2024 foi definitivamente O ANO de eventos de jogos independentes, desde novas edições de festivais que já eram muito queridos como o caso do Festival Jogatório e da PerifaCon (que estava contando com dois andares para jogos digitais e salas separadas para jogos de tabuleiros) até as novas descobertas como o EAÍ Jogos (evento centrado na comunidade universitária desenvolvedora de jogos), além da Expofeira Amapá 2024 que nossos colegas do Game Design Hub cobriram.
Mesmo chegando na reta final do ano, a comunidade indie continua se mostrando cheia de fôlego em receber o amplo público de braços abertos nos eventos gratuitos. A novidade da vez é o NewGame+ Fest 2024 (Instagram), uma mostra de games LGBTQ+. Nessa quarta-feira, eu e um de nossos fotógrafos Matheus tivemos a oportunidade de visitar o evento, jogar alguns jogos, conversar com as pessoas por lá, e agora viemos mostrar os melhores momentos que experienciamos.
Sobre o NewGame+
NewGame+ Fest é um evento que está rolando no Sesc Paulista; além da mostra contar uma curadoria temática bem forte, ele tem a proposta de se distanciar dos eventos de jogos “mais tradicionais”, abandonando os moldes da fileira de desenvolvedores, cada um com seus computadores expondo seus jogos, em favor de se aproximar muito mais do modelo de uma “exposição” mesmo.
Chegando no local nos deparamos com totens contendo televisões, cada uma rodando um jogo junto a uma plaquinha contendo seu nome, estúdio e breve sinopse. Alguns monitores gerais cercam o espaço explicando sobre os jogos presentes, auxiliando jogadores com dificuldades e até se propondo a resolver qualquer imprevisto técnico que possa ocorrer. Isso acaba por criar um ambiente menos agitado como os eventos de jogos costumam ser, o que acredito que casa muito bem com a proposta da curadoria. Jogos “menos dinâmicos” (como visual novels, por exemplo) acabam não tendo muito espaço para que os jogadores possam se debruçar em eventos mais tradicionais devido ao clima de agitação inerente da configuração de como são realizados tais eventos, enquanto nesse modelo da NewGame+ esses títulos acabam tendo mais lugar para respirar.
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Além disso, tomando inspiração do Festival Jogatório 2024, o NewGame+ traz um álbum de figurinhas para que todos os participantes possam completar conforme forem testando os jogos presentes. Pessoalmente gosto bastante dessa onda de brincadeirinhas interativas que os eventos têm feito.
Lurn.Rdio.Taxi
Lurn.Rdio.Taxi é um híbrido de jogo de corrida com jogo de ritmo desenvolvido pelo Soín Coletivo. A demo atual contém três percursos, o primeiro onde você faz o tutorial do jogo e os outros dois sendo diversas fases, diferenciando apenas o tipo de carro usado nas corridas.
A gameplay consiste em acumular pontos através de manobras de drift precisas, desviando de obstáculos para conseguir aproveitar a música da fase ao máximo.
O jogo transborda estilo, desde a tela de título que mostra sua clara inspiração em Jet Set Radio até as paletas de cores vibrantes presentes em cada fase. E esse estilo não se limita somente ao campo visual: Lurn.Rdio.Taxi conta com diversas faixas de artistas brasileiros super característicos (como Luíza e os Alquimistas por exemplo), que fazem o jogo ter uma trilha sonora contemporânea e única.
Apesar do jogo deixar suas referências estéticas bem claras e exceder muito nesse campo, o game design não parece decidir muito bem para onde ir. As pistas se assemelham muito aos special stages de Sonic Heroes, fazendo com que o aspecto de corrida não seja tão aprofundado com estratégias de decorar locais específicos da pista para executar manobras otimizadas ou pegar atalhos e conseguir completar ela o mais rápido possível. Levando em conta que ele se apresenta também como um jogo de ritmo, seria compreensível que esse lado da corrida não seria tão explorado em prol de focar mais em gimmicks relacionadas à musicalidade da obra, mas ainda assim o level design não parece se entregar por completo a isso. Mesmo com cada fase sendo feita exclusivamente para cada música presente no jogo, dificilmente me peguei tendo a sensação de que elas dialogavam em um nível intrínseco uma com a outra. O jogo não te dá aquela sensação de sentir qual vai ser o próximo comando pedido puramente por estar sintonizado com a música.
Lurn.Rdio.Taxi não contém uma build pública no momento, então se quiser dar uma chance a esse híbrido estilo e experimental não perca a chance de visitar o evento enquanto ele está rolando!
Other People’s Problems
Other People’s Problems é uma experiência narrativa desenvolvida pela minha querida amiga Dev Vand.
