Quatro anos depois de uma campanha mais do que bem sucedida no Catarse, Enigma do Medo nos traz sua demo pública definitiva junto à data de lançamento. Nesta preview, vamos destrinchar algumas das primeiras impressões e expectativas que vêm desse projeto tão aguardado do nosso solo nacional.
Enigma do Medo
Enigma do Medo é um jogo de investigação e suspense desenvolvido pela Dumativa Game Studio (responsáveis pela Lenda do Herói e Shieldmaiden) e financiado em uma campanha do Catarse em 2020. Dois anos após o primeiro adiamento da previsão de lançamento, tivemos a demo definitiva para acompanhar essa história exclusiva do Universo de Ordem. Nela vivemos o caso de Mia que, em seguida do desaparecimento repentino de seu pai (Senhor Veríssimo, líder da Ordo Realitas), parte em busca do mesmo junto aos seus companheiros; o hacker Samuel, a ocultista Agatha e seu mais fiel amigo Lupi o cão. Ao chegar nos últimos rastros de Veríssimo, Mia se depara com uma mansão abandonada e cheia de criaturas sobrenaturais. Nisso ela precisa utilizar de várias estratégias para sobreviver, encontrar o pai e solucionar os mistérios que assombram toda essa região do “perímetro”.
Tal como vendido, boa parte do loop de gameplay gira em torno da investigação. Você encontra múltiplas pistas que se mostram como objetos 3D, permitindo que você os analise em sua integridade total e inclusive usando métodos diferentes para apuração (como luz UV por exemplo). Entretanto, como tudo neste mundo não são só flores, Mia precisa lidar com os monstros no caminho usando um limitado arsenal; Sua simples pistola, um pé de cabra qualquer e alguns poucos kits médicos para garantir sua integridade física em meio aos horrores. Além de tudo isso, existe um raio de esperança na missão de Mia: Lupi, que sempre está ao seu lado e faz seu melhor para ajudá-la, passando por lugares apertados demais pra ela e farejando pistas com seu olfato apurado.
Impressões
Falando primeiro sobre como o jogo se apresenta: a Dumativa sempre teve seu forte em trazer uma pixel art esplendorosa e esse jogo não é exceção. Os sprites são lindos e super bem animados, a ambientação mesclando os sprites 2D com cenários 3D e iluminações são bem trabalhadas, e a perspectiva isométrica é simplesmente glamorosa de se perder em. Os retratos de personagem comunicam super bem os estados emocionais e personalidades de cada um deles (apesar de eu pessoalmente não ter gostado tanto do traço escolhido para eles).
O áudio não fica muito para trás também nesse sentido. Para fortalecer a ambientação de suspense, o jogo alterna constantemente entre planos sonoros diegéticos e extradiegéticos com faixas instrumentais leves mas definitivamente presentes. Meu único criticismo vem durante a boss fight da demo, onde as falas do boss são completamente abafadas pelo volume do tema musical da luta, o que eu acho curioso porque em todos os outros diálogos o volume das vozes é equalizado direitinho em comparação aos sons de fundo.
Chegando na gameplay é onde surgem algumas questões mais preocupantes. Apesar do jogo nascer de um RPG de horror e boa parte do seu design beber da filosofia de Survival Horror, sinto que só existem de fato pinceladas disso no seu loop de jogo. Em nenhum momento realmente senti medo para além de que estava em um ambiente propício a isso, e isso acaba se refletindo por causa do seu estilo de jogo. Apesar do arsenal de Mia ser limitado e flertar com a ideia de tomadas de decisão para uma gestão inteligente de recursos, o jogo te entrega uma abundância tão grande desses recursos que a ideia morre na esfera do flerte mesmo. Fora que essa fartura de recursos não vem somente do número de balas e kits médicos achados por aí, mas também mecanicamente, através dos golpes de stealth que permitem você eliminar múltiplos inimigos no mesmo ambiente, cada um com um único ataque sem alertar os outros ao redor ou sofrer qualquer outra consequência. Isso é o suficiente para acabar com qualquer senso de perigo.
