Não há nada como Crash Twinsanity. Desde sua apresentação até gameplay e história, Twinsanity é uma experiência como nenhuma outra, criada em meio ao caos absoluto e sobrevivendo em meio às piores adversidades. Desde infestações de bugs em todos os seus âmbitos até conteúdo majoritariamente incompleto, Twinsanity tinha tudo para dar errado, e sempre dá a volta por cima. Por bons motivos, é uma das experiências mais memoráveis da franquia para qualquer um que a teve, e em meio a tantos bons jogos do marsupial, este se destaca na sua criatividade e em coisas que só ele tentou fazer. E só ele conseguiu.
Na minha opinião, esse é o Magnum Opus da Traveller’s Tales que vai ficar marcado na história do estúdio e dessa franquia para sempre. Existe uma comunidade extremamente dedicada que atira para todos os lados da sociedade em relação à Twinsanity, e esse é um jogo que merece todo esse carinho. Agora, o estúdio é conhecido por desenvolver praticamente todos os jogos de LEGO, mas antes disso, mesmo desenvolvendo ótimos títulos, nenhum é tão bom quanto Crash Twinsanity, e infelizmente, nenhum é tão incompleto quanto Twinsanity também.
Essa aventura tem como ideia principal a cooperação entre Crash e Cortex durante a jornada para vencer um mal que causaria destruição para os dois lados da moeda. Acontece que a execução dessa ideia é muito inesperada e 100% original. Twinsanity possui uma visão bastante diferente do resto da franquia em relação ao seu humor, e sua profunda personalidade é expressa em tudo que o jogo se propõe a fazer. Nenhum Crash de antes ou depois deu tanta expressividade para a movimentação e animação dos personagens. Os rostos extremamente detalhados como se fossem desenhados a mão em um desenho, ou a maestria usada para criar cada uma das cutscenes inesquecíveis do jogo ambientam uma história que, embora simples, se separa de todos os outros Crashes por ser algo que nenhum outro chegaria perto de fazer.
Crash e Cortex flertam sexualmente durante o jogo todo com piadas extremamente gays e de duplo sentido; as quebras de quarta parede expressam uma crítica à própria situação do estúdio em relação a franquia (principalmente pelo fracasso de Wrath of Cortex), e a música composta 80% por sons de boca criaram uma estética que até hoje é mais Crash do que Twinsanity por si só. Não é à toa que Tag Team Racing seguiu a mesma vibe sonora nas suas trilhas. E sinceramente, a trilha sonora desse é o pico da franquia, sério. Não tem nada tão legal quanto essas ideias de música, vale a pena ouvir a playlist toda.
Twinsanity consegue ser uma sátira de uma franquia que já era baseada em ser insana e sem sentido, usando seus personagens de maneiras extremamente ousadas que nunca voltariam nem perto dessa intensidade no futuro. A relação parcialmente antagônica e parcialmente romântica entre Crash e Cortex é algo feito com coragem, e falta coragem na Universal de deixar isso acontecer de novo. Bizarramente, cada cena de interação entre os dois é sempre um fetiche mais esquisito que outro, mas escondido pelo “contexto” ou por quebras de expectativas. É sério, existe uma cutscene muito conhecida do jogo com o Cortex de quatro enquanto Crash olha muito fixamente pra bunda dele com a língua de fora, até se aproximar com as mãos prontas pra agarrar no bolo do doutor e cancelar a cena sexual com um chute para então usá-lo como prancha de jetski.
O humor obviamente não é (só) sexo gay selvagem, mas um timing e balanço perfeito com a sátira da quarta parede. Coisas como apresentar o último mundo dizendo que “era pra ter mais dois, mas não tivemos tempo de fazer” ou reclamar dos tempos difíceis que as vendas fracassadas de Wrath of Cortex trouxeram à Traveller’s Tales. É interessante ver o flerte não tão sutil com piadas um pouco mais adultas, mas ainda assim feitas de uma maneira infantil para não se tornar indecente. Twinsanity por vezes se torna uma sitcom bizarra que brinca com as coisas mais básicas de storytelling, enquanto luta com o tempo e dinheiro para realizar suas ideias.
