Memórias de The Elder Scrolls IV: Oblivion Remastered | Análise

Oblivion Remastered

Crônicas Esquecidas de Trocen’tuhs, Herói de Kvatch

“Sexdas, 09:45, 7º de Fogo do Coração, 3E 433.

A missão de hoje é um tanto simples. Após encontrar e resgatar o filho ilegítimo do imperador em Kvatch, enfrentar algumas dezenas de monstruosidades, cruzar e fechar um portal do Oblívio. Ah, é! Também me foi necessário caminhar dezenas de quilômetros ininterruptamente até, enfim, chegar no território das lâminas do império, no Templo do Comandante das Nuvens; me vejo ainda, obrigado a enfrentar membros e segredos por trás de uma seita que trabalha para um maldito príncipe Daedrico.

Que maravilhosa manhã de Sexdas.

Fico pensando o que meus parentes de Vvardenfell pensariam sobre mim, além das moléstias e despeitos sobre minha integridade. A falta de perdão deles, somente por conta de pequenos empréstimos não consetindos que pratiquei na cidade de Vivec… A culpa não é minha se aqueles velhos dementes ignoram tudo em sua volta e negam os desastres que acontecem em sua frente; se eles tivessem passado por um décimo do que já vivi, torceriam para que Cliff Racers engolissem suas vísceras.

Sendo uma manhã como esta, pássaros ainda cantam suas repetidas canções e, claro, há gente para encher a maldita cara na Cidade Imperial. No entanto, seria hipocrisia da minha parte dizer que eu não adoraria tomar um cálice de qualquer coisa que turveie um pouco da minha infeliz e clara visão. Desde que não tenha beladona… não quero lembrar daquele dia nunca mais.

Encontrar Baurus foi fácil, encarar sua petulância justificável pela ocasião? Não tanto. Sim, o nobre guerreiro estava correto em seu comportamento ríspido e incisivo. Um maldito espião do Caminho da Aurora (a tal seita que assassinou o imperador) o perseguiu. Eu executei o espião, sem magia alguma. Somente com o visceral martelo que encontrei em mais uma destas pequenas cavernas lotadas de saqueadores que não tem pretensão alguma de dialogar comigo; azar o deles.

Lá estava o primeiro tomo do Caminho da Aurora.

Maldito seja aquele imperador que me amaldiçoou com uma missão a cumprir. Ele pensa que todo Dunmer que sabe usar uma lâmina e desferir um ou dois feitiços é digno de se cunhar de ser a reencarnação de Indoril Nerevar? Se aquele escolhido de Azura tem tanto tempo a desperdiçar partindo de Vvardenfell — lugar que, por profecia, ele deveria proteger — para viver lindas férias em Akavir junto de homens-serpentes-macacos-urubus, o que diabos eu, um ladrãozinho de Sadrith Mora, deveria fazer?

Salvar uma terra que cospe minha existência, ordena meu povo à distância, ao mesmo tempo que negligência tudo de ruim —  como o próprio comércio de escravos da região em que vivi e que, acima de tudo, me fez de prisioneiro por algo que eu nem sequer cometi? Claro que eu não posso me proferir como um patriota, eu sequer tenho saudades de minha juventude Morrowindiana. Mas o desprezo pelo meu povo é maior do que por minhas próprias ações.

A cereja desse banquete desgraçado é ter que enfiar minha cara na Universidade Arcana da Cidade Imperial, atrás de mais um tomo — e com muita sorte, não topar de novo com aquele pastiche de estrume que ousou “auxiliar” minha nobre jornada. Que os Nove me livrem de cruzar caminho daquele Khajiit outra vez.

Apesar de tanto lamentar, a pessoa com quem precisava dar audiência, Tar-Meena, era uma argoniana honesta e direta em suas palavras, e me agraciou com o segundo tomo necessário. Esse desconforto felizmente foi embora. No entanto, é o terceiro tomo que me instiga. Essa jornada está muito longe do fim. Meu descanso me parece uma verdadeira obra de ficção.

Sexdas, 19:45, 7º de Fogo do Coração, 3E 433.

Oblivion Remastered análise

Dez horas se passaram. Estou à espera de um tal Gwinas, um comprador qualquer, mas que tem em suas mãos o tomo que preciso recuperar. Phintias, o bibliotecário, me surpreendeu. Se recusou a vender o tomo a mim. Não que eu tivesse como pagar. Agradeço ao falecido Uriel, que me deu uma missão, mas não deixou nem um septim no bolso.

