Meu teclado tá nos seus últimos dias mas não posso esperar um novo chegar pra escrever sobre isso. Eu não sou cinéfila, nem tenho tanta vontade de ser, mas por vezes eu vejo um filme ou outro sem qualquer tipo de padrão ou guia. E por nada, eu decidi assistir Pulp Fiction com meu amigo Benjamin. Nunca vi nada do Tarantino antes, mas já tinha assistido algumas cenas desse aqui porque… bem, todo mundo já viu. Você conhece a cena do Travolta confuso, e é desse filme.
Posso não ser cinéfila, mas eu sou escritora. Eu também conto histórias e analiso elas e eu preciso dizer — que filme. De cara eu já fiquei muito entusiasmada com os diálogos. Os personagens por si só são bem especiais, mas as conversas entre eles são de longe a melhor parte da escrita da obra. São diálogos muito humanos e descontraídos, realistas e completamente mundanos. E a maneira que são inseridos na história é muito criativa.
A escrita e direção de Pulp Fiction é imprevisível. Tudo que acontece na história é importante pra ela mas você nunca imagina onde esses detalhes vão levar. Mais do que isso, Pulp Fiction não segue qualquer tipo de clichê no seu desenrolar, e eu me surpreendia a cada cena. Não tinha nenhuma maneira de, em retrospecto, eu saber o que ia rolar. Não parece que algo que eu sabia sobre histórias antes de ver tenha me ajudado a desvendar o desenvolvimento insano do filme.
Isso é majoritariamente feito pelo emprego de diferentes conceitos de direção em geral trazidos de uma forma um pouco mais engenhosa. Pelos diálogos, por exemplo, você imagina que Vincent vai trair a confiança de seu patrão e ficar com a esposa dele. Afinal, toda hora isso era mencionado, e que problemão isso seria, né? Qualquer outro filme seguiria por essa narrativa e faria dela interessante, mas isso é o que você espera. Mas, a verdade? As conversas, por vezes, são apenas conversas. Claro, Vincent também tinha medo de não resistir, e isso ficou claro no seu monólogo no banheiro em que ele se encorajava a só ir embora. Mas isso ainda deixava cada vez mais claro que ele ia fazer merda e… ele não fez. O que ocorre na história depois disso foi sutilmente desenvolvido antes, mas pela natureza da escrita você nunca assimilou essa afirmação. A maneira como esse “Capítulo” do Vincent termina é completamente inesperada e extremamente criativa. E no final? Dá tudo certo! Por motivo nenhum.
Pois é, esse é um filme do Tarantino, que é conhecido por violência. Mas será mesmo que é isso que ele mais faz? Porque em Pulp Fiction as coisas dão certo com bastante frequência e dá pra se dizer que pouco de realmente ruim chega a rolar com os personagens, salvo um ou dois casos. Na verdade, a estrutura da história pende ao cotidiano — esse é o dia a dia de personagens diferentes que não exatamente precisam acabar em tiros e morte (embora acabem, mas tipo… eles não morrem ou perdem algum ente querido). O tempo todo ocorre uma subversão do que VOCÊ considera ideal para a progressão do filme. Você espera que o personagem do Bruce Willis vá morrer, por tudo que foi apontado na história até agora. Mas sabe, o final dele é muito melhor que isso, muito mais criativo e insanamente satisfatório. Pra mim, principalmente, no momento em que meu coração sáfico batia mais rápido vendo a namorada do Butch, Fabienne (interpretada por Maria de Medeiros), eu tinha certeza que ela ia morrer ou terminar a história com extrema depressão mas, não. Na verdade, ela segue normal, fofa e alguns outros adjetivos que não ouso citar!
No início do filme você também é levado a acreditar que Vincent e Jules co-protagonizam o filme mas… a verdade é que Jules é um dos que menos aparece, e ainda assim, tem muitas das melhores cenas. Mas, honestamente, que cena de Pulp Fiction não é “uma das melhores cenas”? Isso nos volta aos diálogos, que também entregam informações completamente rotineiras e nada importantes para o macro da história, mas que sutilmente desenvolvem cada ponto dela. A menção de um homem que foi morto por Marsellus Wallace por fazer massagem no pé da sua esposa contribui pra algumas coisas semi-importantes no futuro que desenvolvem mais e mais a história por baixo, sem deixar o desenvolvimento claro pro telespectador no caminho. Embora seja um filme imprevisível, ele realmente constrói seus acontecimentos só que… sem você ver. E é assim que as coisas funcionam na vida real, com o subtexto presente do efeito borboleta mudando o destino a cada pequeno acontecimento. Eu não havia visto um filme que provocasse esse efeito tão bem antes e, por isso, sou obrigada a tirar a tiara para o Tarantino por isso.