Monster Hunter Wilds — insistindo no erro | Análise

Monster Hunter Wilds — insistindo no erro | Análise

Monster Hunter Wilds acontece em meio a um movimento contemporâneo de “jogadores casuais” se aprofundando nas mais diversas franquias que seriam consideradas como jogos de nicho há algum tempo atrás. Todo videogame meio apagado de uma empresa grande tem a chance de ganhar os olhos do público se esses forem bem apresentados em algum dos eventos megalomaníacos de trailers.

No dia que Monster Hunter World foi anunciado na apresentação da Sony na E3 2017, eu vislumbrei em minha mente o potencial deste novo mundo para a franquia com incerteza e fascínio. Na realidade, em retrospecto, me impressiona muito como esse primeiro trailer se tratava de uma conjunção de pequenas performances de ações que fariam parte do ciclo de gameplay de World sem alterações ou hipérboles na forma como você lidaria com sua caçada. Todas eram experiências naturais (com exceção do caçador correndo por alguns segundos do monstro) e fruto do eixo de funcionamento de uma caçada do World.

Mas Monster Hunter é um exemplo extraordinário, renegar o sucesso desde sua gênese não é justo com a franquia; dizer que foi a partir de World que a franquia entrou em alguma espécie de panteão de relevância é um tanto injusto com as literais milhões de pessoas que acompanhavam a franquia desde a época que atacar com o analógico era um principio.

Monster Hunter World
o Rathalos na arte promocional busca rememorar o primeiro jogo, mas já deu né?

Todavia, foi longe dos grilhões da Nintendo e seus consoles não tão potentes, que World trouxe uma mudança disruptiva na forma como todo o planeta começou a compreender e pensar Monster Hunter.

World foi um esforço coletivo de seus desenvolvedores de revolucionar a forma de jogar e interagir com o mundo de Monster Hunter. Isso deu certo? Não posso dizer que sim. World é excelente, mas o jogador de primeira viagem precisa negligenciar a sua atenção às estruturas que fizeram caçar monstros ser algo tão excêntrico. O foco vira começar a brincar de biólogo ao mesmo tempo que lida com burocracias de um grupo de pessoas que têm permissão do sistema para portar espadas e fuzis de dois metros para assassinar monstros que estão supostamente interferindo na fauna e flora local.

Tudo demora mais do que realmente deveria, identificar dezenas de rastros para enfim encontrar um maldito monstro, assistir uma ceninha e enfim começar a enfrentá-lo não é a coisa mais cativante do mundo. Não ajuda que, caso você não saiba jogar o jogo ainda, uma péssima caçada dura mais do que 20 minutos. A expansão Iceborne já começa a negligenciar essas batidas de ritmo de forma sutil e focar numa identificação territorial mais diegética e mais focada no massacre de grandes bichos. Foi nessas que a Clutch Claw (uma garra que também é hookshot) se tornou uma parte integral da mecânica do jogo e dinamizou muito de seus processos.

Com a chegada de Monster Hunter Rise e seu Wirebug, um pequeno inseto que auxilia o jogador a realizar qualquer forma de acrobacia e microdinâmicas no ar, uma narrativa se moldou de como este era o Monster Hunter ideal em uma parcela da comunidade. Um Monster Hunter mais direto, simples e confiantemente superficial no seu jeito de se lidar com sua história no equivalente ao quase-Japão da franquia.

Monster Hunter Rise
Não consigo gostar da falta de iluminação do mundo de Monster Hunter Rise, é tudo tão… bleh

Eu comprei essa narrativa por algum tempo, ela conversa de forma indireta com o design que moldou jogos anteriores a essa nova fase de Monster Hunter, mas depois de enfim finalizar Iceborne e jogar Wilds, eu pude vislumbrar uma nova hipótese.

Monster Hunter Wilds é um jogo de ação lançado dia 28 de Fevereiro de 2025 para Playstation 5, Xbox Series S|X e PC. Desenvolvido quase que na sequencia de World, é também a prova que você pode cobrar 350 reais em um jogo com foco multijogador e monetizar através de tickets para alterar a aparência do seu personagem e com cabelos de chifrinho de demônio; logo, logo aparece a Handler com roupa da Chun-li… De novo!

Eu não quero que esse tipo de parágrafo apareça em todo texto que produzo, mas da forma que os videogames estão “funcionando” é meio difícil evitar a necessidade de expor o fato que este jogo está em uma linha tênue entre que eu considero intragável em visuais e desempenhos. Quando Wilds sente vontade ele é belo e moral, mas na maior parte do tempo é apenas a aberração imagética que a colisão obrigatória de tecnologias de upscaling de imagens com a geração de quadros falsos que agregam input lag causa e transforma todos os frames numa insanidade virtual. Fica difícil compreender se detalhes específicos são do jogo ou da muleta tecnológica que seu computador ou console precisa para fazê-lo funcionar.