Honestamente, o que eu poderia fazer? Bater com um livro na cabeça do homem? Tive esta ideia, mas achei melhor poupar os esforços.

Injuriado de talvez ter perdido a oportunidade de continuar minha missão, apenas por uma falsa sensação de boa fé que me obrigo a passar no dia a dia. Foi naquele momento que me peguei numa sensação confusa; algo constante em minha jornada, como uma presença que não vejo, mas que insiste em me guiar por caminhos que não escolhi.

Algo em minha mente marcava a exata posição geográfica no qual o tal Gwinas estava. O tipo de coisa que, desde o dia que conheci o Imperador, ocorre em minhas missões, como se algo além de minha mente soubesse cada passo de minha encruzilhada. Essa espécie de bússola sensorial me levou para um lugar que deixou meu dia ainda mais ridículo. Hotel Tiber Septim era o nome daquela pousada…

Aquilo me fez gargalhar feito um louco nas ruas de Cyrodiil; e os cidadãos que já me mal encaravam por razão da minha ancestralidade e raça, se prestavam a queixas e olhavam com repulsa. Mas que se danem. Ao menos aqueles que têm bom senso já ouviram sobre minhas façanhas na Arena.

Lá fui recebido por um homem frustrado com a cobrança de propina por um dos guardas imperiais da região. Confesso que não recordei nenhum dos nomes em minha cabeça, pois, pouco distante, na pousada, avistei aquele com quem eu precisava me encontrar: um Bosmer evidentemente mesquinho que acredita que, com ouro no bolso, tem uma imposição moral a outros.

Meu bom humor deixou isso passar. Apenas destaquei o tipo de brincadeira na qual ele estava se metendo. Príncipes Daédricos não são tão fáceis de enganar ou manipular quanto burgueses ou feiticeiros caquéticos; é o tipo de poder que merece ser esquecido. Saber de quem foi a culpa pelo assassinato do imperador foi o suficiente para colocar o garoto em estado de choque (ainda mais pálido do que já era) e ele enfim largou seus vislumbres e devaneios infantis.

Pouco antes de ir embora, pensando em que tipo de buraco eu tentaria descansar minha cabeça desgastada, uma mulher chamada Augusta Calidia, a anfitriã do Hotel, se apresenta e me convida para pousar. Já eram 21:25, afinal. Honestamente, quarenta moedas não é o dinheiro que eu goste de gastar somente para ter uma cama confortável em um hotel de nome tão escarnoso quanto esse. Mas gastei. Talvez o cheiro de Skooma no vestido dela tenha entorpecido meu julgamento.

Na cama, reflito o que diabos Talos, o Nascido do Dragão, pensaria no uso de seu nome de forma tão banal quanto este. Talvez seja uma dica de que, mesmo alguns dos maiores ícones de fé perdem seu espaço no dito mundo moderno. Mas por que esses príncipes Daédricos, não? Uma reflexão para uma noite mais calma, talvez.

Sabdas, 05:45, 8º de Fogo do Coração, 3E 433.

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Acordo. Pergunto-me se seria justo comigo mesmo levantar e continuar. Todavia nenhuma resposta ascende em minha mente, nem algum herói ancestral ou coisa do gênero. Isso é realmente lamentável. Caminhando para reencontrar meu colega de missão, Baurus, na taverna. Um homem sincero com seus deveres e que, honestamente, venho considerando como o mais próximo de uma amizade nesta jornada.

Um dos poucos bons homens que conheci nesse lugar. Seu coração pertencia ao respeito às memórias e legado de seu imperador. Mas minhas mesquinharias me impediram de acreditar que hoje o dia me reservaria algo que me fizesse refletir boas sensações. Baurus me convidou a ir aos esgotos imperiais… não seria minha primeira vez naquele lugar e nem a dele. Ele estava lá no dia que Uriel Septim partiu. Eu não me recordava disto; na realidade nem crescia em minha mente refletir sobre tal.

Todavia, ao pesar de aceitar o convite, forjei um compromisso fajuto para o homem e rastejei-me para as florestas ao redor desta cidade, como um viciado em Skooma corre atrás de um bom Açúcar Lunar, mesmo sabendo que isso não vá providenciar aquilo que tanto ama. Somente um fragmento do seu objetivo de desejo.

