Spyro está entediado. Logo após sua grande vitória contra Gnasty Gnorc, nosso herói se encontra no abismo profundo do tédio. É então que ele decide tirar férias no parque de diversões místico, Dragon Shores, e assim que entra no portal acaba sendo lançado para um reino distante em outra dimensão, que está prestes a ser usurpado por um tirano. Contra sua vontade, mas ainda de cabeça erguida, Spyro parte em mais uma jornada para resolver os problemas dos outros — tostando inimigos, coletando tesouros e ressignificando complexas relações interpessoais de sociedades em colapso. Bem-vindos à Spyro 2, e pode apostar que o SEO vai pegar no meu pé por deixar o jogo no fim do parágrafo ainda que esteja no primeiro. Impossível agradar esse cara.
Os mundos de Avalar
Boas vindas a Avalar, lar de animais mágicos, pontos turísticos de veraneio e monarcas estúpidos. A terra dos seus sonhos! Exceto que Avalar está sendo invadida por Ripto, um serzinho ridículo com uma capa, chifre e um cetro, que não deve sequer saber limpar a própria bunda. Difícil acreditar que esse sujeito pode dominar um universo inteiro, mas ele realmente tem um cetro desproporcionalmente grande. Nas mãos, não nas calças.
Aparentemente a única maneira de vencer Ripto é trazer um Dragão de outra dimensão. Eles só tiveram o azar de trazer o menor Dragão de todos os tempos. Bem, alguém tem que fazer o serviço, e quanto antes fritarmos Ripto na lava quente de um vulcão, mais rápido vamos tirar férias. 14 talismãs são necessários para chegar em Winter Tundra, e 40 orbes para invadir o terreno de Ripto. O número de fases desceu só um pouquinho quando comparado ao primeiro jogo, mas ainda são quase 30. Elas são maiores, bem mais complexas e divertidas do que o primeiro também, então não dá pra reclamar.
Nosso herói controla de forma um pouco diferente em Spyro 2, tanto nos seus movimentos básicos quanto nos novos. Embora planar seja bem parecido, o dragão recebeu a habilidade chamada de “Hover” em que, ao apertar Triângulo no meio de um Glide, ele pode subir um pouco a fim de alcançar plataformas altas. Para quem jogou o primeiro tanto quanto eu, vai acabar percebendo que essa nova habilidade substitui o boost horizontal do Charge aéreo, o que é meio triste… mas é fato que Hover abre mais possibilidades no level design.
Ainda assim, o Charge não foi nerfado de forma alguma. Apesar de sua perda, Spyro 2 aumenta a altura dos saltos de Charge significativamente, quase a mesma altura que o pulo mais alto do dragão. Essa diferença deixa não só mais divertido explorar os cenários como traz um dinamismo interessante e apreciado a essa nova aventura. A diferença do Charge antigo para o novo é de noite e dia, impossível não perceber.
Mais três coisas situacionais foram endereçadas ao set de movimentos do nosso personagem. A primeira é nadar, algo que ele não podia fazer de jeito nenhum no primeiro jogo. Fases possuem seções dentro d’água, que não são tão chatas quanto podem parecer. O dragãozinho é muito possivelmente mais rápido submerso, podendo utilizar do seu Charge para desbravar seções marinhas com velocidade.
A segunda adição é a escalada, que só pode ser feita em paredes específicas. De início, é uma habilidade bem esquecível, e isso só muda nos níveis finaleiros que usam bem a possibilidade de escalar, propondo desafios interessantes ao jogador.
Por fim, Headbutt é um Groundpound, que é a melhor adição já que pode ser usada a qualquer momento. Os Headbutts podem destruir alguns objetos mais duros como pedras, e são a única coisa que pode quebrar alguns jarros de ferro específicos. É claro, também abrem buracos no chão se necessário. Por ser a última habilidade concedida ao dragão, não é muito bem utilizada, sendo um poder nichado o suficiente para não fazer tanta diferença. Isso pode mudar no jogo seguinte em que você já tem todas essas habilidades de início.
