Cruelty Squad — LIFE^DEATH | Análise

Cruelty Squad — LIFE^DEATH (Análise)

Eu tenho uma história grande com Cruelty Squad. Tão grande e tão lotada de contradições que eu vou pular 99% dela e começar dizendo que ele representa uma das primeiras vezes que eu tomei uma chance com um jogo que eu não sabia absolutamente nada sobre. Eu achei ele na Steam menos de um mês depois do seu lançamento em Early Access, quando ainda tinha algumas dezenas de reviews, no máximo. Pessoalmente não curto olhar reviews da Steam, então fui 100% pelas imagens marcantes na página e o trailer extremamente apropriado. Os visuais deram a impressão de que talvez seria um shitpost de baixa qualidade, mas nada com uma direção de arte tão forte poderia ser completamente inútil. Então meus R$ 37,99 se foram em troca de eu tentar entender o que exatamente Cruelty Squad queria dizer. Um ano e meio e mais de 50 horas de jogo depois, eu ainda não encontrei uma resposta clara pra isso, mas tenho sentimentos que podem apontar algumas possibilidades…

Cruelty Squad — LIFE^DEATH (Análise)

Cruelty Squad é um projeto solo do artista finlandês Ville Kallio. Ele mesmo descreve o jogo como um “simulador imersivo de power fantasy”, o que provavelmente é um dos jeitos mais fáceis de o descrever sem vender o peixe barato demais. Seguindo o eternamente mal intitulado gênero de immersive sim, Cruelty Squad quebra até as regras de suas duas maiores inspirações em questão de gameplay, Deus Ex e Rainbow Six 3.

Muitas de suas mortes em cada uma das fases complexas e inicialmente indecifráveis do jogo serão causadas por mecânicas únicas ao título que não são explicadas tradicionalmente. Você é tacado no mundo ultracapitalista moldado por carne humana e animal sem nenhum aviso ou guia, mesmo que o tutorial já te dê uma boa ideia dos controles — relativamente não convencionais — que me lembram de épocas passadas onde cada jogo de PC possuía um esquema de controles completamente diferente. Se quiser testar isso, abra Thief, Deus Ex, Rainbow Six 3, o primeiro Splinter Cell e Hitman: Agent 47 um atrás do outro e veja o quanto você vai ter que caçar onde estão os botões para fazer as mesmas ações básicas de cada um.

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Em todos estes exemplos, os controles fazem completo sentido. Assim que você se acostumar com controlar sua velocidade de movimento na rodinha do mouse em Splinter Cell, essa escolha antes esquisita vai se tornar essencial ao seu ritmo de jogo. Eu digo o mesmo de Cruelty Squad. Ter que recarregar sua arma ao puxar o mouse com força para baixo enquanto segura o botão direito encaixa completamente com o tiroteio solto e desesperado que você realizará em suas primeiras horas de jogo. Quanto mais você se acostuma, mais internalizará o botão de agachar no X, a mira no Shift, e por aí vai.

Você deve ter percebido que eu mal comecei a falar e já fiz um monte de comparações entre Cruelty Squad e outros immersive sims. Isso é um problema grande nas discussões sobre o gênero que eu gostaria de ter desviado ao escrever este texto, mas resolvi o manter em aberto por dois motivos: recomendar alguns joguinhos e demonstrar que existem precedentes para várias das escolhas aparentemente bizarras de Cruelty Squad. Eu sei muito bem que as discussões sobre esse subgênero tão estranhamente definido costumam usar menos termos concretos do que o necessário e por vezes acabam soando meio pretensiosas, mas acredito que em todos os meus exemplos estou fazendo comparações relativamente inofensivas e sem julgamentos de qualidade. Dito isso, eu provavelmente vou acabar com toda a boa fé que construí neste parágrafo com o próximo. Desculpa, foi divertido demais montar a lista :( se prepare:

Já que eu vou entrar mais na questão de jogos soltos ou rígidos depois, aqui está um gráfico 100% espiritual e aprovado pelas maiores empresas do mundo (LIFE) sobre o quão soltos ou rígidos são alguns immersive sims. Lembre-se, isso não torna um jogo melhor ou pior. Não é uma medida qualitativa (menos no caso de Bioshock, eu realmente não curto ele).