A obra apresenta um diálogo muito íntimo da autora com suas experiências enquanto uma pessoa queer e é bonito ver que ela nasce como uma resposta não somente emocional mas também material a obras passadas. Não só ao body change problems, como está escrito na página do jogo, mas também existe claramente uma rima visual com outro trabalho anterior da artista.
Other People’s Problems também está disponível no Itch.io de Dev Vand.
Deliria
Deliria é um walking simulator com enfoque em uma narrativa LGBT desenvolvido pelo Aipo Digital. A estória acompanha o bar Deliria, um estabelecimento que desafia a lógica do espaço-tempo e insiste em habitar na liminaridade do mesmo, apenas se revelando para aqueles que necessitam dele.
Na demo vivemos as frustrações de Li, uma jovem mulher lésbica que encontra o bar enquanto experiencia diversas insatisfações com sua vida familiar e seu trabalho como artista. Com a ajuda da medusa ViviMorri, o lobisomem Lobismana e a performer Tundra, a noite passa e revela os turbilhões internos que assombram nossa atual protagonista.
Deliria é um show, abre com um videoclipe super bem produzido e com uma forte estética queer nos apresentando o conceito do bar; logo em seguida, pulamos brevemente para um estilo de photobashing com a protagonista adentrando o bar, e então somos recebidos em um ambiente low poly super bem trabalhado, com animações de personagens em pixel art maravilhosos. Infelizmente, mesmo com todo esse glamour visual, acabei tendo alguns problemas com a narrativa e gameplay desse jogo.
Sobre a gameplay, eu fiquei um pouco decepcionado com termos esse cenário e sprites lindos que acabam servindo só para você ir de um canto do mapa para o outro, múltiplas vezes em um ritmo beeem devagar. Sério, a demo inteira consiste em você ir da ponta esquerda para a ponta direita várias vezes com dois loops super curtos que ficam alternando entre eles ao fundo. E sobre a narrativa, eu entendo e aprecio a ideia de lugares que existem além do tempo, assim brincando com personagens de temporalidades distantes interagindo entre si, mas nesse caso senti que o roteiro Deliria ficou anacrônico em certos pontos, arrancando a imersão da minha experiência.
O jogo tem uma página na Steam mas não possui demo pública até o momento.
Um Domingo à Tarde
Um Domingo à Tarde é uma visual novel focada em puzzles desenvolvida pela White Wolfy. Acompanhamos as desventuras de Lucas e sua melhor amiga Carol por vários bairros de São Paulo (principalmente na Liberdade); a dupla precisa fazer o seu melhor para coletar o máximo de figurinhas e completar um álbum de aquarelas que Lucas pretende dar de presente para Leo, sua paixonite atual.
A gameplay do jogo se divide em três partes:
- Cenas de diálogo
- Essas seções são onde o jogo se aproxima mais das VN’s tradicionais, com ilustrações dos personagens conversando entre si enquanto você aprecia o trabalho estético de aquarela usado na estética do jogo.
- Exploração dos bairros
- Após as conversas, os personagens podem andar pelas ruas de São Paulo, podendo interagir com outras pessoas espalhadas por aí, e com alguns pontos de interesse específicos.
- Puzzles
- Essa é a gameplay principal do jogo, quase toda figurinha do álbum vai exigir que você resolva alguma espécie de quebra-cabeça, seja para convencer alguém a te dar a figurinha ou simplesmente para que ela venha até você.
Esse jogo pra mim é muito gostoso porque ele me entrega quase uma visão idealizada de São Paulo, de lugares da cidade que eu tive a oportunidade de passar e experienciar, então é meio inegável que ele acerta quase uma nostalgia pra minha pessoa. Mesmo assim, ele se encontra em um lugar de um jogo bem relaxante e quase que ideal para curtir num titular domingo à tarde. Minha única frustração vem das seções de exploração dos bairros, que poderiam ser mais interativas em si. Os cenários e animações são lindos, mas não se tem muito a fazer neles além de ir pro ponto de interesse imediato.
Um Domingo à Tarde não tem demo pública no momento, então caso queira experienciar essa visual novel relaxante não perca a chance de visitar o NewGame+!
ABYSS X ZERO
ABYSS X ZERO é o mais novo jogo do estúdio Pixel Punk. O jogo é um metroidvania 3D sobre duas protagonistas destinadas a se enfrentar em um mundo quase pós-apocalíptico.