Também foram criados portais especiais que, quando acessados, conferem poderes novos ao Spyro por tempo limitado. Bolas de fogo explosivas, vôo infinito ou Super Charges, são todos conseguidos ao passar por um desses portais. Uma ótima maneira de recontextualizar poderes antigos de uma forma que seja mais fácil de incluir nos níveis de Spyro 2, sem precisar de rampas gigantes ou fadas do reino dos dragões que não existem em Avalar. Mas tenho certeza que Spyro preferia um beijo à alguns brilhinhos se o resultado ia ser chamas mais poderosas.
Isso é o que eu chamo de férias!
O Level Design evoluiu bastante desde o último jogo, assim como a apresentação do mesmo. Apesar da estrutura de entrar na fase e rapidamente terminá-la ainda existir, isso apenas funciona para os Talismãs. A fim de terminar o jogo, você precisa das orbes, que não são concedidas como os Dragões eram na jornada anterior. Em Spyro 2, orbes precisam ser conquistadas. Como? Com puzzles, minigames, corridas, lutas, todo tipo de atração única com contextos diferentes. Apenas chegar no fim da fase não vai resolver os problemas dos moradores de Avalar (que com certeza é o que você veio fazer…), então o jogador precisa fazer um pouco mais por eles a fim de ganhar orbes.
Uma coisa que mudou muito a alma dessa nova aventura são os diálogos e humor. Os habitantes têm nomes, personalidade e historinhas, criadas não só para ambientar o estágio que estão inseridos como tirar um arzinho das suas narinas. O humor de Spyro é bem único e cartunesco, por vezes usando da violência fantasiosa para te fazer rir (quase todas as cutscenes de fim de nível envolvem alguém morrendo de um jeito estúpido) e de um pouquinho de consciência sobre seu contexto como videogame. Coisas como a libertação de uma cervo ser agradecida com comentários grossos do tipo “Eu não fui presa, estava aqui porque queria ficar sozinha”, ou uma referência a Star Wars no meio de um diálogo simples, ou talvez o fato de que você enfrenta pássaros em uma fase para ajudá-los na seguinte, perpetuando uma guerra sem significado entre as duas raças. Sempre tem um subtexto engraçado por tudo que você faz em Spyro 2 — entregue pela escrita bem-humorada dos personagens.
E claro, o motivo das missões serem assim também é explicado por essa aproximação. Um jogo de hóquei, vencer Vacas controlando UFOs em uma cidade futurista (nesse nível, os animais de fazenda são os invasores), ajudar um alquimista a atravessar uma arena pelo caminho menos conveniente possível a fim de salvar Hunter de um efeito colateral de sua própria poção… eu adoro esse jogo. Na fase que você precisa salvar seres presos em pedra, um deles fala algo bem interessante: “Thank you for releasing me!”, uma frase clássica dita por muitos dragões em Spyro 1 que foi motivo de piada naquele jogo. Afinal, era esperado que os dragões sempre te dessem uma dica legal ou que tivessem uma fala engraçada, e não a mesma fala repetidas vezes. Esse tipo de discernimento humorístico me traz um sorriso sincero; eu de fato ri bastante quando escutei isso no jogo.
É claro, a exploração continua tão boa quanto o jogo anterior, mas de fato jogar Spyro 2 depois do 1 fez ele mais fácil. Se tornou parte do meu pensamento padrão entender como estágios de Spyro são desenhados, e algumas soluções que talvez fosse bem difíceis para iniciantes são naturais para mim. Acredito que seja uma experiência comum. Não digo isso como crítica, apenas acabou sendo mais fácil jogar Spyro 2 inteiro pela primeira vez do que Spyro 1 inteiro pela quarta ou quinta. Parte disso também vem do fato dessa sequência ser mais intuitiva e bem pensada. Ela faz mais sentido na mente da maioria das pessoas e, caso você queira coletar tudo aqui, não vai ter tanta dificuldade.