Cruelty Squad — LIFE^DEATH (Análise) GRAU DE RIGIDEZ E SOLTURA®
TESTADO E APROVADO POR TODAS AS EMPRESAS. NÃO É QUESTÃO DE OPINIÃO, APENAS PROFUNDO ESTUDO MECÂNICO DA SEMIÓTICA QUE CADA JOGO EXUBERA. UM GRAU BASEADO EM ESPIRITUALIDADE.

Eu diria que uma característica importante de um immersive sim é criar uma maneira única de se relacionar com seu mundo e, por sua vez, conectar seu personagem. Sua gama de ações deve ser completa (mas não necessariamente complexa) para demonstrar as habilidades únicas de seu protagonista. No caso de Cruelty Squad, nosso amigo amavelmente apelidado de “Protagonista” pela comunidade é muito bom em matar pessoas. Quase todas suas ações podem levar à morte de algum ser vivo, a qualquer momento, dependendo de como você escolhe usá-las. Curiosamente, em quase todas de minhas mais de 15 replays completas, eu só matei NPCs não-essenciais nas primeiras duas ou três. Desde então, eles são interpretados por mim quase que como elementos secundários da fase… quase da mesma maneira que a mobília de uma sala. Eles “estão lá”. Se eu quiser engajar com o diálogo meio-engraçado-meio-deprimente deles, eu converso com um antes de seguir para meu alvo marcado com uma mira vermelha brilhante a todo momento. Eles formam uma parte indispensável da alma do jogo, pois cada um representa um aspecto do mundo que pode ser facilmente ignorado ao olhar apenas o diálogo principal do seu entregador de missões (amavelmente apelidado de Handler pelo próprio jogo) ou as conversas estendidas que você pode ter com os alvos.

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O engraçado é que generalizar os alvos de Cruelty Squad é uma tarefa meio impossível. Eles podem ser líderes corporativos quase sem lembranças do que é ser humano ou… pessoas normais que mexeram com o ricaço errado. Quando você arranja uma maneira de entrar na dificuldade “Hope Eradicated”, você ganha novos alvos para caçar em cada uma das fases. Quase todos eles são só pessoas aleatórias, mesmo que estranhas. Nesse ponto, você não está mais respondendo ao Handler ou à Arquidemônia Corporativa Elsa Holmes (tradução livre), mas sim à chamada primal de sua própria sede de sangue. Claro, o jogo não deixa nada disso explícito, mas não é difícil de notar até ao ler os briefings do Handler nas missões próximas ao seu fim. Isso fica ainda mais poderoso com o modificador Chaos que você libera ao completar a missão final, Trauma Loop, mas eu não quero entrar em spoilers então vou ignorar esse ponto.

Huh… o que mais… na real tem coisa demais pra eu organizar. Gorbino? Gorbino’s Quest? Alguém?

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Intestino. Grappling Hook de intestino. Fungo no pé de pulo duplo. Fungo no pé de pulo triplo. Videogames. Objetivos, upgrades e dinheiro. Mercado de ações, mercado negro de órgãos e feira de peixes.

É muita coisa, e explicar cada uma dessas mecânicas 1- É extremamente supérfluo e 2- Não é tão interessante quanto olhar o porquê delas estarem lá. Os implantes te separam completamente do resto dos humanos do jogo. Não existe nenhum que consegue englobar nem parte do que o Protagonista consegue fazer ao modificar seu corpo com os implantes extremamente invasivos que ele pode enfiar em si mesmo em nome de seus assassinatos. Transhumanismo com partes humanas ao invés de tecnologia concreta. A vida da maioria das pessoas não vale nada, e isso vale mais ainda pro Freak Shit (outro apelido bonito pro Protagonista). Quando ele morre, a Cruelty Squad te cobra $500 pra usar o regenerador pra lhe reconstruírem. Ao começar o jogo, você está iluminado pela Divine Light, que é o estado de vida padrão que presumo que nós estamos na vida real. Pessoas que ainda não experienciaram a morte. Assim que você morre pela primeira vez no Cruelty Squad, sua conexão à ela é cortada, e você vira um Autômata de Carne por ter sido reconstruído pelo regenerador. Isso duplica como o sistema de dificuldade e altera a borda da sua tela. Eu juro que demorei umas oito horas pra descobrir isso na primeira vez que joguei, mas é genial. Existem mais níveis de dificuldade e outros modificadores, então descobrir como eles funcionam é um dos maiores mistérios presentes na narrativa.