Falar sobre ABYSS X ZERO é difícil porque, afinal, o que ainda não foi dito sobre esse jogo? No Festival Jogatório tive a oportunidade de ser a última pessoa do evento a jogar a demo presente por lá, nisso eu e nossa editora Lily tivemos a oportunidade de conversar com a Tieni Pixel para tirarmos algumas dúvidas sobre a obra. Tieni nos confirmou que ABYSS X ZERO divide muitas similaridades com Unsighted, menos por ser uma sequência imediata ou se passar no mesmo universo e mais por justamente nascer da ideia de “Ok, como podemos fazer Unsighted em 3D?”.
A experiência é exatamente o que você espera pelos trailers e histórico das criadoras, ABYSS X ZERO é um jogo satisfatório em todos os sentidos possíveis, o combate é preciso, a exploração das dungeons é instigante e todos os visuais são de tirar o fôlego.
ABYSS X ZERO tem uma página na Steam mas sua única demo disponível ainda reside no NewGame+, então não perca a chance de presenciar esse leviatã do nosso solo nacional assim que possível!
UNBEATABLE
UNBEATABLE é um jogo de ritmo desenvolvido pela D-CELL GAMES. Nele acompanhamos Beat, uma jovem musicista que junto com a sua banda devem fazer o máximo para não serem presas nesse mundo onde a música é ilegal.
A gameplay alterna entre dois modos: o de exploração, onde você controla a personagem e tem vislumbres do mundo ou de memórias do seu passado e sua relação com a música, e o modo de jogo de ritmo, onde você deve reagir às notas que vem por ambos os lados da tela de acordo com o andar da música que você escolheu. UNBEATABLE foi um sucesso de arrecadação no Kickstarter e não é à toa, tudo no jogo é extremamente preciso e expressivo, é frenético pegar as músicas e se perder nelas com o bater das notas.
A estória do jogo ainda é em grande parte um mistério, mas pelos flashbacks é algo que me toca muito, vindo desse lugar de alguém que ama música mas simplesmente não consegue se conectar como sente que devia.
A demo do jogo também se encontra disponível na Steam.
Until Oblivion
Until Oblivion é um walking simulator narrativo desenvolvido por IXAVON. O jogo acompanha Emma Wilson, uma adolescente sem grandes destaques que ao chegar na festa de Halloween de seus amigos se vê presa em uma trama que pode envolver horrores além da sua compreensão: loops temporais, distorções no tecido da própria realidade e confrontos com seu relacionamento não-tão-saudável.
A gameplay consiste em andar pelo mapa, interagir com os participantes das festas e ir resolvendo puzzles com dicas dadas pelas pessoas presentes. Emma é a única ciente dos loops temporais acontecendo, então cabe a ela fazer o melhor que pode dentro de cada repetição.
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Until Oblivion tem um charme que é difícil de colocar em palavras, o art style simples e rabiscado, a trilha sonora sintética, o diálogo natural e terno. Esse jogo tem uma espécie de alma que é difícil de descrever, mas definitivamente é presente no momento que você a vê.
O jogo está disponível em sua inteiridade na Steam gratuitamente, ambos em Português e Inglês.
Curiosidade: O jogo foi traduzido exclusivamente para participar do NewGame+!
Dustborn
Por último, mas não menos importante, Dustborn esteve no evento.
Dustborn é um action game desenvolvido pela Red Thread Games. Acompanhamos a jornada de Pax e sua banda Dustborn, que juntos viajam por uma República Americana ditatorial e corrupta.
Falar sobre Dustborn é complicado. O jogo foi alvo de várias críticas e virou um enorme bode expiatório nas campanhas do GamerGate 2.0 que vivemos atualmente (le woke mobe). Por mais que existam críticas a serem feitas sobre o jogo (como eu vou fazer logo a seguir), é inegável que houve um tratamento descomedido à obra.
A gameplay da demo presente no festival mostra alguns vários recortes das primeiras duas horas do jogo. Você tem uma cena que envolve andar pelo mapa e cumprir alguns certos objetivos, outra que foca mais no minigame de ritmo e na interação entre personagens durante a viagem e por último uma sessão mostrando o combate de Dustborn. Finalmente podendo jogar Dustborn, vi que a movimentação do jogo é meio estranha, tudo parece escorregadio demais e o combate é super lento, mas, pelo menos nessa demo inicial, não encontrei nenhum absurdo no roteiro do jogo como tentam convencer que ele constantemente é.
O art style é super bonito e o character design realmente nos apresenta um cast de personagens super variados, realmente dá a sensação de que esses designs e esse mundo vieram direto de uma história de HQ.
Dustborn se encontra disponível e inclusive em promoção na Steam atualmente.
Caso algum dos jogos tenha te interessado não perca sua chance, o NewGame+ Fest está rolando no Sesc Paulista até o dia um de dezembro (01/12/2024)!