Alguém no passado do Recanto apontou que eu falo muito isso então fico receosa em dizer, mas Howl’s Moving Castle (O Castelo Animado) é uma obra muito especial na minha vida. Na verdade, na de muita gente. Filmes do Studio Ghibli possuem esse poder, mas as circunstâncias que me levaram a assistir esse em específico… mudaram minha vida. É, talvez vocês estejam acostumados a me ouvir falando isso, mas me escutem, tá?
A primeira vez que eu assisti Howl’s Moving Castle foi em 2018, com a pessoa mais especial da minha vida. Não, não foi o Benjamin, quando eu digo especial eu digo… romanticamente, uma maneira poética de referenciar o já poético conceito de amor verdadeiro. Vou livrá-los de ter que escutar minhas aventuras românticas que são honestamente muito depressivas, e focar em falar sobre o filme.
Quando eu assisti, ao lado dessa pessoa, eu senti uma coisa completamente nova pra mim na época. Poucas obras já me fizeram sentir isso antes. É… difícil explicar, até porque faz bastante tempo, mas eu senti uma paz tão grande. O sentimento de felicidade plena, feito ainda mais forte pela companhia. Por muito tempo foi meu filme favorito e eu não teria vergonha de dizer o mesmo atualmente (embora, honestamente, eu sei BEM qual é meu filme favorito hoje em dia), não teve outra experiência como essa na minha vida. Claro, em partes não foi só pelo filme, mas é essencialmente impressionante que uma obra possa fazer alguém sentir o que eu senti. Eu provavelmente tive a minha melhor noite de sono naquele dia também, e uma semana provavelmente ótima mesmo que o mundo estivesse caindo aos pedaços na minha volta durante a época. Eu sou de repetir adjetivos com frequência, mas acreditem em mim, sempre que eu falo que algo é “mágico” eu falo com o coração.
Mas com o tempo, a memória vai esfriando e… bem, a minha relação com essa pessoa, que ainda ocupa o mesmo espaço na minha vida que sempre ocupou, mudou bastante. Adicionalmente descobri que O Castelo Animado é um clássico cultural que todo mundo já tinha assistido, atualmente a minha família toda viu esse filme por algum motivo. Com isso vêm muitas opiniões e diferentes interpretações da obra, que por si só é a interpretação de um livro (que eu vou comprar daqui a pouco). Eu também vi diversas críticas a esse filme, e formei algumas das minhas (que hoje em dia parecem estúpidas). Ele caiu de filme favorito para… terceiro filme favorito! O que não significa muito mas pra mim, sim, significava.
Eu de fato reassisti antes, mas nunca com meu coração preparado. Eu tinha assistido com algumas pessoas apenas por assistir, e acredito que a experiência para eles tenha sido melhor que a minha que já tinha visto. Ainda assim, uma dessas pessoas é o Benjamin, que recentemente me chamou pra ver com ele de novo, e só nós dois. Isso já é bem melhor que a última vez, porque eu devo mencionar esse amigo em todos os meus textos pelo simples fato que ele é meu melhor amigo no maior e melhor sentido da palavra. Com ele, eu pude ver O Castelo Animado como eu havia o conhecido, com o mesmo coração que me trouxe uma das melhores experiências com cinema da minha vida, senão a melhor.
O Castelo Animado não é um filme perfeito e, ao mesmo tempo, é. Eu tinha algumas críticas sobre ele no passado e algumas que escutei de outras pessoas também, e mesmo que elas sejam reais… parecem tão supérfluas. Eu nunca não liguei tanto assim pra algo e parece que isso é realmente vem do filme.
O Castelo Animado é sobre uma menina chamada Sophie. Ela trabalha como chapeleira ao lado da sua irmã Lettie. Sophie e Lettie são extremamente diferentes em aparência, e Sophie se considera muito feia. Ela não é, mas tipo… a Lettie é completamente maravilhosa. Dá pra imaginar que Sophie nunca tenha recebido muita atenção pela sua aparência, e eu não posso não me sentir culpada porque nesse momento eu estou usando uma foto da Lettie no Twitter pelo quão absurdamente linda ela é. Ela só aparece em uma cena!
A história é um romance que também fala de auto-aceitação e alguns outros temas. O que faz a trama começar é que Sophie é amaldiçoada por uma bruxa a se tornar uma mulher velha. Agora, a velha Sophie busca a ajuda de outro feiticeiro, conhecido por roubar o coração de lindas donzelas. A menina já achava que não teria problemas com ele antes, mas agora que ela é apenas uma velhinha, muito menos. Durante o filme é bem interessante ver como Sophie se acostuma com sua situação, e começa a se aceitar pouco a pouco (não como uma vovó mas… como Sophie, em geral). Ela lida com muitas dificuldades que viriam com a idade, principalmente com a coluna. E ainda assim, ela mantém seu espírito vivo de uma mulher jovem e animada, sendo um dos personagens mais legais da Ghibli na minha opinião.
