Cortaram as asas do Birdman. Sufocaram o Tony Hawk. Tiraram a flecha da cabeça da Neversoft só pra colocarem de volta de ponta-cabeça.
Exageros à parte, Tony Hawk’s Pro Skater 3+4 faz o máximo possível de uma situação ruim. Neversoft, a desenvolvedora original da franquia, se foi há tempos. Até a Vicarious Visions, responsável pelos incríveis American Sk8land, Proving Grounds (ambos de DS) e o recente sucesso Pro Skater 1+2, se foi para virar um dos múltiplos estúdios de suporte necessários para girar as engrenagens das fábricas de AAAs da Activision-Blizzard-Xbox.

Tony Hawk’s Pro Skater 3+4 foi lançado em 11 de julho de 2025, desenvolvido pela Iron Galaxy e publicado pela Activision. O jogo está disponível para PC, Playstation 4, Playstation 5, Nintendo Switch, Nintendo Switch 2, Xbox One e Xbox Series X|S.
O que restou para a gênese do mais novo remake Pro Skater 3+4, então, foi a Xbox alocar o estúdio (usualmente de suporte) Iron Galaxy para reviver o projeto. Todas as decisões de produção em volta das grandes franquias de esporte são cínicas, mas a visão do que era um novo Tony Hawk seguia firme nos confins da Vicarious Visions, enquanto agora o máximo que podemos especular é que 3+4 existe principalmente para a Microsoft conseguir diversificar seu conteúdo no Game Pass e gerar valor na sua aquisição de $75 bilhões da Activision Blizzard.
A física de Pro Skater 3+4 é genuinamente ótima, mas em muito extremamente similar à de 1+2 — mais pesada que os exageros (que tanto amo) de Underground 2 e American Wasteland mas mais leve que no Pro Skater 3 original. A direção da Iron Galaxy é quase invisível. Como parte do valor agregado, temos a escolha de pro skaters para o jogo. Muitos novatos aparecem aqui, e a seleção é ótima, como de costume; a brasileira Rayssa Leal é um destaque, e segue, junto da australiana Chloe Covell, a tradição da série Tony Hawk de incluir novos nomes do skate ainda adolescentes, e assim levá-los imediatamente aos holofotes.

O maior exemplo que vem à minha mente é o Ryan Sheckler, que tinha apenas 14 anos quando virou um personagem jogável em Tony Hawk’s Underground 2. Agora também existem mais skatistas além da Lizzie Armanto descritos como estilo “Park”: Nora Vasconcellos e Zion Wright. Inclusive, Rodney Mullen e o novato Andy Anderson ganham a inédita classificação “Freestyle”! A dicotomia entre “Vert” e “Street” foi finalmente quebrada o suficiente para importar.
Os skatistas veteranos também retornam, todos com um look ainda jovial, mesmo mais velhos. O Bob Burnquist vem com um boné do Banco do Brasil em todas as suas três opções de vestimenta. Tem até como usar o logo do banco como ícone multiplayer…

Todo skatista vem com sua própria manobra especial de destaque, além de espaços para designar outras especiais miscelâneas. Em jogos anteriores, você liberava os vídeos de skatistas ao pegar todos os Stat Points de cada (o que essencialmente requeria completar as campanhas deles), mas agora apenas precisa concluir um desafio de fazer um combo de 250.000 pontos incluindo sua manobra especial.
A distância entre um jogador de Tony Hawk iniciante e um veterano no quesito pontuação é absurda. Para um veterano, 250.000 pontos é basicamente nada, enquanto para um iniciante pode ser uma barreira inatingível. Para pontuar, motion inputs estilo jogos de luta são necessários, tanto para manobras normais quanto as mais complexas e especiais: balanços entre manuais e grinds, uso medido de reverts, conhecimento de mapas, física, e gaps, além de uma boa noção de como utilizar manobras em stances diferentes ao seu favor. Demora muito para internalizar e começar a executar combos consistentes… pelo menos demorou para mim.
É por isso que o balanço entre pontuação e platforming sempre esteve presente na franquia. Muitos desafios dentro da estrutura de 2 minutos por rodada dos primeiros Pro Skater requerem habilidades mais generalizadas de platforming e manobras simples. Ou seja, para liberar o vídeo de um skatista, você termina sua campanha. Você o controlou, aprendeu suas manobras, e aumentou suas estatísticas no decorrer da campanha toda e como recompensa pode ver um curto vídeo de skate deste Pro Skater da vida real.

