Com seiscentos e três metros de profundidade, o esloveno abismo de Vrtiglavica é o mais profundo do globo. Era; não é mais, porém, agora que Bolalônia caiu.
Fui visitar as ruínas da cidade-fortaleza a convite da Devolver Digital e de Kenny Sun (e amigos). Quando me aproximei da ponta do mais novo e mais profundo abismo, pensei: não sobrou tijolo sobre tijolo. Pensei; mas não disse. Porque, antes que a expressão escorregasse da ponta da minha língua, uma parte da borda da fossa enorme desmanchou-se em várias pequenas bolotas de pedra que caíram em direção às profundezas. Caiam, como se estivessem flutuando, até sumir no nada. Seria impreciso dizer apenas que não sobrou tijolo sobre tijolo, visto que todo o resto havia também sumido — igual àquelas bolotas.

Mantive-me paralisado pela visão. Senhor…senhor, afaste-se da ponta, por favor…quantas placas vou precisar colocar para esses turistas entenderem? Quando voltei à razão, havia um jovem puxando minha blusa. Após pedir desculpas, perguntei de onde ele veio. “Nova Bolalônia”, respondeu. Após a queda, vários caçadores de tesouro estabeleceram uma vila ao lado de onde era a antiga cidade e construíram um elevador capaz de, pouco a pouco, descer no buraco para possibilitar a busca de recursos e talvez até mesmo restituir a Bolalônia original.
Era um plano perspicaz, perspicaz até demais — perdoe-me se ofendo — para um grupo de caçadores de recompensas. Não está errado, senhor, o plano não é nosso, estamos somente botando em prática. Perguntei, então, onde estaria essa pessoa? O nova-bolalônio apontou em direção ao fundo do poço.
Ao perceber meu constrangimento, completou: não tem problema, nem conheci a figura. Era um espeleólogo chamado Perceval Hollow IV, estrangeiro que morou na extinta cidade por muitos anos para provar que um meteoro cairia, destruiria Bolalônia e deixaria para trás somente um enorme abismo. Na semana anterior ao impacto, ele deu sua última palestra na qual sintetizou tudo que aprendeu e traçou um plano do que deveria ser feito após a inevitável destruição. Azar nosso que ele estava certo, mas sorte nossa que, dois ou três dias antes, ele enviou a transcrição da palestra para um primo distante envolvido com caça à recompensa.

Pedi para ter acesso ao documento, pois gostaria de expô-lo ao público. O jovem consentiu e convidou-me para sua casa, onde guardava uma cópia. No caminho, disse que seus colegas chamavam ele apenas de “O Guerreiro” e que não ia em muitas expedições por ser o único sem nenhum poder especial. Se ia, era normalmente em dupla com um dos caçadores mais excepcionais para que sua falta de habilidade não causasse problemas a ninguém.
Ao chegar, retirou o documento de várias páginas de um baú e entregou em minhas mãos. Lia-se assim:
As mil e uma maneiras de lançar uma bola
Ao contrário do que tentam me acusar, nunca disse que o meteoro sempre esteve destinado a colidir nesta região. Abyssus abyssum invocat. Cometeram o mesmo erro duas vezes: Num sopro, Deus derrubou a Torre de Babel sobre a terra; Num punho, há de empurrar Bolalônia para as profundezas. Foi a nomeação em homenagem ao Império Sumério que condenou essa cidade. Estando em qualquer parte do Oriente ou Ocidente — não importa — cairia da mesma forma.
[…] [Múltiplos parágrafos suprimidos sobre a importância metodológica para a espeleologia em diferenciar fossa de abismo].
Meu amor por essa bela cidade, porém, é grande demais para deixar que a sua história termine assim. Um meteoro é somente uma das formas de lançar uma bola. Se você é um bolalônio legítimo, sabe que há mil outras maneiras e será com elas que resgataremos nossa metrópole. Por isso estou aqui hoje, para explicar o que faremos quando o inevitável nos atingir.
Abaixo da cidade, há oito camadas que precisarão ser atravessadas. Em cada uma, você encontrará diversos tipos de inimigos com formatos diferentes (que lembram peças de Tetris) e peculiaridades próprias. Ao final de uma camada, sempre haverá um guardião que precisa ser derrotado para seguir em frente. Mas uma vitória não é o suficiente, é preciso que múltiplos caçadores diferentes completem uma expedição.