Agora, se você não jogou Cruelty Squad ainda, não é uma boa ideia passar o jogo inteiro sem pesquisar nada sobre. Após terminar a última fase não-secreta, Archon Grid, faz bem pesquisar como encontrar as diversas fases escondidas para adquirir os outros finais. E não, não tem nenhuma vergonha em terminar todas as fases na dificuldade Power in Misery, onde você é só um blob de carne que se regenera sem gastar dinheiro. Pesque bastante (ou inteligentemente), dê sorte no investimento e explore muito que você conseguirá grana o suficiente para conseguir os implantes necessários para a primeira vez que terminar o jogo.

Inclusive, você vai perceber que ser um hitman não é um trabalho tão bem pago no mundo de Cruelty Squad. A distopia capitalista é tão… distópica, que as próprias empresas esperam que você invista seu salário para talvez ganhar grana com conglomerados enormes e startups duvidosas ao invés de, sabe, te pagarem com dinheiro diretamente para te garantir uma vida decente. O mais engraçado é que, salvo um aumento enorme do valor das ações de uma empresa em um momento específico do jogo, o mercado de ações é extremamente inacessível e não muito eficiente se você já não tiver muuuita grana lá dentro. Uau, igualzinho na vida real!!11 Você arrisca sua vida (e até perde ela diversas vezes) pra ganhar uma merreca e ainda tem que reinvestir tudo em coisas relacionadas ao trabalho… ou o Freak Shit só é workaholic demais… Mesmo assim, dá pra perceber que ele comprou uns móveis decentes entre a cutscene inicial do jogo e a missão Apartment Atrocity, onde você pode explorar o apartamento dele muito mais mobiliado do que os solitários edredom-e-TV que ele tinha antes.

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O seu save é persistente (até você deletá-lo) e existem até NPCs com permadeath, mas as mudanças quando você faz algo importante são tão incrementais que as vezes é difícil dizer como elas eram antes de sequer mudarem. Até hoje eu não sei o que exatamente faz a água dentro dos mapas ficar vermelha, por exemplo. Não que eu precise saber, pois é bom que ainda existam mistérios que eu não entendo mesmo depois de dezenas de horas de jogo e um monte de replays. Essa é uma das belezas de Cruelty Squad.

Isso combina perfeitamente com a vibe de desespero que ele busca trazer, e é também consistente com a gameplay. Usualmente, em jogos de FPS feitos para PC e immersive sims, você pode usar quicksaves dentro das fases para partes mais complicadas ou até para voltar a jogar mais tarde exatamente no ponto onde parou. Aqui, as coisas são diferentes. Cada fase é uma luta pela sua sobrevivência que vai exigir sua atenção total para que não seja surpreendido pelos inimigos que podem te matar em instantes. Depois que você conhece os mapas e usa seu loadout ideal de implantes, as coisas vão ficar bem mais de boa, mas o combate sempre acha uma maneira de se dissolver em puro caos se você não usar o stealth bizarro de maneira perfeita e combinar isso com uma boa mira para headshots. Mesmo assim, algumas vezes você vai ter que lidar com o caos sem nada pra te ajudar além de seus reflexos ou movimentação.

Os tipos de desafios que Cruelty Squad coloca para você são bizarros, inesperados e, por vezes, crípticos. Perfeitos para um jogo como esse. Até o amedrontador veneno que arranca mais da metade da sua vida lentamente é uma punição não muito balanceada no sentido tradicional, mas que serve como uma maneira de te amedrontar toda hora que ficar de cara com os Fleshrats ou água infectada. Os Fleshrats são especificamente feitos para serem minúsculos e difíceis de acertar já que ficam saltitando por aí. Alguns inimigos, como os Golems, possuem uma armadura que só podem ser quebrada com armas específicas, enquanto alguns outros são meramente imortais ou fortes demais para justificarem seu esforço em matá-los. Um boss específico até requer uma combinação extremamente específica de mecânicas e armas secretas pra ser derrotado. É no desequilíbrio extremo que Cruelty Squad brilha.

