As lições dos games sobre foco, recompensas e motivações na vida

Don't Starve
Don't Starve. (Foto: Klei Entertainment)

Em um mundo onde temos acesso instantâneo a uma infinidade de livros, vídeos, filmes, séries, memes e discussões nas redes sociais, a tarefa de “só sentar e se concentrar em algo” parece cada vez mais impossível. Mesmo assim, todos aqueles que são familiares com videogames (qualquer jogo vale, inclusive os de celular) percebem como é fácil focar tanto a ponto de se viciar e se perder dentro das telas.

 (Jezael Melgoza via Unsplash/Reprodução)

Então, fica a dúvida: no turbulento século XXI, como é que videogames conseguem nos prender de forma tão eficaz, enquanto nos imergem em seus universos tão encantadores? Será que dá pra usar esses “segredos” para focar nas tarefas mais chatas do dia a dia?

Esse texto tratará brevemente de alguns elementos como o transtorno de déficit de atenção (mas os efeitos e estudos comentados aqui se aplicam para todos os tipos de pessoas), as filosofias de Game Design que tanto nos prendem aos jogos e então se encerrará comentando algumas teorias da psicologia e da educação, conectando todos os pontos.

Uma das minhas principais inspirações para esse texto foi a seguinte frase do Bruce Lee: “Ao invés de comprar para seus filhos todas as coisas que você nunca teve, você deve ensinar a eles tudo que nunca lhe foi ensinado. Material se desgasta, mas conhecimento perdura.” 

(Yaopey Yong via Unsplash/Reprodução)

Esse conteúdo foi elaborado com ajuda da Psicoterapeuta Comportamental e Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento Yara Garzuzi. O conteúdo é dividido nos seguintes capítulos:

  1. Por que sofremos de transtornos como déficit de atenção?
  2. Por que videogames são tão bons em prender nossa atenção e o “Feedback Instantâneo” tem a ver com isso?
  3. O que Game Design nos ensina sobre recompensas e motivação?
  4. De que forma podemos introduzir recompensas na nossa vida?
  5. Capítulo Surpresa. Sem spoilers, hein? Leia tudo antes!

Capítulo 1: Por que sofremos de transtornos como déficit de atenção?

Primeiramente, vamos entender um pouco sobre o transtorno conhecido como Déficit de Atenção (DDA). Esse distúrbio é correlacionado diretamente ao córtex pré-frontal do cérebro, e é mais presente em pessoas que possuem códigos genéticos específicos que as tornam propensas a sofrer do transtorno, que é desencadeado por fatores externos como emoções ou comportamentos específicos.

Mas vamos voltar um pouco e tirar alguns estigmas do caminho: “Déficit de Atenção” não significa que há uma falta de atenção, mas sim um excesso, já que as pessoas que sofrem desse transtorno acabam analisando incontáveis elementos simultaneamente.

(Startup Stock Photos via Pexels/Reprodução)

Imagine que é sábado. Você acabou de chegar da padaria, sentou no sofá e decidiu curtir sua assinatura do Globoplay assistindo The Good Doctor. Passam-se 4 minutos e 37 segundos e você começa a se sentir incomodado com o tique-taque do relógio, os motoqueiros passando na rua, o vizinho conversando no telefone, o gotejar da torneira que você abriu para lavar as mãos depois de voltar pra casa, o LED do celular que ficou piscando por conta de uma mensagem não visualizada no WhatsApp, o cheiro de churrasco queimado que o barzinho da esquina faz todo fim de semana… e por aí vai.

São sobre experiências frustrantes e estressantes como essa que a influenciadora americana Jessica McCabe decidiu expor ao mundo como é sofrer e lidar com o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, através dos seus vídeos do canal “How to ADHD” e em palestras como na sua emocionante apresentação do TED.

