Command & Conquer foi um dos RTS mais importantes para história, e um dos que gerou mais jogos com estilos parecidos durante os anos 90. Nós tivemos vários jogos que viram aquela fórmula e replicaram com suas próprias ideias de tão simples e bem feitas que eram. Seja o limite de onde construir bases, seja com a falta de limite de unidades, mapas maiores, construções no canto direito para poder ir produzindo enquanto controla suas unidades, e por aí vai.
E quando saímos dos anos 90, Command & Conquer tentou novas coisas, como com Generals, que perdeu parte do que definia os C&C antigos, mas ainda tinha uma fundação muito sólida, ou a volta de Tiberium com Tiberium Wars, que trouxe de volta tudo aquilo que era importante para a série. Nós também ganhamos Red Alert 3 que, mesmo eu não sendo um grande fã, trouxe mais pessoas com seus ports de consoles, modo cooperativo, e uma forma mais palatável de introduzir alguém a esse estilo de Command & Conquer.

Mas depois veio a grande depressão. A EA, em uma tentativa não de inovar o gênero e buscar uma nova fórmula, mas sim um movimento de pegar um jogo solto e tentar colocar na série numerada de Command & Conquer, tivemos Tiberian Twilight, considerado por muitos um dos piores RTS. Tanto pelo seu sistema sempre online quanto pela falta de construção de base, gameplay cansativo e repetitivo, multiplayer que exigia grind, história mal acabada com FMVs piores do que do primeiro jogo lá de 1995, por aí vai… E com esse lançamento a série entrou em hibernação, que ameaçava sempre voltar, com alguns jogos anunciados mas nunca lançados e títulos mobile.
Porém agora várias dessas pessoas que cresceram jogando o gênero estão fazendo os seus jogos dos sonhos inspirados nos mesmos, já que existem ferramentas que permitem fazer isso com mais facilidade, como foi com Boomer Shooters, Survival Horror, Adventures, e claro RTS. Agora temos o jogo em questão, Tempest Rising.

Tempest Rising serve como um sucessor espiritual aos Command & Conquer. No caso, eles parecem mais a terceira era, que seriam Generals, Tiberium Wars e Red Alert 3. Mas eles não só copiaram e pronto — os devs entenderam algumas modernidades do RTS com jogos como Starcraft 2 e Age of Empires 4, e aplicaram nessa fórmula.
Tempest Rising se passa nos anos 90. Depois da crise dos mísseis, a Europa ficou devastada, mas acabou se tornando o local perfeito para o Tempest (o recurso) conseguir crescer, e após a radiação diminuir em algumas áreas, as pessoas conseguiram estudá-lo e ver que é uma excelente fonte de energia. Por causa disso, duas forças surgiram. Primeiro temos os GDF no oeste, que são os GI Joe padrão que querem o recurso e utilizam do famoso argumento “estamos indo instaurar a paz naquele local para conseguir invadir”. O motivo deles quererem essa paz é pela outra facção que surgiu na Europa, os Dynasty, que são um grupo não tão forte militarmente que dizem que o tempest é deles por direito já que foram eles que sofreram durante a crise nuclear. Eles enxergam o recurso de uma forma religiosa. Existe uma terceira facção que aparece futuramente, mas não é jógavel, então não vamos discutir eles.

Antes de mais nada, tenho que dizer que o jogo está lindo, os modelos das unidades estão extremamente bem feitos e se destacam… só a infantaria que se embola um pouco. Elas também possuem artstyles diferentes; não só de uma facção para a outra, como também entre as unidades. Só que, mesmo com essa diferenciação, dá para sentir que vimos aquilo antes, com blindados, infantarias e unidades aéreas sendo bem parecidas com outros RTS. Isso não quer dizer que não teremos unidades memoráveis e ánicas, os Dynasty possuem uma bola gigante que passa por cima dos inimigos, os GDF tem um grande foco com drones. Mas no geral não tem nada que seja tão novidade assim. As animações também são boas e funcionam, nada que se destaca tanto, mas combinam. Só as da infantaria que é meio esquisita quando estão andando.
Já na parte da narração das unidades, eu achei elas bem memoráveis, algo que acho importante em um RTS. As frases deles são marcantes, algumas engraçadas, e tem uma ótima qualidade. A trilha também é incrível. Composta por Frank Klepeki, que é O compositor dos RTS, que trouxe a incrível trilha sonora dos Command & Conquer, e volta aqui com toda sua força.

