Sonic the Hedgehog — 0,2 quilômetros por dia

Eu acredito que todos temos um jogo que evitamos. Um jogo que talvez você pense que nunca conseguiria terminar, ou que talvez não valha a pena o esforço. Não um jogo que não temos interesse, pois isso é bastante comum e engloba a maior parte das obras do mundo, mas sim um título que te afasta pelo simples pensamento de que “eu me valorizo o suficiente para não ligar”. No meu caso, esse jogo se chama Sonic the Hedgehog, do Megadrive. O Sonic 1 original.

Porém, vocês leram o título da análise. O que me fez mudar de ideia? Bem, foi o meu canal de longplay com meu melhor amigo.

Nosso plano para algumas franquias é experienciar todos os jogos principais delas, e dar uma chance justa para cada um deles. Isso nos fará tentar coisas novas e ter um conhecimento mais aprofundado sobre os passos da nossa jornada. Para jogar Sonic, o primeiro jogo fez-se necessário.

Nós estamos em dois, então eu não era obrigada a jogar Sonic 1. Ainda assim, senti que fosse. É a minha sina. Que tipo de amiga eu seria se deixasse ele ficar com o 1 enquanto me divirto com o 2? Deixei com que ele ficasse com a ponta mais longa do graveto, e segurei com força o destino que me foi designado. Eu finalmente teria que encarar Sonic 1… e eu consegui vencer. Eu derrubei meus demônios.

Essa não é a minha primeira vez com Sonic 1. Eu estaria mentindo se dissesse que é a segunda ou terceira também.

Pode ser a minha vigésima, ou até mais do que isso. Eu tentei, de novo e de novo, dar uma chance a esse jogo e, no meio dessas tentativas, sempre chegava na mesma conclusão: eu odeio ele.

Finalmente terminar ele é um grande feito para mim, e isso não mudou o que eu sinto sobre ele. Foi uma experiência melhor do que poderia ter sido porque, no mínimo, produzi conteúdo jogando. E, claro, estava com um amigo fazendo comentários absurdos do meu lado. Mas o motivo para eu sequer ter terminado foram os anos de experiência que eu tenho com ele.

Desde muito pequena eu tento a sorte na primeira aventura do Sonic, e desde sempre eu saio frustrada. Já tentei até com personagens diferentes em mods, e nada. Já tentei por Sonic Megamix, e não deu. Eu tenho certeza que em diversas dessas tentativas eu poderia ter zerado se continuasse tentando, mas eu havia decidido algo muito simples — não vale o meu tempo.

E, honestamente, ainda não discordo. É parte da história de Sonic, e como artista e jornalista, nunca poderei afirmar que um jogo é ruim (não existe algo objetivo nessa opinião), nem acredito no envelhecimento da arte. Como fã de Sonic, parecia um passo lógico na minha jornada, mas eu havia me contentado com o simples pensamento de que “esse jogo não é pra mim, e posso respeitá-lo o suficiente de longe”. Enfim, me obriguei a dar essa última chance.

Sonic 1 foi revolucionário. Não só por iniciar a franquia, mas pela tecnologia empregada nesse jogo. Nem tudo é 100% originado aqui, mas as técnicas engenhosas que os desenvolvedores empregaram foram habilmente aperfeiçoadas aqui.

O aspecto mais importante foi, é claro, a velocidade. Sonic ganha crescentes níveis de rapidez não só ao correr, mas ao pegar embalo em descidas. Ele fica cada vez mais rápido, e quase não tem um speed cap (se tiver). Ao rolar, essa velocidade cresce em descidas ainda mais, e também existe uma relação sólida com os saltos e rampas. A velocidade do Sonic é constante e sempre sujeita a alterações: ele vai ficar mais lento ou mais rápido dependendo do ambiente, das suas ações e dos obstáculos no caminho.