Apesar de eu ainda recomendar que todos assistam, pelo bem do tempo vamos sintetizar três dos principais pontos que Jessica trouxe na palestra:

  1. Se uma pessoa com DDA não consegue ficar parado para se concentrar ou se distrai facilmente de algo, a provável razão é porque o cérebro precisa de mais estímulo para focar naquilo, e simplesmente não se sente atraído pela tarefa em questão (seja fazer um trabalho, ver um filme ou assistir uma aula expositiva).
  2. Se a pessoa procrastina muito, é porque confronta déficits nas suas funções executivas (lembra do que falei sobre genes e o córtex pré-frontal?) e encontra dificuldades para iniciar tais tarefas, isso sem contar no estresse de ser taxada como “alguém que não se importa com as coisas”.
  3. Por fim, quando outros acreditam que ela simplesmente “não se esforça o suficiente”, talvez seja mais saudável entender que as pessoas que sofrem desses transtornos simplesmente não conseguem se adaptar bem em uma sociedade que não foi construída para compreender e atender suas necessidades.

Em suma, talvez seria ainda mais preciso se chamássemos de “Déficit de Foco ou Concentração”, já que o problema aqui definitivamente não é a “ausência” de atenção, mas sim a incapacidade de focalizá-la em um objetivo específico. Capisce?

Voltando ao funcionamento do DDA: esses transtornos, premeditados por genes específicos, são “habilitados” através de fatores ambientais. Que tipos de fatores? Eles podem ir de estressores pequenos do cotidiano a traumas. Mas vamos falar da causa mais comum, a mesma que é usada para tratar esse transtorno: a rotina.

Eu também penso o que você provavelmente está pensando: ter uma rotina é chato, já que ela tira flexibilidade do nosso cronograma e é difícil de se seguir com consistência e tudo mais… A questão é que para quem sofre de DDA, ou até mesmo para pessoas desorganizadas no geral, a ausência de uma rotina pode contribuir fortemente como um desses “agentes ambientais” que causam estresse desnecessário e desencadeiam o transtorno.

Basicamente, se você vivesse todo dia com horários vastamente diferentes, acordando, almoçando, trabalhando, se cuidando e se divertindo em momentos aleatórios e imprevisíveis, teria que se preocupar com incontáveis variáveis constantemente.

E se nessa semana você esquecesse de lavar a roupa? Ou não compraria o pó do cafezinho? E se esquecesse de pagar a conta de luz, ficando sem o chuveiro quente pra começar o dia? Ou se deixasse seu celular descarregar, e não pudesse chamar um Uber?

“I forgor”. (Nathan Cowley via Pexels/Reprodução)

É aí que o poder da rotina entra: ao organizar e automatizar tarefas mundanas e de baixa importância, as pessoas deixam de gastar energia demais se preocupando e analisando as ditas cujas porque simplesmente passam a realiza-las de forma constante e consistente, não exigindo sua concentração e não desperdiçando o esforço cognitivo delas com isso. Organizar seus pensamentos, essa é a frase-chave daqui.

Capítulo 2: Por que videogames são tão bons em prender nossa atenção e o que “Feedback Instantâneo” tem a ver com isso?

E então, Jesse disserta no seu vídeo “Porque você consegue focar em videogames (e como hackear isso)” sobre porque essas pessoas, que sofrem de DDA (e todas as outras pessoas também!), conseguem se concentrar tão facilmente no mundo dos videogames; mal sabe ela que a tese de seu vídeo é sobre um dos pilares do Game Design.

Tanto o vídeo quanto o texto “Um Modelo Circular de Gameplay”, do lendário site para game designers Gama Sutra, discutem sobre o mesmo conceito primordial no design de um produto de entretenimento interativo: o Loop de Feedback ao Usuário.

Um modelo simplificado do ciclo de gameplay (GameDeveloper/Reprodução)

Resumidamente, esses produtos funcionam da seguinte forma: um agente humano recebe um fluxo de informação audiovisual do videogame (input), analisa e compreende a situação apresentada, realiza uma ação (como apertar um botão ou mexer no joystick, o output), as regras correspondentes naquele ambiente são aplicadas (o personagem anda, pula, bate como resposta) e o jogo emite um feedback instantâneo que reflete a alteração do estado do jogo (o personagem se mexeu e emitiu sons de passos). Esse modelo se aplica de jogos desde Candy Crush até Cyberpunk 2077, apenas em escalas diferentes.