Tempest Rising funciona muito bem. Quando joguei a beta, senti as unidades meio travadas demais, mas agora elas fluem muito bem, mesmo com a infantaria e seus moonwalks, você sente uma resposta tátil delas, e pra mim essa é outra coisa super importante quando se trata de RTS, a responsividade das unidades. Eles também utilizaram do método que gosto de chamar de bolha assassina, onde diminuem a caixa de colisão e as unidades ficam grudadas umas nas outras se tornando uma bolha de tropas que sai destruindo tudo no seu caminho. Esse estilo de design não me agrada tanto, mas eles conseguiram contornar isso, com unidades que causam dano em área, então você precisa dar uma dividida nas unidades para não perder todas elas. Isso é algo que Command & Conquer sempre fez com seus efeitos de explosões, onde um soldado que possui algo que explode morre, e ele causa dano em volta, podendo gerar um efeito em cadeia matando suas unidades em um piscar de olhos. Em Tempest Rising, mesmo sem a presença desse efeito, só com esses danos em área você já é forçado a jogar de uma forma parecida com o Command & Conquer, o que achei interessante.

O pathfinding com esse efeito de bolha assassina acaba se tornando menos frustrante e a resposta rápida também ajuda. Só que tive alguns problemas com pathfinding muito pelo design das fases.
Ao invés de fases bem grandes e abertas como eram na maioria dos Command & Conquer, nós temos muitas linhas estreitas com alguns espaços abertos em Tempest Rising. Por causa disso surge o problema de dividir as suas tropas para evitar os danos em área e causa uns problemas no pathfinding, onde algumas unidades tentam dar a volta para conseguir ir para um local que daria para eles irem. Normalmente essa bolha costuma parecer uma unidade, só por isso o pathfinding costuma funcionar bem, mas aqui elas são bem individuais, causando essas voltas que mesmo não tão frequentes, quando aconteciam eram irritantes. Outra parte interessante é o pedra papel e tesoura do jogo, que possui seis diferentes tipos de resistências, onde cada unidade tem algumas. Essa super complicação causou efeitos estranhos durante minha jogatina. Em alguns momentos as unidades inimigas desapareciam, e em outros eu tinha que ficar MUITO tempo para conseguir matar alguma unidade. E como as unidades atacam aos poucos com um tempo de “recarga” (que achei bem longo, mas funcionou aqui) parecia ainda mais demorado em alguns momentos.

Meu problema não é o pedra, papel, e tesoura, mas sim a forma incerta de mostrá-lo. O que funciona no pedra, papel, e tesoura é que não precisamos olhar planilhas, mas só de ver as unidades sabemos como elas podem ser counteradas. Por exemplo: em jogos de RTS medievais, normalmente é bem claro que lanças matam cavalos com facilidade já que evita o contato com o “charge” da cavalaria, mas arqueiros sofrem exatamente pela cavalaria ser tão rápida e conseguir alcançar antes dos arqueiros causarem algum dano.
Aqui daria para funcionar, mas nunca é muito claro se está aplicando dano de explosivo ou de lança mísseis, então fica mais na tentativa e erro do que algo natural. Se você tem uma familiaridade com Command & Conquer, pode sacar algumas logo de cara, mas ainda assim tem alguns esquisitos e difíceis de ver.

Na parte da campanha acho que, mesmo com esse design que causa problemas, os mapas são muito bons para o que eles propõem. As missões são diferentes o suficiente uma das outras, com vários objetivos primários e secundários que são divertidos. Os objetivos primários são diversos. Por mais que tenham muitos que dependem de um timer, sempre senti que estava fazendo algo diferente enquanto via esse timer. E os secundários podem variar tão bem quanto, e podem te dar acesso a pontos estratégicos melhores, diminuir algum tipo de unidade inimiga te atacando, ou ganhar mais unidades. E gosto que algumas você precisa explorar o mapa para desbloquear — se ficar preso na sua base nunca verá esse objetivo. Objetivos secundários assim são os que mais gosto, eles impactam sua gameplay, você terá que fazer sacrifícios mas tem uma recompensa, diferente de objetivos secundários que as vezes são presentes nos RTS que servem mais como um tutorial avançado, te mostrando o que pode fazer com algumas unidades ou construções.

