Em meu texto de Afterlove EP, menciono que eu não tinha uma ligação muito forte com os principais cenários de histórias como idade média, um futuro hipertecnológico ou coisas do tipo. Sempre fui mais o cara das coisas mundanas como um bom coming of age que fala das relações interpessoais ou, em muitos casos, relações com o trabalho.
Existem três momentos na minha vida em que o trabalho vai ser um tema importante: na adolescência, quando eu buscava desesperadamente ter dinheiro para comprar videogames, mas não arranjava nada; em um momento mais a frente como um jovem adulto que ainda não tinha emprego e veio a me politizar; e agora, cada vez mais perto dos 30 anos e com diversos trabalhos e empregos acumulando funções, eu enfim entendo que trabalhar é uma maldição.

Suga a sua vida, drena sua personalidade, acaba com o seu tempo, e no fim te torna numa engrenagem numa máquina — você se resume ao seu trabalho. Ser somente mais uma peça é a coisa mais comum em empresas no capitalismo tardio que vivemos e, bem, é isso que Repose vai vir tratar.
Repose é um dungeon crawler, com uma narrativa thriller sci-fi instigante que vai comentar rapidamente sobre como o trabalho pode (e aqui, literalmente vai) nos consumir. O protagonista está preso em um pesadelo crível, tendo que explorar apenas com as teclas de direção, uma luz e um machado. No caminho, você tem a tarefa de encontrar tanques de oxigênio. No entanto, nem tudo é como parece. O funcionário que estava ali antes de você está morto. As circunstâncias da morte dele são escondidas de ti, até você mesmo falecer.

Assim, você acorda e entra em uma conversa ainda mais estranha (meio fora de contexto) onde quem o recepciona é a Cynthia, que te dá os detalhes e parte do que se trata aquele mundo, por mais sombrio e implacável ele pareça. Até que você é jogado novamente naquele lugar que parece familiar, mas agora é para valer. Com passos e numero de ações limitados, você precisa explorar a estação de dados em busca de algo que nem mesmo você sabe o que é.

Na prática, Repose é um jogo interessante. Vai te fazer contar com precisão as ações que você precisa tomar, mesmo que boa parte da experiência seja um grande exercício de tentativa e erro, ainda é possível perder umas horas gastando suas ações de forma indevida. Mas a coisa mais interessante e cara à mim em Repose é a relação que o jogo tem com o trabalho.

Levando em conta que nosso protagonista sem rosto e nome foi jogado no mundo em busca da sua própria morte, o jogo cita diversas vezes como a empresa a que ele responde não ficará satisfeita com ações não profissionais (seja lá o que isso significa nesse contexto) ou de forma mais direta ao encontrar seu chefe. E, mesmo que você tente, aquele sistema não pode ser desfeito; é algo maior, algo que um simples trabalhador não consegue lidar sozinho.

Mesmo em uma situação insalubre como essa, o jogo ainda tenta fazer com que você encontre uma luz no fim do túnel. Sair de um labirinto sem forma e dar de frente com a vastidão do mundo soa até poético, mas eu não sei essa é a solução viável para os problemas apresentados. Mesmo que esse fim, para mim, não signifique nada.
Uma cópia gratuita de Repose para PC foi concedida pela Akupara Games para análise no Recanto do Dragão.