Aqui nos deparamos com mais um conceito conhecido por game designers como Game Feel ou Game Juice: mais especificamente, quais são esses elementos de “feedback” audiovisuais apresentados para o jogador?

De forma resumida, podemos falar de elementos como, por exemplo, os Doze Princípios da Animação, que consistem em trazer sensações ainda mais fortes ao “quebrar” animações 2D e 3D fazendo elas quicarem, se esticarem, esmagarem e serem absurdamente exageradas no geral. Se você trabalha na área de animação, já viu esse vídeo com certeza.

Os efeitos audiovisuais não param por aí: balas de tiros gigantes e barulhentas, screenshake, explosões extremas ou pontuações de neon piscando na sua tela.

Um bom exemplo de jogo com bastante Game Juice é Hotline Miami. (Tenor/Reprodução)

Para analisar esses efeitos na prática, assista a palestra “Juice it or Lose it”, dos desenvolvedores do Estúdio Grapefrukt, disponível abaixo. Se você não tiver 15 minutos de sobra, veja a comparação que começa aos 14:10, onde eles mostram um jogo básico e imediatamente adicionam dezenas de efeitos exageradíssimos de uma vez só.

Então, no fim das contas, a resposta para a pergunta do título desse capítulo é simples: o jogo reflete as ações do jogador de forma instantânea, eficaz e muito chamativa, dando ao jogador uma sensação de poder e importância naquele universo, já que suas ações possuem consequência óbvia e imediata o tempo todo.

Se você não tem experiência alguma com jogos, pense em como seria se sempre que fizesse um bom trabalho, se divertisse ou ajudasse alguém, seria imediatamente recompensado com um sorvete, palavras de encorajamento, um abraço, flores ou algumas horas de descanso (o que você preferir, serve). Seria legal, não?

Vale pontuar, é claro, que essas recompensas não podem e nem devem ser dadas o tempo todo: a precisão é necessária pra se ter um equilíbrio. Os jogos te apresentam com um desafio e te dão recompensas de acordo com o seu investimento e habilidade, assim como provas da escola e as notas que elas te dão depois. Se tudo fosse fácil demais, as coisas só ficariam extremamente entediantes ou, pior ainda, viciantes.

Um clássico pra quem gosta de sofrer, a imperdoável franquia Souls da From Software (Tenor/Reprodução)

Capítulo 3: O que Game Design nos ensina sobre recompensas e motivação?

Nesse capítulo, vamos explorar um pouco mais sobre dois fatores cruciais na nossa vida, tanto quando falamos sobre hobbies ou atividades divertidas quanto em tarefas arbitrárias como um emprego ou estudar para provas: as Recompensas e as Motivações Extrínsecas e Intrínsecas

Esse trecho tem fortes inspirações no vídeo “O Truque Psicológico Que Pode Transformar Recompensas em Problemas”, do canal Game Maker’s Toolkit (legendas em português disponíveis), que você pode conferir por completo.

Um estudo sobre os dois tipos de motivação começou em 1970, onde três grupos de crianças em uma sala foram divididas. Todas tinham o objetivo de desenhar, e todas gostavam da prática, mas seus tratamentos seriam diferentes: um grupo seria informado que iria receber uma recompensa ao desenhar, o outro não seria informado e ganharia uma recompensa inesperada e o terceiro grupo não receberia nada, apenas desenharia.

Ao final de algumas semanas de testes, resultados interessantes e consistentes foram obtidos nesse e em outros estudos similares: o grupo dos surpreendidos foi o que mais se sentiu motivado, com uma taxa de participação de 18,09%, seguido pelos que não foram recompensados com 16,73% e, por fim, os que foram recompensados e informados previamente com apenas 8,59% de participação, sem contar que seus desenhos passaram a ser mais rápidos e de menor qualidade.

Para complementar ainda mais a situação, as crianças que tiveram recompensas prometidas pararam de receber tais presentes, e logo também desistiram de desenhar.