Agora, para alguém com muita experiência na franquia, desbloquear cada vídeo em Pro Skater 3+4 foi apenas uma tarefa demorada e nada desafiante, pois tinha que ficar trocando de personagem toda hora que terminava mais um desafio de pontuação. Vira apenas uma coisa a mais para desbloquear, e não uma cristalização de sua experiência jogando com o skatista.
Acredito na importância desta simples mudança pois os vídeos de skate foram o que me inspiraram a começar a andar na infância, e assim aprender meus primeiros ollies e shove-its. São integrais à dominância cultural do skate nas últimas décadas, e um aspecto único de Tony Hawk que conecta o jogo ao esporte de forma que nenhum outro consegue, mesmo como uma série que nunca ligou muito para realismo.
Pro Skater 3+4 é uma reiteração bem desigual dos jogos que refaz. Pro Skater 1+2 não é um remake apenas visual: suas pistas e desafios são completamente recontextualizados com a física e manobras extras que o remake traz. Você possui acesso à manuais (que não existiam no THPS 1 original) wallrides, wallplants, reverts e spine transfers, além da física bem mais leve. Assim, os desafios foram rebalanceados com os novos parâmetros em mente.

Isso não foi algo novo; diversos mapas do 1+2 já haviam sido refeitos nos “Classic Modes” do Project 8 de PSP, Underground 2, e American Wasteland. As diferenças eram entendidas e consideradas pela Neversoft naquela época e continuaram sendo pela Vicarious Visions. Mesmo assim, é bem mais fácil realizar os desafios de plataforma mesmo com estatísticas baixas no remake por conta de sua física mais leve.
Isso dá uma boa margem de erro aos responsáveis pelo remake. Como as campanhas são normalmente jogadas de forma conjunta, os Stat Points não são adquiridos por completo na duração de um jogo, mas dos dois — você só terá metade dos Stat Points ao terminar a campanha do primeiro Pro Skater em 1+2, mas isso já é o suficiente para chegar nos lugares complicados do final do 1.
Em Pro Skater 3+4, como a física base se tornou próxima à dos jogos originais, agora fazer os objetivos (ou Goals) do mapa final de Pro Skater 3 com metade dos Stat Points é uma tarefa bem mais desigual. Envolve, no mínimo, você mexer nas estatísticas já adquiridas para maximizar Ollie, Air, Speed e Hangtime. É uma das múltiplas áreas desse jogo que pedia mais carinho…

Porém, além disso, o pedaço Pro Skater 3 do remake é quase pau-a-pau ao seu jogo original. Você ganha os visuais super detalhistas do remake, e com isso os modelos de personagem bem feios também. De qualquer forma, todos os mapas do 3 chegam lindões e prontos para speedruns velozes.
A única semi-exceção é o mapa Cruise Ship, que teve uns objetivos significativamente alterados. Pra mim tá ótimo trocar o de “impressionar as garotas Neversoft”, que era só apelação dos anos 2000. Agora, a nova sequência de três manobras em locais específicos é mal ilustrada e muito longa. Uma das manobras necessárias é uma lip trick num helicóptero que fica fora de vista até você chegar na rampa num canto onde já existe outra Goal, a de pegar a Secret Tape. Não só isso, mas a forma com que são marcadas no mapa é igualmente bizonha: grafites coloridos bidimensionais no chão, algo que nunca foi usado como demarcador antes na franquia. Se ao menos a câmera de objetivos demonstrasse os três locais ao invés de só um, não seria tão destoante. Quando cheguei neste ponto, comecei a me assustar com as novidades possíveis no resto de Pro Skater 3+4.
O pedaço Pro Skater 4 do remake simplesmente não foi feito para funcionar. Existe um limite de quais tipos de objetivos e sua distribuição que torna o timer de 2 minutos algo funcional para uma possível speedrun perfeita — pode até levar um pouco mais que os 2 minutos (já que você pode manter um combo após o fim do timer), mas cada desafio deve levar um ao outro para isso funcionar. Ou a distância entre eles deve ser pequena ou o caminho deve envolver lugares aptos pros grinds e manuais necessários para te levar onde deve.