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Em mapas como Darkworld ou Paradise (e em inúmeros outros locais menores de outros mapas), existem áreas completamente abarrotadas de inimigos fora do caminho que você normalmente precisa tomar para alcançar seus alvos, mas que não escondem nenhum item ou segredo. São apenas áreas populadas com absolutamente nenhum propósito prático. Isso é lindo. Uma das coisas que fizeram eu me apaixonar por Thief foi exatamente isso. Áreas que fazem sentido de existir exclusivamente pois são parte do mundo em que habitam. Elas não servem uma lógica de design predefinida ou alimentam o loop infinito de feedback que um jogador espera ao interagir com um videogame, mas sim cria catarse na noção que você está ali porque quer. Você veio explorar essa área em busca do que? Inimigos? Itens? Segredos? Talvez até algum objetivo principal que no fim nem estava lá? A única pessoa responsável por responder isso é você.

Cruelty Squad é um jogo muito solto. Digo isso no sentido de como ele reage às suas ações e como você pode reagir de volta. Por mais que eu os ame de coração, os Hitmans atuais são jogos bem rígidos. Suas maneiras de interagir com os alvos são limitadas à botões contextuais e a sua arma de escolha. Para estes jogos isso faz sentido, ainda mais sabendo que eles são feitos com consoles em mente. Agora, em outros como Cruelty Squad, o mundo é o sangue necessário para seu banho.

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Isso também vale para o Thief (mas não a parte do sangue o_0), e é isso que me atrai tanto à esta filosofia de design. Você tem escolhas infinitas, mas o mundo funciona de maneira tão dinâmica que elas podem e vão sair de seu controle eventualmente. Suas ações são quase todas mapeadas uma a cada botão, e reagirão de acordo sem nenhuma escolha contextual. Se este ponto te soa familiar, sim, eu tô falando sobre isso no mesmo sentido que no vídeo do Matthewmatosis sobre o assunto. Ele é um Youtuber que aborda jogos de uma maneira extremamente interessante e mecanicamente abstrata. Como ele mesmo diz no vídeo, um jogo ser menos ou mais contextual não é necessariamente um ponto positivo ou negativo, apenas se encaixa melhor em certas visões artísticas como Cruelty Squad.

Logo após que você acostuma com os controles básicos, ele já não parece um jogo tão indecifrável assim. Ele só tem suas próprias regras e peculiaridades para serem consideradas. Se você for visto atirando em alguém, os guardas irão te procurar. Agora, se você fez isso de maneira escondida e sem propagar som, eles provavelmente não vão ligar que o colega deles morreu. A palavra-chave aqui é provavelmente. Como eu tinha dito, imprevistos acontecem, e até aí mesmo um veterano que já passou por todas essas fases múltiplas vezes vai precisar depender do sistema de reload de arma caótico e de seus próprios reflexos, também influenciados pela sua escolha de armas e equipamentos.

Entre os dois espaços que você possui para carregar armas (uma escolha que veio mais de sua inspiração em Rainbow Six 3 do que outros immersive sims que te deixam muitos espaços no inventário para armas), você pode carregar basicamente o que quiser, desde armas não-letais inefetivas devido à falta de investimento de empresas na tecnologia até uma pistola que come cérebros que nem em Turok. Até o sistema de ranks pode afetar sua escolha, pois toda fase tem 5 sistemas de rank dependendo da sua dificuldade, arma e até modificador. O que você ganha por tirar “S” em tudo? Nada. É bem divertido, ao menos. Mesmo assim, o fato do jogo ter um rank separado pra se você começar a fase com as armas padrões infere que é um estilo de jogo por si só. Infelizmente não existe um por jogar sem implantes, mas aí seria pedir demais contando a quantia enorme de divisões já presentes. Agora, eu preciso admitir que usualmente me divirto muito mais com as armas padrões do que qualquer outra coisa. O pior é que elas só consistem de uma pistola silenciada (hands down a melhor arma do jogo, mata qualquer inimigo humanoide sem armadura em um headshot), uma SMG não muito boa, um tranquilizador de animais e um cassetete que infelizmente não é nem de perto tão útil quanto o blackjack do Thief.