(Yogendra Singh via Unsplash/Reprodução)

Essa situação também foi observada em uma publicação do fundador da Klei EntertainmentJamie Cheng, que correlacionava conceitos de Game Design, motivação e a vertente behaviorista da psicologia. Na época, o estúdio estava experimentando ideias para seu então novo jogo de aventura, Don’t Starve, em 2012.

De início, pessoas chamadas para testá-lo não compreendiam os objetivos do grande e misterioso mundo, ficando perdidos e imediatamente desistindo de jogar.

Para resolver isso, a Klei fez pequenos tutoriais com elementos básicos: “como sobreviver as primeiras 4 noites”, “como colher recursos e comida” e “como fabricar as primeiras ferramentas”, dentre outras missões que ofereciam recompensas ao serem concluídas. 

De caldeirões a alucinações, iaques a cabras-ciclope colossais, Don’t Starve é um poço de infinitas possibilidades para serem testadas (Klei Entertainment/Reprodução)

O problema é que esse conjunto de tarefas explícitas passaram a ser uma lista de objetivos opressivos a serem riscados, e assim os jogadores deixaram de se sentir motivados a experimentar coisas novas e arriscadas e viviam presos na bolha do que lhes foi ensinado. As seguintes conclusões foram tiradas:

  1. Ao apontar direções óbvias e “segurar a mão” do jogador, oferecendo recompensas como resultado dessas ações arbitrárias, os jogadores deixavam de se interessar no jogo no mesmo instante que as recompensas deixavam de ser oferecidas, mesmo se a ação em si fosse divertida;
  2. As recompensas faziam com que os jogadores deixassem de se importar com o resto do jogo, considerando tudo “uma distração”;
  3. Os jogadores que tentavam otimizar suas ações ao máximo para ganhar logo suas recompensas deixavam de tomar riscos e se tornavam menos criativos, independente das surpresas agradáveis que tais riscos poderiam oferecer.

O estúdio eventualmente chegou à conclusão de criar uma interface que sugerisse a existência de itens e objetivos misteriosos para serem descobertos, tornando as missões implícitas (mas ainda estavam lá, ocultas), orientando e motivando o jogador a explorar, ser criativo e tomar mais riscos sem segurar sua mão.

Postagem no Reddit de usuário criticando o excesso de informações no jogo “Need for Speed – Shift 2: Unleashed” (Reddit/Reprodução)

Mas afinal de contas, o que aconteceu com esses grupos? As crianças que eram recompensadas e os jogadores dos testes iniciais sofreram o que é chamado de “Efeito da Superjustificação” ou “Corrupção da Motivação”. 

Basicamente, ambos substituíram o prazer de desenhar e explorar o jogo por satisfação própria, passando a fazer isso pela expectativa de serem recompensados. 

É essa a diferença entre os tipos de motivação: as Extrínsecas consistem em fazer tarefas por razões que não sejam a execução em si, como ganhar recompensas ou receber uma punição se não as fizer. Já as Intrínsecas são categorizadas por um senso de significado, necessidades ou motivos do próprio indivíduo.

Podemos comparar as extrínsecas com trabalhar em um emprego chato pelo salário e as intrínsecas em assistir uma série para relaxar ou jogar bola com os amigos por diversão, por exemplo. 

Se formos usar analogias de videogames, as recompensas extrínsecas podem ser relacionadas a ganhar experiência e progredir no desbloqueio de uma habilidade ou pintura de arma, ou no desbloqueio de um troféu com requerimentos arbitrários, enquanto as intrínsecas podem ser superar métricas pessoais como melhor pontuação e menor tempo de conclusão de uma fase (seu “Personal Best” naquele jogo).

Um exemplo de recompensa extrínseca é o sistema de “Passe de Batalha” que muitos jogos modernos adotam, como Call of Duty: Black Ops Cold War (Yan Heiji/Reprodução)

Quando uma tarefa intrinsecamente satisfatória passa a ser relacionada a uma recompensa extrínseca, a tarefa se torna cada vez menos atraente e as pessoas se tornam cada vez mais exaustas, menos criativas e até perdendo a motivação por inteiro ao deixar de receber essas recompensas. 

Capítulo 4: Então, de que forma podemos introduzir recompensas na nossa vida?