O Pro Skater 4 não seguia essa estrutura de forma alguma! Seu lançamento original de 2002 tinha, pela primeira fez na franquia, mapas completamente abertos com objetivos selecionados ao falar com NPCs. Assim, cada objetivo podia ter um nível maior de complexidade, ou até um apelo pé no chão de fazer skating lines inspiradas em umas reais. Tem gente que odeia isso.
Eu gosto da estrutura do 4 original! Ela é diferente e mais cansativa, mas segue sua própria lógica menos arcade e levemente narrativa — cada objetivo vem junto de uma dublagem idiota e umas palavrinhas sobre o porquê deste NPC querer que você faça algo. Até inclui as “Pro Goals”, que são bem mais difíceis e envolvem Pro Skaters te pedindo uns absurdos. A estrutura sans-timer se expandiu conforme os jogos seguintes se tornaram mais narrativos ainda, mas já dava um sinal de vida desde esse jogo.
Um remake desviar de sua obra originária não é um problema por si só. Todos estes mapas foram pensados para serem bem maiores e com objetivos completamente separados uns dos outros, mas nada que uma repensada neles não pudesse arrumar, né…

Tal cuidado não foi considerado. Os objetivos de Pro Skater 4 são longos e desconexos. A forma mais óbvia e direta de ver esta mudança é no modo speedrun, onde os tempos a serem batidos dos mapas do 4 são em média 3 minutos. Eles esperam que você fique um minuto inteiro conectando combos entre estes objetivos bestas. O pior mapa com este formato é London, que possui um tempo a ser batido de 4:50. É mais que o dobro do timer normal! Boa parte da culpa disso é da Goal de arrancar chapéus de policiais, que requer que você primeiro tire os chapéus de três aleatórios antes de pedir que caçe o de Officer Dick, interpretado por Jack Black. Tirar o chapéu dele pede mais três ciclos de tentativas, já que ele vai desaparecendo e reaparecendo por aí numa setpiece scriptada. Demora demais e é feito para ser extremamente complicado em um combo — então é sempre a primeira prioridade da fase.
Imagine versões menos absurdas de cada uma dessas situações para todos os outros mapas do Pro Skater 4 deste pacote. Olha que ainda existem mais decisões bizarras no meio.

Pro Skater 4 não possuía os mapas de competição de jogos anteriores, onde não existem objetivos além de pontuar bem com jurados em três sessões de 1 minuto cada. Eles são ok! Alguns desses mapas são meio sem graça, mas aprecio como tentam, em grande parte, recriar pistas de skate reais e emoldurá-las numa facsímile de competição séria. Você não deve apenas pontuar, mas evitar cair do skate. A versão deste conceito em Proving Grounds de DS também requer o uso de diferentes áreas do parque e uma boa variação de manobras. Legal — mas Pro Skater 3+4 pega mapas gigantes de Pro Skater 4, antes lotados de objetivos, e os transforma em parques de competição.
O que mais me entristece em meio destes é o Kona, uma recriação do parque de skate de Jacksonville, nos EUA. Ele é um parque real, como muitos dos anteriormente usados para competição nos jogos, mas a diferença é que ele é enorme! Em meio à seus múltiplos obstáculos e seções diferentes, ter que competir nele em intervalos carentes de objetivos de minuto em minuto é uma lástima.

O mesmo destino foi dado ao Zoo, que foi de um zoológico lotado de animais para um abandonado, destinado apenas para competição. Como substitutos dos ausentes mapas Chicago e Carnival, a Iron Galaxy criou os inéditos Movie Studio (de competição), Waterpark e Pinball (com objetivos tradicionais).
Movie Studio mal deixa impressão. Algumas de suas gaps são mal conectadas e ele é essencialmente só um monte de equipamento de cinema entre locais para rachar e rampas a voar. É especialmente desconexo em sua pequena escala, considerando que os outros mapas de competição da seção Pro Skater 4 são enormes.
Waterpark faz parte de uma tendência de visual que detalharei mais pra frente — é o mais divertido dos três, e oferece desafios reservadamente tradicionais para completar, além de seus visuais coloridíssimos.
Pinball é feio que só. Segue tons neon roxos e esverdeados não-naturais num local onde seu skatista é menor do que as bolinhas de pinball sendo jogadas por um gigantesco Tony Hawk que paira a máquina. As cores fortes são permanentemente refletidas nos limites da área jogável para adicionar à cacofonia de tons e barulhinhos do mapa. Pelo menos ele se prova como uma fase fácil de pontuar os 10 milhões necessários para um dos desafios extras do jogo, como possui um boost logo antes de uma rampa enorme para te ajudar a combar com um grab especial longão.