Quando Sophie eventualmente encontra o castelo de Howl, um amálgama de peças estranhas forma uma casa gigante que pode andar por aí, e então o filme engata em tudo que ele quer passar por completo. É aí que eu paro de só narrar o que acontece.
O mundo de Howl’s Moving Castle é, em partes, o mundo real. Quer dizer, os países do nosso mundo são referenciados diversas vezes, mas esse universo é um pouco diferente. Primeiramente, o filme se passa em um país fictício, embora seja grande e poderoso. Nesse mundo também é extremamente comum o uso de magia; na verdade diversos mágicos e feiticeiros são afiliados ao governo, até Howl! Na verdade, Howl é afiliado do governo em mais de duas identidades secretas. Pouco a pouco nos cenários e diálogos esse mundo é melhor introduzido ao telespectador, sem realmente ser explicado diretamente. O mesmo é feito com os personagens, que se tornam mais completos e detalhados com o tempo, por vezes sendo até bem profundos. Esse filme tem um respeito absurdo pelos seus personagens, sempre dando à eles importância e um lugar na obra mesmo quando seus arcos “terminam”. A maioria dos personagens, no final do filme, são amigos, e se vêem como família. Marco, o aprendiz do Howl com a voz do Pablo do Backyardigans, o demônio do fogo Calcifer que controla todo o castelo, o cachorro “espião” da vilã Hin, a bruxa do pântano que amaldiçoou Sophie, o próprio feiticeiro Howl… para Sophie, todos esses são família. Isso é lindo, de verdade.
Embora exista realismo na escrita e mensagens de Castelo Animado, muito dessa história acaba por ser… infantil, de um jeito incrível. É claro que é inspirado em um livro, mas passa o perfeito sentimento de uma obra infantil poética e bonita, uma fábula antiga passada pelas gerações. O Castelo Animado te lembra da dificuldade de crescer enquanto mostra que existe juventude em todos nós. Não tem como não se sentir uma criança de novo com esse filme.
Existem muitas coisas no filme que parecem “incompletas”, e ao mesmo tempo, claramente não são. Existe uma guerra acontecendo durante a história e ela é referenciada a todo momento. Bombardeios, propaganda militar, o envolvimento extenso de magia, diversas práticas militares horríveis… claramente existe um comentário e uma mensagem que é até bem passada pelo filme. Mas, na verdade, o filme não é sobre essa guerra. Ele fala um pouco dela, mas nunca vemos o embate chegar no estopim. O “estopim”, na verdade, seria o momento em que a guerra se volta para os protagonistas e não para o seu embate real. Nós nunca temos uma visão clara das motivações por trás da guerra também, e ao menos eu nunca consegui descobrir apenas pelo filme que países estavam lutando uns contra os outros. Talvez o filme se passe nos dois países de tempos em tempos, ou talvez uma guerra civil dentro do próprio território do país. São informações que estão faltando mas, ao mesmo tempo… não importam. Você chega a sentir que falta algo, mas se sente completo ainda assim.
Os personagens recebem bons finais, bom desenvolvimento e o filme um final feliz lindo digno de um conto de fadas. Mas tudo contado de uma maneira pessoal e humana, que aproxima o telespectador da jornada dos personagens. A natureza pacífica e sentimental de um filme da Ghibli ajuda muito a passar as mensagens da obra, e diversas vezes você verá todos os personagens em momentos de fraqueza. Não só quando ficam tristes ou com raiva, mas quando eles de fato agem de forma errada. Quando eles erram de verdade. As imperfeições de cada um são essenciais para o eventual final feliz da história, que mesmo que pareça que foi feito com intuito totalmente infantil, foi construído com cuidado. Também é fácil notar como a trama é imprevisível nessa história. Você não imaginaria que a vilã principal dos primeiros minutos do filme se tornaria uma velhinha calma que, embora tenha seus negativos, também faz parte da família que a Sophie encontrou. E é muito interessante que a grande maioria dos personagens da história está amaldiçoado de alguma forma, e suas maldições os ajudam a entender mais sobre si mesmos. Uma boa parte dessas maldições costuma afetar a forma física dos personagens, até que eles eventualmente retornem ao seu estado real, sabendo quem realmente são e se aceitando.