Somente estou cansado da posição que Uriel Septim VII me confinou e me obrigou a seguir. Um caminho de herói não foi o tipo de coisa que eu sonhava, nem o que minha família sequer desejou. Agora, após décadas, entendo um pouco do carinho deles pela agricultura de Vvanderfell. Talvez até a falta de emoção na vida, obstante de tantas tramoias e assassinatos a sangue-frio. A regra deste mundo me perturba na necessidade que tenho, todo dia, de realizar inúmeras execuções de seres com uma consciência.

Quando Calidia mencionou a Arena, minha mente girou como um pobre desgraçado envenenado por um Bull Netch, clamando por ajuda. Fazem apenas alguns dias desde que quebrei o juramento que fiz a mim mesmo: nunca mais conjurar um feitiço desde meu cárcere. Uma promessa feita durante minha curta jornada por este lugar amaldiçoado. Mas foi justamente ao quebrar esse voto e tais premissas que eu enfim entrei em ascensão, ao ponto de me tornar um campeão da Arena. Pobre coitado seja aquele Orc-Vampiro. Se ao menos tivesse outro jeito…

Tantas histórias tiveram como ponto final a minha mão impregnada do sangue e carne de outros. Sem ouvir sequer um pedido de misericórdia, seus olhos vazios me incentivaram a encerrar suas vidas com os conhecimentos que acumulei em meus escambos intercontinentais. Orgulho e honra não são provérbios que consigo carregar com tanta facilidade.

Se pelo menos fosse esta dor que atormentasse meus sonhos, eu conseguiria me culpabilizar de forma mais lógica. No entanto, são em noites como a de ontem que minha mente é sequestrada e sobrepujada sobre a visão daquilo que não vivi, mas já vi. Lugares que conheci e outros que pressinto já ter ouvido falar me seduzem à memórias que sei que não são minhas, mas em breve serão.

Uma jornada terrivelmente parecida, ainda regrada no sangue. Todavia, de algum modo, mais vívida do que esta que vivo; uma sina lúdica que escarna vislumbres mais singelos do mundo que vivo. Claro que talvez seja culpa de velejar em portais que me levam ao mundo de demônios, no entanto mesmo tais reinos dimensionais materializam-se em minha mente de uma forma mais lógica, mais heroica e convincente.

A própria linguagem como escuto e percebo se transforma. Algo mais enxuto, mas ainda assim arcaico. Sem a maleabilidade do que digo e penso aqui. A única coisa que realmente me parece melhor nesta realidade, que a esse ponto nem sei se pressuponho que seja a verdadeira, por incrível que pareça, é a sensação de executar meus oponentes. Como eles reagem e sentem-se a cada víscera que atinjo e destroço. Isso me enoja. Mas na jornada que o próprio imperador me encabeçou, é onde eu realmente encontro prazer e uma maldita gratidão. Quase como surgissem em minha mente pequenos troféus e congratulações de minha ação, que são festejados por um povo que não sabe sequer tudo que um dia já vivi.

Atravessar o mundo parece uma tarefa mais fácil de se realizar quando penso num lugar e quase que subitamente percebo que estou lá, como se o tempo fosse picotado. Melhor do que andar naquela terra que só me oferece sangue e espólios inúteis. A confusão em minha mente está muito longe de se encerrar. O meu mundo a cada dia que passa se torna algo mais próximo de um simulacro do que algo que realmente é. Independente da beleza que vejo em Cyrodiil, a vida perde propósito. Diferentemente do que já passei em Vvanderfell e, acredite se quiser, na terra dos nórdicos. Ao menos o propósito estava lá comigo. Sigo em frente e sei que continuarei até cumprir um propósito…

Talvez o que realmente tenha me afetado foi, depois de tanto tempo de viagem, aquele bastardo ser venerado por um bando de Lâminas de forma tão patética e desconfortável.

Meus esforços e sensação de ter finalmente recebido a jornada de minha vida estão afundando numa sensação de inveja. Esta é uma verdade que tenho plena noção, e a aceitarei. Pois transpassar esse sentimento seria atravessar o meu próprio ego. Se foi o próprio imperador que descobriu que um escravo era Nerevarine, eu acreditei e ainda acredito que sou destinado a coisas bem maiores do que ser um Elfo Mensageiro.

Pergunto-me se um encontro às cegas com Sheogorath me faria assimilar toda essa loucura ou, quem sabe, aceitar de bom grado outra — uma que faça meus dias ainda mais interessantes do que essa vida em Oblívio.”

+Leia também: A vida em Oblivion

Oblivion Remastered análise

Uma cópia gratuita de The Elder Scrolls IV: Oblivion Remastered foi concedida pela Bethesda para análise no Recanto do Dragão.