Velocidade em jogos não era algo novo, mas Sonic foi o primeiro a buscar realismo detalhístico nesse sistema, com variados níveis de aceleração e construindo a mecânica como base do level design… ao menos, deveria ser assim. A ideia foi muito mais forte do que sua execução pois, apesar de Green Hill Zone ser o blueprint de como essa filosofia DEVERIA funcionar, os demais níveis não combinam com ela.

Não me entenda mal: a SEGA não esqueceu da mecânica nas demais fases, mas deixou de usá-la de formas divertidas. A velocidade em si parou de ser importante, e sempre que o sistema foi utilizado em níveis futuros, tinha mais a ver com a aceleração inicial do Sonic: o ato de começar lento até passar a correr. Mario, nos seus jogos, corria ao apertar um botão, mas Sonic precisava ganhar essa velocidade com tempo.

Por mais que diversos dos desafios de Sonic 1 sejam projetados com a mecânica em mente, o design de cenários desse jogo esqueceu que a parte mais divertida de toda essa estrutura era correr. Correr é a pior coisa que você pode fazer em Sonic the Hedgehog.

Por correr, você bate em espinhos, é lançado para trás por molas, tropeça em inimigos e cai em buracos. Os jogos bons do Sonic não te deixam correr sem pensar, mas aqui, pensar não é a chave. Eu terminei o jogo por conta de reflexos rápidos e memorização sim, mas isso só foi possível andando lentamente.

Os perigos surgem de fora da tela de forma imprevisível e sem dar espaço para reação. Por conta da velocidade do personagem, saltar, rolar ou parar no meio da corrida não são atos que podem ser realizados sem planejamento. Como você planeja algo antes de saber que será necessário?

O ouriço morre rápido, e essa é a coisa mais veloz sobre ele. Sonic 1 não é pensado para que você corra, por mais que essa seja a mecânica principal. O único jeito de terminar ele é andar lentamente, com um fluxo constantemente interrompido pelos saltos devagares entre plataformas que parecem ter sido pensados para um personagem como Super Mario ou Mega Man, e não Sonic.

Todas as vezes que tive sucesso nos níveis eu estava cautelosamente andando. Sempre que eu corri, uma plataforma que necessita que você espere surge do limbo e errar ela te leva para a morte certa. Sempre que você corre, Sonic 1 faz questão de te pôr no seu lugar, sempre te relembrando que você não pode correr. Esse é um jogo em que você luta contra a natureza do personagem, e contra tudo que faz Sonic especial. Velocidade é seu inimigo.

Os outros jogos apresentam seus desafios pensando na velocidade, e recompensam o bom uso dela. Você passa pelos níveis com reações rápidas, e estar correndo te dá novas opções. Platforming preciso pede que você ande mais lentamente, mas eles não são mais a norma, e em uma surpresa no fim de um longo corredor. É mais natural!

É irritante dirigir em uma rua congestionada, ou que nunca tem linhas retas, ou que não sinaliza que na próxima curva tem uma parede ou penhasco. Correr em Sonic 1 é andar em um campo minado, e o fato de que isso começa logo após Green Hill Zone acabar, faz desse jogo quase que completamente enfurecedor.

O motivo para eu ter zerado foi o fato de que já enfrentei esse purgatório muitas vezes e sempre desisti. Isso me deu muitas memórias de como o jogo brinca com sua cabeça. Mesmo os desafios que foram divertidos se transformam em estresse quando você precisa lutar com os controles básicos do seu personagem. Isso tudo muda em Sonic 2.

Sonic the Hedgehog foi um experimento que testou o início de um fluxo de level design inovador e criativo. O experimento foi um sucesso, pois compreenderam perfeitamente como criar um jogo do Sonic após ele. Ainda assim, o respeito que eu tenho por Sonic 1 não transfere para o tanto que me diverti com ele, que em uma escala de 1 a 5, se equipara ao título do jogo como o primeiro de muitos. Boa noite.