Já na parte de macro gerenciamento, nós temos diferenças entre as duas facções, cada uma tem seus tipos de construções e são diferentes na maneira que constroem, criando novas estratégias para montar sua base perfeita. Você tem que se preocupar com o recurso principal, o Tempest, e até a forma de coletar esses recursos é diferente de cada facção, sem contar que temos que construir silos para conseguir aumentar o limite de recursos que podemos stackar. Aqui temos também limite de unidades, mas graças ao limite de Tempest (que também nos força a explorar), demorei para alcançar esse limite com facilidade. Com os GDF também teremos um recurso extra para fazer construções mais avançadas, que são coletadas através de combate ou passivamente por algumas estruturas.
Uma coisa que inicialmente não me agradou mas depois me acostumei, é o avanço de estruturas. Para liberar novas unidades, temos que fazer construções avançadas e criar upgrades delas. No começo estava achando meio confuso, mas depois me acostumei, e percebi que o motivo que causou essa confusão é que, quando temos acesso às unidades novas, já ganhamos elas logo de cara ao invés de entendermos como conseguir produzi-las através de um mini tutorial. Então, quando chegava a próxima missão e não tinha acesso, tinha que parar tudo para ler como ter acesso a elas de novo.

Também senti falta de algumas coisas que eram marcantes nos Command & Conquer, que são as super armas, seja uma super unidade ou um super míssil nuclear, ou até mesmo uma arma forte. A terceira facção até tem uma super unidade, então imagino que deve haver algum update com essas novas unidades ou mesmo estruturas que causam destruição em massa, tal qual o Ion Canon ou o míssil nuclear de Command & Conquer ou só um tipo de auxílio, como o Iron Curtain ou Chronosphere que dava algum tipo de vantagem para suas unidades. Aqui, apesar de termos os poderes no canto onde temos que pagar Tempest para usar, eles são mais funcionais do que algo super marcante e over the top. Inclusive o Tempest Rising inteiro falta um pouco mais do over the top dos jogos que inspiraram ele.
E por fim, temos a história. Ela, de novo, carece de over the top, mas é funcional. Eu gosto que, ao invés de serem histórias de timelines diferentes, elas se complementam com cada facção resolvendo um problema diferente. Algo que acontece em uma campanha pode ser mostrada como aconteceu em outra, completando espaços vazios. Mas faltam personagens carismáticos e conflito entre eles. Os personagens costumam só te passar a missão e te elogiar, ou fazer aquilo de “vamos ver se você é bom mesmo”, aí você cumpre a missão e vem “eu não deveria ter duvidado de você”. E a falta de um rosto nos vilões causa aquele problema de nossos inimigos serem uma facção como um todo, algo que é pra mim um problema que acontece em Generals. Só que pelo menos temos as cinematics em Tempest Rising que são muito bem feitas, onde ganhamos o briefing da missão. A única parte zoada delas é só a falta de sincronia de labío que é tão ruim que fica distrativo, deve ser por isso que muitos personagens estão com máscaras ou no escuro, mas quando aparecem os principais acabam causando estranheza.

Na parte dos Dynasty, eles criam alguns conflitos que os personagens se tornam mais memoráveis e são interessantes, mas tem um problema no meio. O jogo é corrido em alguns conflitos e outros não são tão bem resolvidos. Sem contar que ele acaba em um cliffhanger, que por mais que finaliza um ponto para começar outro, senti que fiquei com mais dúvidas no final do que um senso de conclusão de um arco.
Ainda sim adorei Tempest Rising, para todo aspecto falta um pouco mais, e acredito que eles vão alcançar em algum momento (espero que seja por atualizações gratuitas). Mas ainda temos um jogo com missões divertidas, uma história que, mesmo sendo nova, te lembra dos velhos tempos com Command & Conquer de uma maneira interessante sem apoiar na nostalgia como um todo. Só devo deixar um aviso que enquanto estiver jogando eles estão pegando informações do seu computador para o que eles dizem ser empresas “third party”. Eu espero que isso seja removido, mas caso não se importe, recomendo o jogo, e recomendo ficar de olho em atualizações!

Uma cópia de Tempest Rising para PC foi concedida pela 3D Realms para análise no Recanto do Dragão.