Dynasty Warriors: Origins — romances inconclusivos | Análise

Dynasty Warriors Origins análise

São muitas noites mal dormidas em minha vida onde acabo me afundando na sarjeta das cogitações da ideia de minha existência ser de algum modo documentada e arquivada em alguma espécie de manuscrito ou coisa do gênero. Se tudo que eu produzi e produzo conseguirá sobreviver de alguma forma sendo repassada nas gerações posteriores da humanidade.

Talvez isso seja meio idiota por que, na maior parte do meu tempo como jornalista de jogos, eu estou escrevendo simbolismos e analogias para videogames que são comercializados a preços bem exorbitantes que eu sequer teria condições de consumar de uma forma convencional.

Nas noites posteriores que eu joguei Dynasty Warriors: Origins eu comecei a imaginar como se sentem os generais e regentes de uma guerra de mais de dois milênios; aquele que travaram guerras lendárias no território que posteriormente conhecemos como a China, e que hoje em dia são popularizados no resto do mundo em uma franquia de games que os transformou em homens gostosos e maquiados, que tem um afeto e tensão imensurável por seus irmãos de guerra… okay, talvez a última parte seja realmente um fato histórico!

Dynasty Warriors: Origins é um jogo de ação, do talvez subgênero musou, lançado no dia 17 de janeiro de 2025 (ou três dias mais cedo para quem pagou mais caro), desenvolvido pela Omega Force e publicado pela Koei Tecmo para PlayStation 5, Xbox Series e PC.

Dynasty Warriors: Origins é também tecnicamente o quarto Reboot Numérico de Dynasty Warriors se considerarmos Dynasty Warriors 1 (O Fighter 3D), Dynasty Warriors 2 de PlayStation 2 que na realidade se chama Shin Sangokumusō (Shin Dynasty Warriors) e claro, Dynasty Warriors de PlayStation Portable que adivinha… também se chama Shin Sangokumusō! (Aliás, se aqui no ocidente o último Dynasty Warriors numérico se chamou Dynasty Warriors 9… lá foi Shin Sangokumusō… 8! Bem, agora resetaram de vez! Eu acho?)

Deixando claro, minha experiência com musou até a minha cobertura de Origins foi bem limitada a jogos como Hyrule Warriors, Drakengard, One Piece Pirate Warriors e Naruto Ultimate Ninja Impact. Até eu colocar as mãos nessa obra, eu não tinha experiência alguma com Dynasty Warriors ou sequer qualquer conto envolvendo o Romance dos Três Reinos e fiz questão de não pesquisar nenhum spoiler envolvendo uma história real que ocorreu a quase dois milênios atrás! Depois de finalizá-lo eu corri atrás de conhecer os três primeiros jogos numerados!

Dynasty Warriors: Origins começa com o benefício da modernidade; ao menos da conceitualização de como se encarar obras ficcionais em tempos contemporâneos. O mito do herói desconhecido (no caso você) em meio a pobreza e miséria do povo, as quais são encaradas de forma sóbria e sob uma paleta obscura que foge de tendências da teatralidade que a franquia aderiu como estética. Também é necessário destacar que Dynasty Warriors: Origins tem um mapinha overworld muito bonito…

Acredito que o primeiro e majoritário asterisco que eu deva destacar é que Dynasty Warriors, para além de suas hipérboles do poder, se baseia em uma obra de ficção chamada de Romance dos Três Reinos de Luo Guanzhong, escrita no século XIV que é baseado, em acontecimentos e figuras políticas militares reais; já deve ser claro que ele caracteriza os mais perversos senhores feudais de mais de um milênio atrás como figuras míticas e respeitosas.

Não é esse o conto que me interessa tratar no dia de hoje, não sou eu a pessoa que pretende deturpar as batidas com um “hahaha, na verdade, eles eram todos criminosos de guerra…” isso você já deveria saber!  É importante lembrar que todos eles eram potencialmente políticos assassinos justamente para tentar entender como Origins busca contornar algumas destas noções para humanizar e transformar cada uma dessas figuras em homens lindos que carregam deveres e ideologias e que (principalmente) são muito apaixonados por você!