Tome, por exemplo, a primeira camada: o PÁTIO x ÓSSEO. Nela encontrará inimigos mais simples, até mesmo nos formatos, sendo em sua maioria quadrados pequenos e retângulos que abrigam esqueletos. Alguns desses são arqueiros, por isso cuidado com com seus projéteis. Ao chegar no primeiro e segundo terço da fase, surgirá um mini-chefe diferente que carrega alguma característica da fase. O primeiro apenas avança até chegar perto o bastante para atacar. O segundo usa flechas, como os arqueiros. Derrotando-os e sobrevivendo até o fim, você encontrará o temível Rei Esqueleto, um oponente que pode ser bastante chato, já que sua única fraqueza encontra-se na sua coroa, que só pode ser acertada ao ricochetear suas bolas na parede ou graças a algo que as faça atravessar o corpo do inimigo.
Para prosseguir para a próxima camada, você precisa completar essa fase duas vezes com personagens diferentes (requisito que aumenta em quantidade progressivamente conforme você avança). Nisto está a graça da coisa: conforme novos caçadores com suas próprias habilidades se juntam à aventura, novos tipos de bolas e novos itens passivos são descobertos; as possibilidades de experimentação se ampliam. Um outro elemento central para as expedições é a possibilidade de fundir as bolas, sendo que entre bolas compatíveis há fusões especiais chamadas “evoluções”. As quais, por sua vez, podem ser fundidas mais uma vez. Se não está satisfeito, é possível também combinar habilidades de caçadores diferentes em expedições em dupla.

Um guerreiro simples que apenas arremessa suas bolas pode não ser o ideal para enfrentar o Rei Esqueleto caso você não queira ficar pensando na trajetória dos arremessos. Diante dessa situação, se ele tivesse uma bola que atravessa inimigos (fundida ou não com outra bola) ou um item passivo que permita essa mesma coisa, já funcionaria. Mas você pode também experimentar colocá-lo em dupla com um caçador que tenha por habilidade lançar bolas que atravessam inimigos ou até mesmo alguém que arremesse as bolas por trás e não pela frente. Voilà. A situação foi contornada de uma nova maneira.
Contudo, não se engane! Ao voltar com seus recursos para vila, você precisará relembrar seus conceitos de cinemática, por causa do funcionamento do modo de construção. Fontes de recursos simples como árvores, plantações de trigo e pedreiras podem ser apenas colocadas, mas qualquer outra construção requer que os caçadores se lancem contra as paredes para serem de fato construídas e habilitar seus benefícios. Não é, então, só deixar seu vilarejo bonitinho — condição que pode até ser relevada -, mas construir de forma que os caçadores possam alcançar em um tempo limitado. E, mesmo que para construir fontes de recursos não seja necessário fazer isso, ainda é preciso que seus personagens sejam arremessados contra ou passem por cima delas para fazerem a coleta de recursos.

Entre as construções possíveis, várias delas facilitam sua progressão ao fazer com que cada expedição já comece com certas vantagens. Vantagens essas bem-vindas, já que facilitam muito por em prática combinações e experimentos de efeitos conforme aumenta o número de caçadores, bolas e itens passivos. Por isso, não se acanhe em apenas liberar a próxima fase e seguir. Volte nas camadas anteriores, teste coisas novas, termine com personagens diferentes ou, até mesmo, tente terminar mais rápido visto que, após terminar uma fase, liberamos uma versão mais acelerada dela (normalmente os caminhos duram quinze minutos, mas é possível liberar versões de até cinco).
Se seguirmos esse plano, é inevitável que um dia Bolalônia esteja de pé novamente. Aproveite, portanto, o caminho até lá e não tenha pressa, porque a experimentação é a essência de qualquer ciência e também uma forma válida de diversão. Quem sabe mais desafios nos aguardam após atingirmos nosso objetivo? Dentre todas perguntas que me fiz sobre o que vai acontecer, essa é a única que ainda não posso responder. Obrigado a todos pela atenção e peço desculpas, porque vocês ouvem essas palavras; elas, porém, só terão serventia para aqueles que — no futuro — as lerem.
Ao terminar de ler, perguntei se podia levar aquelas palavras comigo, porque eu mesmo iria descer até as profundezas do abismo para descobrir seus segredos. Agora volto para dizer que todas as cinquenta horas que gastei para completar o jogo, suas conquistas, terminar o NG+ e, além disso, aproveitar para brincar um pouco de speedrun valeram a pena.
+Leia também: Memórias de The Elder Scrolls IV: Oblivion Remastered
Uma cópia de BALL x PIT para PC foi concedida pela Devolver Digital para análise no Recanto do Dragão.