Acredito que minha obsessão por sempre rejogar Cruelty Squad no Divine Light e com as armas padrões vem simplesmente da satisfação de poder terminar as missões com ferramentas tão limitadas. Eu sei que poderia estar tacando um laser em todo mundo ou transformando pessoas em labirintos de carne com as outras armas, mas eu ainda posso pegar elas durante as fases de qualquer jeito. É meio que a mesma filosofia do primeiro DOOM (1993), sabe? De começar toda a fase com o loadout padrão, como um desafio autoimposto, mas ainda poder pegar as armas oferecidas dentro da própria fase.

Eu juro que não fazia a menor ideia que esse texto ia andar em voltas até formar um círculo inteiro e falarmos sobre DOOM. Uau. Bom, eu ainda acho que você deve fazer bom uso de seu arsenal se tiver a fim, e jogar sem querer fazer tanta coisa complicada antes de entender o jogo. Há um tempo atrás, eu fiz uma run inteira só com o chute. Liguei o implante Alien Leg Wetware (que deixa seus chutes super fortes), peguei o upgrade permanente DEATH que libera o wallkick (dentre outras coisas), e terminei todas as fases assim. Foi divertido, um pouco frustrante em alguns momentos, mas demonstrou a imensa elasticidade de estilos de jogo oferecidas pelos seus sistemas.


Eu realmente não acredito que Cruelty Squad queira fazer você se sentir mal ou vazio ao matar civis ou coletar órgãos de pessoas inocentes e outras coisas do tipo. Isso aqui não é Hotline Miami 2 ou No More Heroes, por mais que eu adore a maneira que estes dois jogos lidam com este ponto filosófico. Cruelty Squad apenas vive dessensibilizado pelo seu próprio absurdismo na pura repetição mecânica.

Eu já tentei escrever sobre esse jogo múltiplas vezes, mas tive dificuldade de discernir o que realmente acho interessante discutir, o que é choque, e parte disso vem da mudança enorme da maneira com que eu interajo com o jogo. É difícil ter uma reação forte ao NPC de extrema direita com um canal do Youtube que mantém uma mulher em cativeiro na missão Apartment Atrocity quando eu já matei ele umas 40x, sabe? Existem muitas coisas brilhantes dentro do jogo que a esse ponto são memórias um pouco distantes para mim, por mais que eu o ame tanto quanto o amava inicialmente.

O que posso dizer é que o capitalismo e corporativismo como uma manifestação espiritual e conectada à natureza no universo do jogo faz bastante sentido se você interpretar como uma crítica à maneira que já que vivemos neste sistema, é difícil se desconectarmos dele ao discutir alternativas, e que a elite usa de justificativas religiosas para reforçar o próprio poder em várias escalas. Afinal, o fim real prova isso como algo falso pois, após passar por todos os estágios espirituais possíveis, o Protagonista acaba transcendendo até sua posição como capitalista que atinge de força bruta em outro dos finais. É uma bagunça, mas espero que tenha feito algum sentido.

A parte boa de tudo isso é que eu ainda me divirto ao rejogar Cruelty Squad. Eu sempre tomo meu tempo pra pescar bastante (meu mapa favorito pra pescar é House antes do mar ficar cor-de-sangue), fazer algumas runs estúpidas com builds impráticas só por diversão, ouvir os diálogos da maioria dos NPCs e bem, as vezes só parar pra admirar a beleza não convencional dos cenários. Sério, dá uma voltinha no plaza ao céu aberto de Mall Madness, ou sinta a brisa marítima ao ser cercado de malucos ricaços em Seaside Shock, e admire o quão estático e cru é o arranha-céu de Office enquanto ouve a track Pyrexia. Cruelty Squad é um projeto feito por uma pessoa só, e toma todas as vantagens possíveis que vem com isso. Como diversos outros, ele é o jogo perfeito para alguém, mas acontece que nesse caso esse alguém sou eu.

Cruelty Squad — LIFE^DEATH (Análise)