Após tanto tempo, tanta especulação e tantas red flags, ganhamos Silent Hill 2 Remake, e graças ao Recanto do Dragão e à Nuuvem consegui uma chave para poder jogar. Nesse momento já finalizei o jogo algumas vezes, algumas muitas vezes, peguei todos finais, explorei a cidade toda e li todos os memorandos. É um remake que me impressionou em vários aspectos com sua estrutura muito parecida com a original, e alguns elementos a mais; algo que espero de um remake e que me surpreendeu, mas também tivemos algumas coisas que me deixaram um pouco desapontado.
Como material complementar para este texto, você pode conferir meu vídeo se aprofundando na narrativa e mecânicas do Silent Hill 2 de 2001!
Sei onde estou, mas ainda estou perdido.
O jogo veio custando 350 reais, então ele tem que atingir certos aspectos por ter esse preço. Como joguei pela versão da Steam, vou considerar apenas ela. Primeiro, temos Family Sharing no jogo, o que é sempre um ponto positivo, mas o jogo carece de cloud saves. Então, caso formate seu computador, lembre-se de fazer backup do seu save, e caso queira alternar entre computador e Steam Deck (sim, o jogo roda bem nele!), você deve transferir o save para conseguir progredir de onde parou. A Konami, com o tamanho que tem e cobrando o preço que cobra, tinha que pelo menos fornecer cloud saves, mas não só isso como também não temos dublagem em português, apenas legendas. Essa é mais uma coisa que quebra as pernas das pessoas que buscavam uma dublagem completa em nossa língua… Agora vamos falar sobre o jogo em si!
Eu tinha medo do Silent Hill 2 remake ficar com um aspecto muito genérico para alcançar esse nível de perfeição, mas aqui não é o caso: o jogo está bonito e bem ambientado! As texturas estão excelentes, o que é óbvio — mas tem aquele problema à la RAGE de demorar a carregar em alguns momentos. O mesmo vai para a iluminação que falaremos mais para frente. Quando exploramos a cidade ou os arredores dela, temos detalhes espalhados por toda parte para parecer um local real que em algum momento habitava pessoas, algo que o jogo original também possuía mas aqui, com a mudança de perspectiva, temos muito mais detalhes e props inseridos. Ainda assim não fica esquisito como se tivesse coisa demais no meio de uma sala, tipo conseguir ver reflexos nas poças durante o jogo. Você ainda vai reconhecer aquelas partes que tanto ama do original quando aparecerem. O local onde pegamos a pistola, por exemplo, ainda está cheio de buracos na parede, mas agora mais aparentes; o apartamento das mariposas possui mais espécies em vitrines, algo que me pegou mais por ser filho de bióloga. Deu para entender, teremos mais do que fazem aquelas áreas terem ficado na nossa cabeça originalmente, mas sem ficar demais a ponto de perder essa identidade, tudo comportando a nova perspectiva do remake. Mas as áreas mais comuns foram retrabalhadas para entregar mais personalidade, como o apartamento que parece que teve uma festa dentro, uma área médica do hotel onde encontramos enfermeiras; tudo foi retrabalhado e algumas áreas ganharam até mais importância, como o motel Jack Inn. Também ganhamos áreas exclusivas como o cinema, só que sem perder outras do original (mesmo que agora sejam áreas extras acopladas às novas como o boliche). As dungeons foram retrabalhadas com um layout novo, mas você ainda reconhecerá quartos do original por ali!
Claro que também temos os detalhes para mostrar que tem algo de errado lá, como corpos espalhados pelas estradas e locais que parecem que tiveram as pessoas que os habitavam sumirem em um segundo. Eles são cheios de poeira e demonstram um nível de desorganização, seja pela movimentação dos monstros naqueles locais ou seja pelo vento — que é outra adição que complementa a atmosfera. Vemos o vento levando as coisas aos poucos, e o jogo utiliza de uma ventania forte em alguns momentos para dar um senso de urgência. Ah, é claro que não podemos deixar de falar da névoa, algo tão presente na saga inteira. Aqui, ela está maravilhosa. Tem um aspecto bem denso, que traz aquele sentimento de sempre ter algo escondido por ali querendo te pegar. Com essa nova perspectiva e explorando os prédios, você percebe algo único quando sai deles e volta para a névoa, se preparando para o que está lá. Isso me lembra muito aquela cena do filme O Nevoeiro em que a galera sai da loja antes dos primeiros monstros aparecerem.
Quando o mundo ganha o aspecto infernal não é diferente: temos correntes espalhadas, paredes que parecem ou estarem derretendo ou terem sido rasgadas pela metade, maquinários bizarros, luzes falhando, ferrugem e um aumento na escala da estrutura do edifício que intensifica a ideia do surrealismo. Também teremos o ambiente mudando em tempo real, ganhando os aspectos que mencionei acima. Então a ambientação em ambos locais está boa, mas quando formos falar mais profundamente da história vou trazer isso de volta. A única coisa que peca um pouco é que quando estamos dentro de estruturas, o efeito de névoa parece continuar, mas… sem a névoa. Um exemplo disso está nos quartos iluminados simplesmente aparecendo na sua frente em longos corredores, o que causa uma sensação de estranheza. Existe também um efeito quando interagimos com trancas e cadeados que bloqueiam progresso. Quando abrimos, eles só somem com um efeito de bolhas, mas essa parte acabou combinando com o tom surrealista do jogo.
