. Na verdade, foi um dos primeiros jogos que conheci em toda a minha vida. Eu ficava completamente atormentada com os zumbis, a atmosfera, os sons e a estética, mas não conseguia me desprender. Era como um Resident Evil light, sabe? Bem, hoje em dia, é mais um Zelda de Halloween.

Um jogo de plataforma com ênfase em combate, dando ao nosso herói um vasto arsenal para derrubar as criaturas da noite. Machados, lanças, escudos, flechas e até magia fazem parte do seu inventário. Enquanto Dan corre e pula pelas lápides do cemitério, se torna vital saber como lidar com os donos dos túmulos.
Considero MediEvil um “pseudo-collectathon”. As fases são pensadas para o estilo, e cumprem perfeitamente o papel. No que se diz a explorar e coletar, MediEvil é um show de level design! Apesar disso, coletar não é necessário para terminar o jogo.

Nenhum collectathon pede para que o jogador colete 100% dos itens para avançar na aventura, mas costumam pedir ao menos uma boa parte. Em Spyro, não salvar dragões o impede de prosseguir para os próximos níveis. Em Super Mario 64, a fase final é barrada por um requisito de 70 estrelas. MediEvil, no entanto, não pede qualquer tipo de coletável para avançar, ao menos, não da mesma forma.

É como se Super Mario 64 não pedisse a coleta de estrelas para avançar. Você só precisa entrar no nível e completá-lo para seguir para o próximo. O jogo ainda teria o mesmo estilo de level design que é focado na coleta das estrelas, mas tornando-as secundárias, não daria para chamar de collectathon. É como eu vejo MediEvil!

Existem dois grandes coletáveis no jogo, e alguns menores que… bem, pouco importam. O Cálice que leva ao Hall of Heroes, e as Life Bottles que aumentam sua vida máxima, são os verdadeiros objetivos.
Para coletar o cálice, é preciso derrotar um número considerável de inimigos. Não todos, mas quase. Então, Daniel precisa encontrar o objeto, agora cheio de almas, para acessar o Hall. As Life Bottles só precisam ser encontradas!

Nenhum dos dois coletáveis são necessários, em teoria. Então, por que você correria atrás deles? Bem, fora o óbvio avanço na sua barra de vida, uma visita ao Hall of Heroes pode dar a Fortesque novas armas que serão essenciais na batalha contra as hordas demoníacas de Zarok. Os seus oponentes, grandes e pequenos, são balanceados pensando em jogadores que tem ao menos uma certa quantidade de cálices obtidos. É claro, é totalmente possível vencer os demônios voadores de Enchanted Earth com adagas e uma espada curta, mas só uma porcentagem expressivamente pequena dos jogadores de MediEvil são capazes de um feito como esse. Afinal, esse é um boss difícil até para um jogador que coletou tudo!

Claras recompensas são conquistadas ao explorar. Sem a Magic Sword, os Shadow Demons são fortes demais para serem enfrentados em grupo, e a serpente gigante é, literalmente, invencível, forçando o jogador a fugir em pânico. É natural que os jogadores busquem um Cálice ou outro, e essa escolha será devidamente recompensada!

Mas, no que se diz a completar o jogo, nada disso é necessário. Sim, você precisa do Shadow Artefact para terminar Enchanted Earth, mas esse é um requisito mais “adventure” do que collectathon. Isso apenas instrui o jogador a terminar Sleeping Village!
Não se pode terminar Gallows Gauntlet sem a armadura do Dragão, mas para acordar esta besta colossal, o jogador precisa vencer o exército de formigas em Ant’s Nest e o rei das abóboras em The Pumpkin Serpent. É mais Zelda do que Spyro!

Os múltiplos âmbitos de MediEvil se combinam perfeitamente, de forma que fica impossível separá-los. Platforming está tão intrinsecamente ligado ao combate quanto à exploração. Os níveis são desenhados de formas criativas, para serem menos como apenas uma fase entre você e Zarok, e mais como sua própria experiência semi-isolada. Fazem o jogo parecer mais longo do que realmente é, não de uma forma maçante, mas sim de uma extremamente engajante.

Cada cenário captura sua atenção e curiosidade do seu próprio jeitinho. The Asylum Grounds se passa em um clássico labirinto no jardim, mas a exploração do mesmo é engatilhada por uma charada a resolver. Não apenas encontre o caminho, mas resolva cada enigma para abrir portas que o levam mais perto do final. Enquanto isso, The Sleeping Village quebra o padrão clássico de saltar e matar, pedindo para que Daniel IGNORE os pobres aldeões possuídos e explore a cidade fantasma resolvendo quebra-cabeças, abrindo portas trancadas e realizando o mesmo tanto de backtracking que uma área de Survival Horror pediria.

Um passo de cada vez, Fortesque chega ao seu destino heroico, e seus passos são contados em estágios que mais se assemelham a um capítulo em um livro infantil sobre cavaleiros e dragões. Exceto que a velha história começou a se decompor com o tempo, deixando apenas o Necronomicon denunciar as fábulas macabras de Gallowmere.

MediEvil é uma experiência única até hoje, e jamais deixará de ser. Por mais que seus controles duros possam causar uma dor de cabeça ou outra, e seus ângulos de câmera denunciem a idade tecnológica do título, ele vai te surpreender positivamente com frequência. Nesse mês de Outubro, dê uma chance para as terras amaldiçoadas que prendem Daniel a esse corpo nada carnal. Boa noite.

+SHAMELESS PLUG: MediEvil foi jogado pelo meu amigo Benjamin no nosso canal do YouTube: os AMONG GAMERS!! Uma série completamente imbecil, cheia de convidados e os assuntos mais BIZONHOS da Internet. Abracem o seu lado canino!
#RECANTODOSUSTÃO2025