Ao tentar contar um novo começo, quase como se atribuísse a necessidade de encontrar um cânone de como contar a histórias que cercam os Três Reinos, jogamos com um herói desconhecido e sem nome que tem como a principal missão guiar a paz no mundo! Em nome deste ideal é necessário se aliar a guerreiros aspirantes que posteriormente se tornarão as cabeças por trás das uniões e desafetos entre os reinos de Shu, Wu e Wei. Por razão disto o jogo se permite se enrolar entre as dinâmicas de uma interação tremendamente pessoal entre as figurinhas carimbadas que cercam os primeiros 40 capítulos da obra original.

Todo mundo é compreensível, carinhoso e afetuoso com você. Todos os homens e mulheres te amam… muito. Quem sabe eles realmente queiram florescer um romance entre esses três reinos contigo? A atividade de adentrar em cidades e fortalezas para ler sua caixa postal lotada de cartas de respeito, afeto ou mesmo rancor cativa nesse conto.

Pode parecer piegas querer citar e brincar na forma que Dynasty Warriors: Origins lida com as relações interpessoais, mas é inegável como o texto do jogo está constantemente te colocando em circunstâncias em que essas figuras míticas e quase divinas da história da China desejam muito ter um pedacinho do seu amor.

Não uma coisa que se limite apenas a ideia do amor carnal, mas sobre a noção de compartilhar um pedacinho da sua alma e essência com aquela pessoa; aquela necessidade de passar mais algumas horas com a pessoa para conhecê-la cada vez mais… existe um carinho genuíno de cada um desses personagens pelo protagonista cabeludinho e pálido como um floco de neve.

“Esta noite, eu desejo gravar as características do seu rosto e o som de sua voz em minha memória.” Palavras proferidas por Guan Yu, o lendário deus da guerra e da fortuna.

Isso assusta na razão de que são geralmente os primeiros diálogos no esquema de social link do jogo; com o tempo essa lua de mel acaba e os personagens que são simpáticos a você vão começar a compartilhar as dores sobre os momentos e perdas que estão vivendo, e claro, com uma pitada de dependência emocional a você. É hora de fazer o tirano Cao Cao e o Feroz Lü Bu sentirem um quedinha por você!

Para essa etapa tão importante é necessário jogar o jogo! Também é compreender a etapa que o Musou se aplica em Dynasty Warriors: Origins… minha simplificação negligente de todo um contexto é de que o musou de Dynasty Warriors: Origins é um RTS hack-and-slash onde se controla uma unidade que é 99x mais forte do que todas as outras. Na realidade você é meio que o único agente de mudança no campo de batalha; outros generais vão conseguir com muito esforço derrotar seus oponentes, mas é o seu papel transitar entre o mapa no seu corcel encantado, oferecendo suporte em nome da conquista e anexação territorial.

Nota: Esta explicação se trata da conceitualização ideal apenas de Dynasty Warriors: Origins e não se aplica a cada jogo do “subgênero” musou… jogue Dynasty Warriors 2 / Shin Sangokumusō de Playstation 2 e ele será como um feixe de luz de deus sobre sua percepção de que musou na grande realidade é um simulador de formigueiro… mas isso é assunto pra outro dia!

Em tal conceitualização, Dynasty Warriors: Origins carrega um pico de fantasia sobre a ideia de ser esse agente da mudança. Eu realmente não consigo deixar de me empolgar liderando essas incursões com meus compatriotas enquanto enfrentamos pessoas com os ideais tão concretos quanto aqueles que eu acredito.

Dentro dessas esquematizações, o parry se torna essencial para atiçar sua mente em meio à repetição de nuances na jogabilidade, necessárias para conquistar os territórios inimigos lotados de milhares de formiguinhas; é tremendamente satisfatório implodi-los enquanto sua taxa de quadros vai para uns 25% do que jaz… e quando você está jogando esse jogo no Steam Deck, 25% dos quadros são muito poucos quadros na tela.

Longe de mim fazer acusações que carecem de examinações minuciosas e que se baseiam em pequenos achismos… mas eu me preocupo sobre o quanto de carinho meu deste jogo vem menos por razão de seu musou, e talvez mais por razão das sensibilidades e novas dinâmicas que distanciam ele de determinados tradicionalismos, mas isso é uma história para quando eu finalizar todos os Warriors e variáveis da história de nossa humanidade.

É claro como o raiar do Sol que Dynasty Warriors: Origins é um videogame bem divertido de se jogar em suas 40 horas de uma primeira jogatina, e acredite em mim, ainda tem muita coisa para se fazer além de jogar o jogo e terminar ele… assim adentramos num reino obscuro onde se perpetua uma noção mercadológica do custo-benefício que muitos jogadores enxergam nas interações contemporâneas de tudo que cerca o musou.