Por incrível que pareça, implementar recompensas que ajudem na nossa motivação de forma saudável é mais fácil do que parece, com a devida responsabilidade e autocontrole.

Nicole Watterson, mãe do Gumball, entende bem como se aplica recompensas. Episódio “A Geladeira” (Cartoon Network/Reprodução)

Mas primeiro, que tal entendermos como não se deve integrar esses elementos nas nossas vidas? O problema principal surge quando há uma ausência de controle (ou autocontrole) das pessoas, especialmente se voltarmos a falar dos que sofrem de DDA.

Aplicativos como jogos, redes sociais e outras formas de entretenimento oferecem estímulos audiovisuais constantes (especialmente videogames), e pessoas mais vulneráveis, sejam crianças ou adultos, com ou sem DDA, podem se empolgar demais e acabar desenvolvendo vícios pelo prazer do ciclo de ação e reação, o “Loop de Feedback”, que são oferecidos por esses aplicativos.

É por isso que as recompensas que recebemos desses meios não podem ser irrestritas e irresponsáveis: é necessário haver um feedback instantâneo, mas com precisão

Nos jogos, por exemplo, jogadores precisam enfrentar inimigos ou concluir quebra-cabeças para ser recompensados. O mesmo vale também para quando fazemos aquele esforço extra para arrecadar o máximo de likes em uma publicação na internet.

Mesmo assim, essas barreiras e desafios impostos não são suficientes para impedir o desenvolvimento de um vício ou até do tédio. Às vezes, o vício pode vir até mesmo de uma pessoa excessivamente competitiva, por exemplo! Quem já sofreu com toxicidade nos videogames online sabe como é passar por essa sensação.

Por isso, é crucial que haja um autocontrole: se entreter por 7, 8, até 12 horas sem parar traz riscos à saúde e também degrada gravemente nossos neurorreceptores de hormônios como a oxitocina, já que eles também se viciam e passam a necessitar de quantidades cada vez maiores de entretenimento para se satisfazer.

A supervisão é crucial e vale tanto para crianças quanto adultos, mas no caso da infância é necessária uma regulamentação mais rígida dos pais, já que as crianças (até cerca de 8 anos) não costumam compreender suas próprias necessidades e agir de acordo de forma autônoma. Eu pelo menos não espero ver uma criança de 2 anos ligando o chuveiro e se ensaboando sozinho, não sei vocês.

(Mika Baumeister via Unsplash/Reprodução)

Em contrapartida, caso as recompensas sejam implementadas corretamente, o uso do entretenimento pode ser muito benéfico ao nosso dia a dia, sim! 

Podemos introduzir entretenimento nas nossas vidas com uma de duas finalidades: agentes estimulantes relaxantes. Seguindo o fio dos videogames, vou dar dois exemplos meus:

  • Quando sinto cansaço, sono ou tédio, me dou alguns minutos para jogar DOOM Eternal, um jogo de tiro, ação e precisão extrema, frequentemente considerado “um brutal jogo de xadrez 4D no Inferno” pelos próprios desenvolvedores. Também escuto minha playlist de rock que batizei de “Combat Songs”.
  • Em contrapartida, quando eu preciso desacelerar os pensamentos, costumo jogar algo leve como Death Stranding, um jogo sobre conexões humanas, caminhada e entregas de correios, enquanto ouço a relaxante playlist de Indie Islandês do próprio jogo. Isso sem contar nas emocionantes atuações de Norman Reedus e Mads Mikkelsen!

É claro que esses exemplos se aplicam a tudo: você pode usar filmes de ação, como John Wick e Drive, ou séries e filmes mais calmos ou de comédia, como The Office e A Princesa Prometida (1987), além de livros, esportes e quaisquer outros hobbies que te interessem. Fica a seu critério compreender quais sensações cada conteúdo evoca dentro de você.

Por fim, eles podem ser implementados de duas formas no seu dia a dia:

  • Baseando na sua própria rotina: “nos dias X e Y eu terei das W às Z horas para descansar e fazer o que quiser”.
  • De forma condicional ou como recompensa: “a cada X minutos de estudo, ganho Y minutos de tempo livre para me divertir”. Se você optar por esse estilo, recomendo ler o texto até o fim, pois ainda vamos falar do Efeito de Geração, o Efeito do Estudo Intercalado e Efeito do Espaçamento. 