É fato que Twinsanity teve um desenvolvimento completamente conturbado, porque existe muita coisa visivelmente incompleta no jogo. Somos apresentados a literalmente todos os vilões de Crash, pequenos ou grandes, no final da primeira fase, para então nunca mais vermos 70% deles. Tiny Tiger, Crunch, Koala Kong, Pinstripe Potoroo, Ripper Roo, O URSO POLAR DO CRASH 2???? Pois é, todos eles aparecem em uma única cena que denuncia sutilmente sua importância fundamental para o resto da história, e então são descartados. Fui informada pelo meu amigo Typhlosion o tempo todo sobre fases e ideias que foram descartadas, ou cenas que foram movidas de uma área diferente pela falta de tempo que houve na criação desse título. Mas, mais evidente que isso são as falhas técnicas que Twinsanity apresenta, criando um bugzinho novo (que te mata) a cada cinco minutos jogando, o que vira bastante engraçado.
Tudo isso levou a um jogo de razoavelmente curta duração com um potencial enorme que foi “desperdiçado”. Só que na verdade o que temos já criou um dos melhores Crash de todos, então conseguem imaginar o que poderia ter sido? Mas o que faz o jogo realmente valer a pena é a sua gameplay rápida inspirada em Crash 1, mas com suas próprias ideias inéditas até aqui. Por exemplo, as fases não são mais lineares. Na verdade, se assemelham com um collectathon, Spyro mesmo, em que você pode só desviar do caminho principal em busca de um coletável o tempo todo. É claro, isso existe em Crash, mas tenham noção que em Twinsanity toda fase é um hub world inteiro para explorar, dando um sentimento muito mais aberto à esse jogo.
A progressão em si entre as fases também é muito diferente dos costumes da franquia. Você, por exemplo, nunca sabe que trocou de fase se não abrir o menu. Na verdade, a história do jogo nunca para e nunca é cortada por loadings. Você termina a fase no início da próxima e tudo que separa as duas é um checkpoint que salva o jogo. Assim, resgata o fluxo direto e rápido do primeiro Crash de uma maneira diferente, o que faz com que você nunca pare de experienciar Twinsanity no seu pico.
A movimentação do Crash é bem mais limitada do que nos jogos anteriores, mas isso faz com que as fases sejam melhores pensadas para seus ataques e pulos simples, o que o deixa exercer muita criatividade em suas ideias sem se prender à mecânicas específicas. Ainda assim, a gameplay de Twinsanity muda o tempo todo. Você pode controlar o Crash. Ou controlar Crash levando o Cortex pelo cristal (que ele coloca na virilha, por “algum motivo”). Ou sair rolando enquanto os dois brigam, ou usar Cortex de jetski, ou simplesmente mudar de personagem: podendo usar o próprio Cortex ou sua sobrinha, Nina Cortex, meu amorzinho. Ainda me disseram que a Coco seria jogável em algum momento, e parece que ela teria um papel muito maior na história em ideias que nem são tão iniciais do jogo. Vale mencionar os momentos que a Gameplay tem um pequeno twist como pedir pra você liberar o caminho para Cortex fugir de um urso, ou fazer o doutor preso em um pequeno cano passar por dentro de muitos outros interconectados para abrir o caminho. O que não falta é criatividade.
Muitos conceitos de Crash foram minimamente alterados para melhor se encaixarem nessa nova aventura. Como as caixas mola não pedirem que você segure o pulo para ir mais alto, ou a não existência do High Jump, que torna fases baseadas apenas nos dois pulos normais do Crash. Também é muito interessante como as fases, embora totalmente diferentes, consigam referenciar coisas dos jogos passados, como as seções de fugir de alguma coisa. As lutas contra os chefes também são muito criativas e ainda bastante Crash, talvez muito melhor do que a maioria dos outros da franquia.
É inegável que a liberdade dada para Twinsanity trouxe o melhor possível, mas ao menos vou apontar que não gosto muito do que fizeram com a Coco. Ela se tornou um alívio cômico para duas cenas, que só faz merda e age como uma criança. Nunca mostra inteligência e só é forte pra cagar com os planos do pessoal. Claro, em só duas cenas. Por algum motivo tiraram era pro ridículo e ficou por isso mesmo, talvez fosse melhor nem trazer ela pro jogo se for pra isso né.