Jogadores de velha guarda vão reclamar de suas facilidades enquanto grandes portais como a Folha de São Paulo vão dizer que novatos precisam se esforçar para gostar. Eu não acho que seja justo nenhum videogame que exista agradar seu novato; o vislumbre de um mundo novo deveria ter pitadas de hostilidade e fascínio. Você realmente se sente confortável quando seu pai te obriga a dirigir o carro dele quando você tem uns 12 anos de idade em uma rua relativamente populada? Eu demorei alguns bons anos para sentir alguma espécie de satisfação jogando videogames de modo geral, com Monster Hunter não foi diferente.

Comecei minha jornada em Monster Hunter Portable 3rd para Playstation Portable em 2013, posteriormente caminhei para Monster Hunter Generations em 2017, até enfim aprender a jogar o videogame para valer no ano de 2020 com Monster Hunter World no Playstation 4. Quando eu digo “aprender o jogo” considere spammar até o infinito e além o combo Big Bang do Martelão. É pouco, mas o suficiente.

Monster Hunter Wilds é um filme de Monster Hunter, mas sem a Milla Jovovich. Toda a base de estrutura narrativa é focada em tropos de cinema de ação e aventura contemporâneos e a nossa trupe de protagonistas tem o otimismo, bom humor e a sobriedade de conflitos pessoais que faz a experiência de acompanhar essas ceninhas ser minimamente cativante. A dublagem brasileira consegue ser excelente e até o momento é minha escolha quase permanente. Quer dizer, a voz do Amigato não me ajuda de forma alguma. O conceito de dar voz ao Amigato não me ajuda de forma geral, mas eu aceito…

Monster Hunter Wilds

Tudo é uma mistura tremendamente agridoce entre a hiperfixação burocrática de World com a noção do que ele constrói do que é cinematográfico nos jogos japoneses contemporâneos. Mesmo o protagonista tem voz e fala como se fosse um herói lendário que deveria viver em nome de seu próprio ego e não com esse bando de biólogos burocratas. Mas tal caçador é honrado e está apto a cumprir com seu propósito de caçar monstros e colaborar com a guilda nesta missão de adentrar e entender o que são as Terras Proibidas.

Fazer alguém tremendamente grotesco no criador de personagem transforma esses momentos de provocações emocionais em abstrações de qualquer emoção que passe de um leve incômodo. Certamente eu aprecio a coragem dos jogadores que abriram mão destes momentos.

As caixas de texto intermináveis se tornam pequenas frases garrafais ou cenas dramáticas de ação que ainda assim tentam provocar alguma verossimilhança com a realidade sobre o dever militarizado do que é ser um caçador da guilda e por que essa é uma profissão de respeito. Todas essas micro decisões me geram simpatia em como os desenvolvedores principais da franquia encontraram as nuances da ação pipoca e que associam as batidas de Monster Hunter Wilds num épico conto.

Monster Hunter Wilds

Isso não implica na realização destas ideias com uma proeza magnífica, muito pelo contrário. Existem muitos exemplos prolixos em como Wilds conta sua história não tão longa de talvez umas 15 horas ou mais, e se alguns monstros tem apresentações e shows à parte, outros são esquecidos e transformados em sacos de pancada que serão apenas rememorados na campanha de High Rank, que é onde deveria morar o molho desta jornada.

Monster Hunter Wilds é suave, é tranquilo, é direto. O botão de foco te permite ajustar a mira do seu ataque quando você bem entender. Veteranos podem se assustar e cogitar a ideia de isto ser roubado. Sim, é roubado! A dinâmica de combate da franquia se tornou menos sobre erros e acertos de comandos e um tanto mais sobre a dança direta entre o jogador e o monstro no campo de batalha.

A leitura de movimento do inimigo é mais dinâmica e as oportunidades de evitar ou mesmo de defletir diretamente seus ataques se torna não algo opcional e incrível quando feito, mas em partes obrigatório em sua performance. Não ajuda que os combates de Low Rank não tragam nenhum desafio para quem já conhece as dinâmicas de um combate de Monster Hunter.