Entretanto, mesmo entregando uma performance rasa nesses campos, isso tudo acaba sendo relevável já que Enigma do Medo se vende primariamente como um jogo investigativo (até na campanha do Catarse o aspecto de sobrevivência era citado por último), e ele mais do que excede nisso.
Sério, sair pelo mapa interagindo minuciosamente ao encontrar cada pista, analisando seus modelos 3D super bem trabalhados (podendo neles folhear documentos em tempo real), abrir cada gaveta de uma escrivaninha, examinar cada vasilha dentro de uma geladeira e apreciar as animações de cada uma dessas ações é muito mais que do satisfatório. Fora que os enigmas em si dessa demo se encontram num limiar perfeito entre o complexo o suficiente para não ser chato e acessível o suficiente para não te fazer arrancar os cabelos. Fora que eles sempre sabem te direcionar bem para qual ferramenta utilizar para entender as pistas.
Minha única preocupação vem do enigma principal da demo, que parece tropeçar nele mesmo na hora de ser solucionado, já que mesmo juntando todas as pistas necessárias para solucioná-lo, o que realmente me entregou a resposta foi algo fora dos limites do enigma, e não o concatenar das evidências que reuni durante a demo. Ainda assim, achei um mistério muito gostoso de jogar… isso é, se você conseguir jogar.
E agora chegamos ao enorme elefante na sala, essa demo tem sérios problemas de otimização. No dia do lançamento, simplesmente conseguir jogar era um feito, já que além das telas de carregamento demorarem muito, elas também tinham uma enorme tendência a crashar (e isso levando em conta que eu só tenho 16gb de RAM e um computador com todos os requisitos acima do recomendado pela página da Steam)… mesmo com as opções de desligar fog e ajustar a iluminação para melhorar a performance, o jogo continua consumindo quantidades massivas de processamento. Fora isso também existem alguns problemas na IA do Lupi, que não parece se comportar de maneira consistente. Ele fica muitas vezes preso em objetos espalhados pelo mapa, não sobe escadas ou fica parado em salas atrás sem eu nem perceber. Além de todas essas questões, também houve toda a discussão com o fato da demo estar pesando mais de 20gb, mas isso eu acabei relevando mais como uma confusão honesta da Dumativa, já que esse muito provavelmente é o peso total do jogo (na própria demo tem uma porta secreta que se você acessar você é jogado para uma tela preta vazia como se eles só tivessem cortado todos os acesso ao conteúdo fora dessa sequência inicial do jogo).
No geral eu acredito que essa demo se apresenta como um rascunho muito promissor de um futuro próspero, mas esses problemas de otimização me impedem de vê-la como qualquer coisa além de um rascunho. A equipe está ciente destes problemas e claramente está dando o seu melhor para tentar corrigir essas questões (não é atoa que nós tivemos um patch no dia do lançamento da demo e mais um na quarta-feira), o que me dá muita fé de que algo além de especial está nos aguardando no final de novembro.
Expectativas
Antes de comentar sobre minhas expectativas, acho importante ressaltar como Enigma do Medo é um ponto muito fora da curva na história da Dumativa.
Enigma do Medo é um ponto fora da curva em questão material. Quando comparado com as outras campanhas de financiamento coletivo da Dumativa, nem a campanha do primeiro Lenda do Herói foi proporcionalmente tão bem sucedida, arrecadando somente 206% de sua meta original enquanto Enigma do Medo arrecadou 846%. Além disso ele é, tematicamente falando, um jogo investigativo não-linear vindo de uma empresa que até agora só entregou platformers extremamente lineares. Também existe a questão de como a Dumativa, nos últimos dois projetos, optou em priorizar datas de entrega acima do polimento, deixando para resolver questões as vezes até fundamentais para o jogo com o decorrer do tempo através de patches (como foi o caso principalmente no lançamento da Lenda do Herói). Novamente Ordem se mostrou fora da Curva, invertendo a ordem e atrasando por tempo indefinido seu lançamento.