Se no começo dos anos 2000 era difícil colocar valor no conteúdo destes jogos de no máximo cinco horas de duração, que se tratavam de enfrentar os mesmos inimigos e oponentes em campanhas que no máximo trocavam a figurinha que controlávamos, foi na criação de desafios quase que infinitos que se tornaria possível agregar valor precificado a um videogame. 

Eu conheço pessoas que compraram jogos como One Piece: Pirate Warriors e Hyrule Warriors justamente por terem conteúdo de centenas de horas com suas propriedades intelectuais favoritas… ora bolas, eu me sujeitaria a isso caso a Omega Force brincasse com alguma franquia que mora em meu coração… eles já fizeram isso mais vezes do que eu consigo contar com os dedos da mão e talvez do pé.

Dynasty Warriors: Origins aparenta carregar um benefício mercantil; completar todas as campanhas certamente vai te levar mais de 60 horas, enquanto desafios extras rumo a uma platina beiram as 100 horas… que tal salvar a vida daquele personagem que morreu para uma maldita pedra gigante igual um personagem de Looney Tunes na obra original? Você consegue fazer isso em nome de um final verdadeiro, que não tem nada de verdadeiro…

Apesar de compreender Liu Bei como o verdadeiro e cânone herói desta jornada, eu decidi seguir minha jogatina com a dinastia de Wu. O sentimento de uma família leal sob o mando de um líder confiante que foi Sun Jian me deixou curioso de como o Origins lidaria com uma família que não entra tanto no maniqueísmo dos bonzinhos (Liu Bei) e malvadões (Cao Cao).

O que recebi na minha jornada foi uma compilação das maiores desgraças que os Tigres da família Sun poderiam passar; um compilado de perdas e derrotas dignas de uma tragédia grega, eu não me arrependo dessa escolha forma alguma! A Lendária Batalha dos Penhascos Vermelhos se ressignifica perante essas decorrências como o caminho final desta trilha.

Eu não posso negar meu anseio em conhecer melhor ainda algumas figuras como Cao Cao, Liu Bei e de como vão retratar algumas perversões e traições que cercam uma obra que cativa tanto a humanidade. Eu não consigo fugir de idealizações de como a Omega Force vai encarar essa saga como uma duologia que se encerra no 2/3 do manuscrito original ou se vão encarar com luxo e extravagância a ideia de adaptar tudo que Luo Guanzhong fez questão de escrever que reverbera na história da humanidade em expressões artísticas tão densas e complexas como videogames trabalhados num sistema econômico que os reduz ao produto.

Incorporar a franquia Dynasty Warriors e respeitá-la como essa hiper-conceitualização de um videogame que representa coisas que estão sobrepujando a vida como compreendemos, afinal nada do que viveu o século II e III pode andar sobre o mundo nesse exato momento como entendemos o que é ser humano, é algo que nem toda “propriedade intelectual” pode contar vantagem. Não da mesma forma que Shin Sangokumusō.

Claro, não desconsiderando que a obra negligencia uma verossimilhança concreta do que realmente foram esses momentos para a história do povo que pisou e dedicou toda sua vida àquele solo, trazendo vida e mantimentos aos seus iguais; mas entendendo a existência da franquia como uma celebração que apenas a arte em um molde tão puro pode corroborar. 

Não podemos definir aqueles que escrevem a nossa história, o que nos resta é torcer para sermos celebrados por nossas próprias ações e conquistas e não por conceitualizações e tramoias de nossos oponentes… principalmente aqueles que algum dia foram nossos companheiros de guerra. Talvez um dia, todo o meu esforço de trazer um legado de ações e atitudes em nome do mundo que vivo me gere bons frutos…

Quem sabe eu me torne um personagem na adição Xtreme Legends de uma franquia chamada Shin Shin Sangokumusō que trata sobre guerreiros que tramaram batalhas lendárias com o papel e caneta na mão… se é que esse tipo de coisa vá se tratado com respeito no Século XLIV.

Agradecemos à Nuuvem pela chave de Dynasty Warriors: Origins, concedida para a plataforma Steam! Você pode adquirir seus jogos através de gift cards diretamente por este link!