Monster Hunter Wilds

Talvez seja este o momento em que o novo jogador possa ser livre para se expressar e entender o que faz Monster Hunter ser Monster Hunter e os mais antigos explorarem uma arma nova e mais complicada. No meu caso comecei a jogar com a Charge Blade, a espada e escudo-que-se-torna machado para causar danos viscerais; ela precisa de constantes momentos de pausa entre o combate para buffar cada um dos seus três objetos de poder. Isso vale plenamente na hora de hora de acertar aqueles lindos frames de invencibilidade em meio ao combate.

Desde o lançamento de Generations como homenagem ao legado da franquia até aquele momento, Monster Hunter aderiu a um estilo de nomeação mais focado na intuitividade do conceito: World é sobre o alto conceito deste mundo híper-conectado e contextualizado onde os monstros não dependem da existência de um jogador; Rise é sobre o mapa mais vertical em camadas e focado nas ascensões do Wirebug; Wilds então é sobre.. selvas? Selvagerias? Mais ou menos.

Herdando de muitas ideias de World, Monster Hunter Wilds se ancora no vislumbre mais conectado das temáticas e legados que vivem acerca da caçada, o que certamente não vai acalentar jogadores que se ressentiam com a ideia de contar uma história focada em tais arredores, e eu devo dizer que foi uma das minhas coisas favoritas em todo meu tempo com Wilds. Não abandonar as ideias apaixonadas mas um tanto falhas por natureza de World e sim encontrar um próprio caminho o beneficia em artigo de coragem.

Monster Hunter Wilds

Ainda que seja menos expositivo do que o jogo anterior, há bens que vem para os males. A franquia que já não é tão bem reconhecida por tutoriais que te explicam como tirar o melhor do seu equipamento ainda não ensina basicamente nada de forma intuitiva sobre qualquer uma das micromecânicas gerenciais que ainda permeiam. Eu tenho certeza na suposição de que alguns novatos não estão preparando suas refeições, tomando bebida quente em localizações geladas e talvez nem perceberam que precisam repor suas poções.

Wilds promove uma máxima da independência do jogador com burocracias tradicionais. O mapa é completamente aberto e acampamentos são distribuídos e podem ser desbloqueados ao redor; quer começar uma missão? Sua Handler Alma te acompanha durante a exploração e é só falar com ela e o bicho fica marcado no mapa… Se você estiver com tanta pressa, só sai correndo atrás de um bicho e marreta a cabeça do pobre coitado que a Guilda dos Caçadores vai se sentir coagida a te dar permissão para matar.

Os Seikrets são passarinhos montarias que, para além da mobilidade insana, te permitem afiar sua espadas, carregar uma arma secundária e também são os baús de suprimentos. Considere também a ideia do Focus Mode de mirar para atacar e o fato que se alimentar se tornou algo muito menos presente na jornada, já que você pode comer em qualquer lugar e os buffs duram de trinta minutos até uma hora; agora junte e embrulhe tudo isso num pacote… se você não joga Monster Hunter, tudo soa como melhoria de qualidade de vida, mas para alguém que já jogou os anteriores, eu tenho plena certeza que cada um destes fatos acende um alerta vermelho de Metal Gear Solid na cabeça.

Monster Hunter Wilds
Feijão

Meus centavos são difíceis de emprestar sobre a percepção que tenho de todas essas reinvenções. Para veteranos, morrer no High Rank é uma exceção da regra. Ao decorrer que, sob relato de novatos, falhar uma missão no Low Rank nunca vai acontecer caso a atenção esteja minimamente permeada na hora de jogar.

Mesmo o opressivo Gore Magala não oferece muita coisa além de porradinhas que tiram uma vida considerável. Isso não me é necessariamente decepcionante, mas depois de passar 40 horas passeando no parque, me vejo obrigado a aguardar as futuras atualizações que vão trazer novos velhos monstros da franquia e enfim a chegada de um Master Rank com os reais desafios e maiores pontos altos que Wilds pode trazer sob sua base.

Em breve, com atualizações frequentes e novos desafios, as coisas ficarão claras para toda a comunidade e censos serão definidos do que é “bom” e “ruim”. Certamente o conceito de dar uma história a este videogame não o diminui de modo algum. Jogadores frustrados podem ter lapsos de raiva com este início na mesma mentalidade do ressentimento que existiu com cutscenes de Doom Eternal, fazer o que?

Nada me desabona tanto como deixar claro nessa análise de que trazer um veredito sobre o potencial deste jogo é uma coisa que eu só posso dizer daqui há alguns anos. Eu posso confirmar que Monster Hunter Wilds é definitivamente a experiência mais divertida da franquia até o momento. A conformidade é um grande problema no mundo dos videogames e eu fico feliz em saber e informar que, com certeza, o time principal de Monster Hunter ainda faz questão de errar.

Monster Hunter Wilds

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