Em especial, a complexidade da escrita é muito bem apresentada pelo personagem titular do filme: o feiticeiro Howl. No início, ele parece realmente uma figura perfeita. Um homem gentil, inteligente, forte e misterioso. Não fica irritado quando Sophie simplesmente invade seu castelo em sua ausência e passa a morar lá, nem tem qualquer opinião ruim quando isso acontece DE NOVO, trazendo seus maiores inimigos para perto. Mas, ainda assim, no primeiro sinal de algo dar errado e sair dos seus planos, Howl enlouquece por completo. Além de entrar em um estado depressivo absurdo que quase destrói o castelo por inteiro (já que está ligado às emoções do mago), ele tem um chilique extremamente infantil sobre a cor do seu cabelo. A auto-estima de Howl também está ligada à sua aparência, e se ele não for lindo ele sente que nada mais vale a pena. Essas atitudes infantis são incríveis para o decorrer da história, porque combinam tematicamente com Sophie, uma mulher que sempre foi extremamente madura mas agora… é uma senhora de idade fisicamente. Sophie é a chave que muda a vida de todos os personagens da história, todos mesmos, sendo simplesmente ela mesma. Howl também é um personagem que tem muito medo e insegurança, e não costuma enfrentar seus problemas frente a frente. Sophie muda isso nele, dando à ele mais esperança, confiança e… algo para proteger. Outra coisa sobre Howl é que ele sempre usa sua magia para si mesmo, pelo menos até conhecer Sophie.
Tudo sobre esse filme é mágico. A sua estrutura slice of life, as maneiras como a magia é apresentada e utilizada, a incrível animação do Studio Ghibli que nunca deixou a desejar antes… mas é a música sempre vai se sobressair. A trilha sonora de O Castelo Animado é uma das mais conhecidas e amadas no mundo das soundtracks, simplesmente pela carga emocional absurda que elas têm. Em especial, todo mundo conhece Merry-Go-Round of Life, a música tema cujo motif aparece durante o filme todo. Tem incríveis ensaios por aí explicando metodicamente por que essa é uma música tão maravilhosa então vocês não precisam da opinião de uma menina que dormiu lendo um PDF sobre teoria musical mês passado enquanto tentava aprender algo. Eu não sou muito inteligente, muito menos sobre música. Mas eu consigo sentir, e música é uma das coisas que eu mais aprecio no mundo. Eu me sinto confortável em dizer que Merry-Go-Round of Life é uma das melhores músicas já compostas, mesmo com sua melodia principal simples que parece ser fácil de tocar (Benjamin que disse isso, ele entende do assunto, eu não). Na verdade é o uso inteligente de melodias simples que fazem todas as músicas desse filme tão lindas como são. Não são apenas um acompanhamento para a obra, mas por si só são uma grande experiência.
Admito que eu tava com um bloqueio artístico absurdo. Não conseguia escrever sobre nada, mesmo que eu tenha bastante conteúdo e material pra falar sobre atualmente. Quer dizer, se tudo deu certo, foi postado alguns textos recentemente. Se eu postar na ordem que foram escritos, então posso dizer que os dois últimos foram feitos antes do writer’s block, mas esse aqui, não. Eu apenas adquiri inspiração enquanto fazia qualquer tarefa doméstica simples cantando Merry-Go-Round of Life, uma música de uns cinco minutos que eu, assim como muita gente, tenho decorada inteirinha. Só de CANTAROLAR a música (nem ouvir) todos os sentimentos retornaram e eu larguei os outros textos que eu comecei a esboçar só pra escrever esse aqui. Que bom que fiz isso. É claro, eu gostaria de ter feito um ensaio elaborado e mais interessante sobre uma obra como essa, mas meu amor por ela é extremamente pessoal. Nada mais justo que eu faça um texto com menos formalidade pra mostrar essa conexão.
Howl é uma das obras que me lembra alguns dos momentos mais felizes da minha vida, uma boa parte foi com a pessoa que mencionei antes. Eu ainda amo muito ela, de maneiras que vocês não acreditariam, mas o futuro meio que “já tá escrito”. Eu só posso viver com as memórias e a grande amizade dessa pessoa, que só com uma mensagem alegra meu dia. É impossível pra mim falar de O Castelo Animado sem pensar nos momentos maravilhosos que tive com essa pessoa, e uma das épocas mais importantes da minha vida inteira. Talvez, o período que estive com essa pessoa foi de fato a época mais especial da minha vida. Não era perfeita, mesmo nossa relação tinha vários problemas (principalmente por sermos muito jovens e dependentes emocionais), mas as memórias dos bons momentos são preciosas demais pra mim. Eu nunca, nunca, nunca vou esquecer dessas coisas. E várias delas pedem o agradecimento à esse universo de personagens que em apenas um filme conquistou meu coração — nossos corações. De muitas maneiras Howl mudou minha vida, e eu sei que a de muitas outras pessoas. Eu tenho certeza que vai continuar me aproximando das pessoas mais importantes da minha história, sendo uma das obras de arte que eu consideraria pilares para quem eu sou hoje. Obrigada pela leitura, tenham uma boa noite.