Com essas motivações, você pode passar a ter ainda mais dedicação nas tarefas estressantes e pode desfrutar de atividades prazerosas para “reiniciar” e relaxar seu cérebro!

É claro, tudo depende de fatores pessoais como suas próprias preferências e até onde vai seu autocontrole. Não adianta nada “jogar antes de estudar para relaxar” e ficar no computador por 15 horas seguidas, né?

Capítulo Bônus: Como posso estudar tão bem quanto aprendo videogames?

Lembra o que o estudo do Capítulo 3 disse sobre as crianças que foram surpreendidas com uma recompensa? Essa é a minha “recompensa surpresa” pra você, o leitor que chegou até o final: um capítulo bônus sobre como estudar melhor!

Esse capítulo tem inspiração nos vídeos “Por que você é ruim em provas… mas ótimo em videogames” e “Como estudar usando o Efeito de Geração” do canal de game design e psicologia Daryl Talks Games.

Resumidamente, o Efeito de Geração consiste em nos explicar como o cérebro humano é capaz de lembrar coisas com mais facilidade caso ele produza uma informação, ao invés de simplesmente observá-la.

Esse fenômeno observado pela psicologia cognitiva é estudado através de experimentos com jogos de memorização usando palavras-chave, seus antônimos e sinônimos, além de problemas imagéticos e aritméticos.

Usando videogames para explicar: você não decora a enorme tabela de Tipos de Pokémon só de bater o olho. São mais de 300 combinações diferentes! Mas o que você faz é colocar esse conhecimento teórico em prática nas batalhas, além de gerar seu próprio significado com esses dados.

Assim como na vida real, você sabe que Pokémons de fogo são fracos contra água porque você assimila que jogar um balde de água em uma fogueira a faz apagar; por outro lado, se você colocar fogo na grama, vai criar uma queimada colossal (e o mundo já teve isso o suficiente nesse ano). Isso pode ir até pontos mais longes: se você hipnotizar um lutador, ele ficará inutilizado, e se mandar ele socar um bloco de metal, não vai acontecer muita coisa.

Tabela de tipos de Pokémon (PokémonDB/Reprodução)

O exemplo foi meio bobo, mas é dessa mesma maneira que jogadores de League of Legends decoram mais de 156 campeões, cada um com ao menos 4 habilidades diferentes (são mais de 600 ao todo). Você analisa os dados e coloca eles em prática em tantas situações diferentes e aleatórias que a memorização se torna fácil!

Efeito de Espaçamento também é crucial na hora dos estudos: esse fenômeno afirma que a nossa aprendizagem é mais eficaz se estiver espaçada ao longo do tempo. Ou seja, ao invés de estudar múltiplos conteúdos densos imediatamente, é bem mais importante e eficaz que haja uma distribuição do conteúdo em várias sessões menores.

Colocando em linguagem humana: “estudar” todo o conteúdo da prova na correria alguns minutos antes de chegar na escola não é tão eficaz quanto estudar de pouco em pouco ao longo das semanas. Vale ressaltar que esse efeito se aplica apenas à memória de longo prazo.

Isso seria equivalente ao Efeito do Estudo Intercalado, uma técnica que consiste em fazer pessoas estudarem diversos conteúdos, como matérias ou fórmulas matemáticas diferentes, misturados ao mesmo tempo.

O que se analisa aqui são dois resultados positivos: primeiro, por conta da dinamicidade do conteúdo variado, os estudantes se entediam com menos frequência e prestam mais atenção ao trabalho que estão fazendo. 

Segundo, há uma compreensão muito maior do material como um todo: os estudantes não estão apenas decorando uma fórmula específica e reaplicando ela em toda situação possível de forma desesperada, mas começam a compreender com profundidade quais fórmulas devem ser utilizadas e em quais situações específicas elas se aplicam. Como diria o poeta William Cowper: “variedade é o tempero da vida”, e isso também se aplica aos estudos.