Os coletáveis ainda incluem as clássicas gemas, algumas recoloridas, e os coletáveis maiores que mudam a cada jogo. Aqui são orbes! Também existem Skill Points, um coletável secreto que pode te dar dois extras divertidos após zerar. Skill Points não são importantes durante o jogo, nem sequer mencionados até você conseguir um deles. Por vezes envolvem quebrar tudo em uma fase, ou chegar a um lugar específico que seria considerado difícil, ou realizar uma ação bem rápido. De qualquer forma, representam pontos de habilidade mesmo — você é bom no jogo, só isso.
Fora da exploração, o combate e platforming se mantém bem parecidos aqui. Alguns inimigos até são referências a monstros anteriores! Lembram das plantas comedoras de dragões do primeiro jogo? Aqui em Spyro 2 são arbustos que se escondem entre arbustos normais. Na dúvida, destruam todos e acabem com a fauna de Avalar. Isso é o que vocês ganham por interromper minha viagem à praia!
Alguns oponentes até são mais criativos do que no primeiro jogo, como os Earthshakers que só não podem ser destruídos por nada, apenas se jogados na lava. Eu demorei muito tempo pra descobrir isso! Eu saí da fase pensando que era impossível vencê-los sem um upgrade futuro como Headbutt. Não sabia que precisavam ser empurrados com Charge!
Os visuais do jogo foram aprimorados também, se tornando o clássico Spyro que eu sempre amei. Cheio de cores vivas, luzes e fases esteticamente distintas. No entanto, metade das fases aqui só… não são tão interessantes pra mim, por preferência mesmo. Comparadas às do próximo jogo, tive dificuldade para me relacionar com elas. Não falo isso sobre todas, porque uma parte grande ainda foi bem legal pra mim. Shady Oasis, Fracture Hills, Cloud Temples, Metropolis… representam exatamente o que eu mais gosto em Spyro, e me anima mais para o terceiro jogo, que sempre foi meu favorito.
No entanto, eu diria que os minigames, embora muito divertidos de tempos em tempos, deixam a desejar. Eu admiro que eles tentem se manter na gameplay básica do jogo, brincando com a movimentação geral do Spyro, mas ainda acho eles bem irritantes, pra ser honesta. Coisas como pegar flocos de neve antes do Hunter, proteger o alquimista, alguns desafios nas Speedways, seções de rail shooter — eles acabam não sendo muito divertidos. Isso é tanto pela implementação quanto a própria movimentação e câmera do jogo que não comporta diversos desses joguinhos. Ainda assim, sua presença é um sinal positivo ao meu ver, e mostram o detalhe e cuidado que cada mundinho tem na sua construção.
Se tem algo que eu não fui fã é o backtracking, que realmente acontece algumas vezes durante o jogo. Lugares que você precisa escalar mas não sabe como, ou minigames que pedem o Headbutt e você não aprendeu o poder. Não acho isso legal, sabe, mas é algo que se tornou comum no jogo seguinte também. Fico triste com isso, collecthathons não deveriam te fazer se perguntar se você é sequer capaz de pegar todos os itens da fase no momento.
Um Final Feliz
Spyro 2 é uma experiência bem agradável pra qualquer um. Um jogo simples e cheio de personalidade. Que outro jogo incluiria um livro de raças extintas do seu universo, com modelos novos que nunca serão usados ingame? É um passo muito grande em comparação com o primeiro e me diverti bastante.
Ainda assim, é um jogo que parece que tá “quase lá”, mas não chegou ainda… eu sinto que falta algo. Faltam seções de submarino, skates irados, troca de personagem, fases com o Sparx, minigame de jogo de luta… se ao menos houvesse um jogo do Spyro com todas essas coisas…