Algo que Pro Skater 3+4 também adiciona à nova estrutura do remake são as Pro Goals, de Pro Skater 4. Antes, você liberava elas e as completava uma por uma no mapa aberto, assim como no resto do jogo original. Agora, ao terminar todas as Goals padrões, você libera elas para ambos os jogos do pacote.
Elas são a pior parte do jogo! Toda hora que quiser terminar a Solo Tour de cada personagem, cinco Pro Goals serão adicionadas ao timer de 2 minutos para além das tradicionais. Um real pé no saco que torna terminar as fases em uma run impossíveis — tanto que o modo speedrun as ignora para não ter estimativas de tempo gigantes.
Você deve então retornar à todas as fases e completar os objetivos um à um, muitos insanamente desbalanceados. Alguns curtos e básicos demais, outros longos e difíceis demais para serem consistentemente completos com outros objetivos normais no meio.
Uma das Pro Goals é sempre a pontuação de platina, que é simples o suficiente. Outra é coletar as letras C-O-M-B-O, que eram um tipo de objetivo não-pro de Pro Skater 4. As outras três variam, mas nunca o suficiente.

Dos 13 mapas com objetivos disponíveis em Pro Skater 3+4, seis possuem Goals de impressionar skatistas profissionais espalhados pelo mapa. Este era um tipo de objetivo disponível nos mapas Canada e Cruise Ship do Pro Skater 3 original, e eram ausentes do Pro Skater 4. Em 3+4, Pro Goals lotam os mapas com eles. Para completá-los, você deve achar NPCs skatistas parados e mal destacados e fazer um combozinho próximo deles — uma desculpa pra explorar grande parte de um mapa numa mesma run. Nada apropriado para ser implementado em metade dos mapas desse jogo.
Os mapas de competição também ganham um tratamento similar, mas com as ditas Platinum Medals. O conceito é fazer um pequeno objetivo extra em qualquer uma das três rodadas de uma competição e pontuar o suficiente para ganhar o primeiro lugar. Na parte Pro Skater 3, estes viram pequenos desafios de gaps; isso torna a área secreta de Tokyo uma obrigatória!
O pobre coitado do Pro Skater 4 recebe um tratamento bem pior: desafios de coletar itens e, no caso de Kona, dispersar pássaros muito difíceis de enxergar. Como cada competição só conta suas duas melhores das três rodadas, a jogada mais eficiente é utilizar a primeira para coletar os itens necessários para a Platinum Medal e daí as outras duas para pontuar; uma progressão completamente desconectada do conceito de competição que não possui motivo algum para ser repetida por um jogador.

Os Tony Hawks antigos misturavam muito bem as seções focadas em plataforma das focadas em pontuação. As duas eram conectadas e te ensinavam a combinar os dois apelos numa tacada só. A megalomania de objetivos de Pro Skater 3+4 divorcia este casamento sem o consentimento de nenhuma das partes.
Pro Skater 3, de 2001, é curtíssimo e extremamente rejogável, à ponto de pedir que você termine sua campanha 21 vezes para liberar o último skatista secreto. Não era lá tão demorado, quase desbloqueei ele naturalmente na minha primeira experiência com o jogo há uns oito anos atrás.
Em Pro Skater 3+4, para desbloquear o skatista secreto mais-secreto-de-todos, é só completar todas as Goals (incluindo as Pro) de ambos os jogos. A mudança de foco foi da rejogabilidade inerente à estrutura semi-arcade para uma experiência gigantesca atada à carreira principal.
Dá muita preguiça de ir atrás das Solo Tours de cada skatista. Você não precisa mais coletar Stat Points para cada um deles: todas vem desbloqueadas após terminar a primeira campanha. Nem o vídeo de skate dele você ganha mais terminando a sua Solo Tour! Não existem mais diferenças de estatísticas!! Você tem que lidar com todas as Pro Goals chatíssimas entre múltiplas sessões para cada mapa!!!

A interpretação de rejogabilidade deste remake é rasa. Ainda existem os trocentos desafios extras já estrelados em 1+2, mas agora eles só demoram e não envolvem as partes mais consideradas de cada jogo. O problema não está na existência de diferenças entre os originais e o remake, mas sim na proposta de valor que se tornou o foco do projeto da Iron Galaxy.
A desenvolvedora tornou o mapa Zoo parte da tendência de locais desertos conferido à alguns outros mapas de Pro Skater 3+4; o pirata presente no navio secreto de Skater Island em Pro Skater 3 morreu e virou um esqueleto; a seção secreta de Tokyo foi de uma abstrata área futurista para mais um pedaço abandonado da cidade.
A Iron Galaxy imaginou o futuro de diversos locais destes jogos e a conclusão que chegou é uma de abandono e decadência. Poxa. Cortaram as asas do Birdman!