O que quero dizer com essas questões é que minha principal expectativa para esse jogo é ele representar um ponto de amadurecimento da Dumativa como estúdio. Eles não só estão abrindo mão de certos hábitos do passado como estão mostrando um leque de produções mais variado, afinal de contas, em produção nós temos um jogo investigativo: Enigma do Medo; um RPG fortemente inspirado em Pokemon, Bágdex; e um platformer com elementos de ritmo até onde entendi pelo trailer da Lenda do Herói 2. Se eles conseguirem entregar tudo que foi prometido, isso vai mostrar uma guinada na história da Dumativa que vai fazer muito bem pra eles como estúdio.
Entretanto, ainda é um pouco difícil depositar todas essas fés ou qualquer tipo de expectativas reais quando o que temos nessa demo não é um vertical slice. Durante a campanha do Catarse houveram algumas promessas que não foram devidamente refletidas na demo, e isso me causa até um pouco de preocupação com o estado de finalização do jogo, já que uma delas em tese é uma mecânica fundamental. Durante a campanha de financiamento, foi prometido o “Diário da Mia” que seria uma espécie de repositório dos pensamentos atuais da protagonista em relação às pistas, onde você poderia revisitar elas sem precisar ir até o local onde se encontram e até organizar seu raciocínio para se guiar, entretanto, uma mecânica fundamental como essa não estava presente na demo. O que foi dito que estava de fora foi o “Mapa Mental”, que provavelmente tem mesma função mas com uma nomenclatura diferente (talvez puxando até alguma inspiração de Lorelei and the Laser Eyes ou algo nessas linhas).
Fora a ausência dessa mecânica, também não tivemos nada falando sobre os rituais ocultistas prometidos na campanha de financiamento. Pode ter sido para não deixar o inicio da demo muito abarrotada mecanicamente. Talvez essa mecânica vai ser introduzida mais tarde no jogo, mas a Agatha não comentar nada sobre me deixou meio receoso.
Além dessas dúvidas que ainda estão no ar, minha maior expectativa com Enigma do Medo fica realmente para a questão de otimização. Ainda julgo muito cedo para dar qualquer veredito sobre o jogo cumprir ou não com as expectativas de design que ele mesmo se impôs, seja através da não-linearidade do mistério, dos rituais de ocultismo ou até do quão importante a relação com o Lupi vai ser. Por mais que eu tenha batido na tecla de sentir falta dos aspectos de sobrevivência em meio aos horrores, isso cai em uma questão do que eles realmente querem fazer com o jogo; se decidirem que querem um jogo mecanicamente mais simples para que os jogadores possam se desafiar mais através dos enigmas, também vai ser uma escolha válida. Mesmo assim, eu ainda sinto que a experiência poderia se beneficiar muito de um sistema de dificuldade nos moldes de Silent Hill: dois marcadores, um para dificuldade de survival horror e outra para a dificuldade dos enigmas. Mas eu sei que mesmo que eles fizessem algo simples, como três níveis de dificuldade para cada marcador, ainda seriam pelo menos nove cenários que eles teriam de considerar pro mesmo jogo, então dificuldades extras criariam uma camada de complexidade bem alta para o desenvolvimento como um todo.
De qualquer maneira, estaremos antenados para ver o que nos aguarda no final de Novembro com o lançamento oficial do jogo. Caso vocês queiram já esperar conosco e fazer a pré-venda do Enigma do Medo, não se esqueçam de conferir a nossa parceira oficial com a Nuuvem que está com uma skin exclusiva do Lupi para quem adquirir a pré-venda por lá!
#RECANTODOSUSTÃO2024