Não só James, como outros personagens e inimigos não foram poupados de detalhes! Nós temos expressões muito bem feitas e bem animadas. James tem um dos dentes inferiores meio torto, Angela tem unhas roídas, Eddie exala uma fumaça ao respirar como estivesse constantemente no frio, entre outros. Infelizmente os desenvolvedores viram que fizeram um ótimo trabalho e durante as cinematics deixaram a câmera bem próxima dos rostos. Eu entendo que gerar o sentimento de desconforto combina com os temas do jogo, mas para algumas cenas acaba caindo no vale da estranheza, que as vezes me tira da cena.
Silent Hill 2 remake também tem alguns detalhes interessantes que combinam com a gameplay, tipo o mapa que James usa para anotar quando recebemos uma dica e vemos a animação dele fisicamente marcando o local no mapa, que acaba servindo como dica de que temos um ponto novo de interesse para investigar. Além do mapa ser atualizado constantemente, vemos as marcações da parte que nós já investigamos ou de portas que já abrimos sendo apagadas, mas ainda tendo vestígios de que teve alguma anotação lá, como se James tivesse só esfregado o dedo para ele sumir. Quando o entramos no mundo pesadelo, o mapa também vai envelhecendo à medida que reexploramos.
Ao ficar ferido, James tem seus machucados expostos em suas roupas onde podemos ver rastros de sangue, assim como inimigos que ficam cada vez mais definhados. Ajuda bem o jogador a saber se eles estão próximos de morrer ou não — chega ao ponto deles escorrerem sangue e você conseguir ver esses rastros enquanto eles andam. Temos também detalhes que podem acrescentar à personalidade de James, como a forma que ele pisa nos inimigos sem nunca se exaltar demais (só cansando), a maneira que ele segura a arma, quando ele enfia a mão em uma privada suja e a camisa permanece suja durante boa parte do jogo, ou até mesmo quando fica cada vez mais exausto com olheiras e unhas mais sujas à medida que o jogo passa. Existem algumas animações que começam fluidas, mas acabam se tornando meio janky, especialmente no combate. James inclusive esconde as armas de uma maneira esquisita e, ao serem puxadas novamente, elas simplesmente reaparecerem, algo que não combinou tanto com a nova estética realista. A maneira que miramos também é meio esquisita. Como o jogo já tem um zoom bem próximo de James, que é ok, perdemos parte da nossa visão e gera um medo de algo estar próximo de nós. Só que aí o jogo tem que dar um zoom maior para quando miramos, e a câmera segue muito certinha a ponta da arma. Assim ficamos sem aquele pequeno delay no movimento da câmera, o que dá uma sensação estranha. Quando estamos em combate não dá para reparar tanto, mas quando miramos para olhar para algo e ela mexe repentinamente acaba ficando em evidência. Então, no geral: ambientação, texturas e efeitos estão bons, queria que eles tivessem trabalhado melhor a chuva que está esquisita e parece mais uma nuvem de tristeza chovendo só em cima de James, mas é o único que consigo pensar que me desagradou nos efeitos.
O bom é que com esses detalhes dá para remover alguns indicadores sem o jogo ficar difícil de ler; o ponto de foco da lanterna é sua mira, o sangue atrás da roupa de James é a sua vida, e até sua postura; a forma que ele fica com a mão na barriga demonstra que está com pouca vida. Fico feliz que temos a opção de remover isso tudo e ainda poder jogar sem se frustrar. O único que atrapalha ao ser removido é o indicador de interação que, mesmo com James olhando, não nos deixa saber ao certo onde ele está olhando. Temos locais onde não coletamos nada e podemos interagir sempre, então ele sempre vai estar olhando, além de algumas interações necessitarem do James estar muito próximo e em um lugar específico para serem efetivadas. Imagino que se você não souber o que tem que fazer, pode achar que não tem nada lá.
Mas claro, esses visuais e detalhes todos pesam, e o jogo infelizmente sofre de stuttering constantemente. Não é um tão forte à ponto do jogo ficar injogável, mas acaba sendo chato pela sua constância. Temos como ativar todos aqueles artifícios para ganhar FPS como FSR, DLSS, entre outros, mas mesmo assim continuei sofrendo. Alguns efeitos também são bem inúteis, como o detalhe de sombra que não muda muita coisa da configuração low para o high (além de perder FPS).
A comunidade já começou a criar guias para melhorar performance sem perder qualidade, além de inúmeros mods, então vale a pena conferir eles!
Gritos no espaço.
Ainda continuando na apresentação do jogo, temos os sons. No geral são bem legais, mas existem alguns que queria que fossem mais aparentes. Os passos de James não são tão altos assim, e ao explorar alguns locais você não escuta som de quase nada, mas dá mais abertura para ouvir os sons ambientes e de inimigos quebrando esse silencio, causando desconforto e medo além de complementar a atmosfera. Você não sabe o que está fazendo esse som e, como ele ganha destaque, provavelmente vai ficar grudado na sua cadeira.
O rádio também é bem baixo e perde parte daquela atmosfera de ouvirmos o rádio super estático misturando com os sons dos inimigos, e como James tira sua arma quando o rádio começa a pipocar, já temos uma referência de que existe um inimigo próximo. Os sons das armas também são bons com impacto não só realista, mas também poderoso como visto na shotgun ou rifle.
As vozes dos atores também têm um mixing bom, e combinam com esses designs e suas expressões. Infelizmente, em alguns momentos dá para sentir os atores querendo forçar um sentimento para replicar do original, que acaba ficando esquisito, mas acho que é mais um problema de direção do que de atuação mesmo. Veremos mais sobre isso quando falarmos da história.
Já a trilha sonora claramente se destaca. Temos de volta Akira Yamaoka as refazendo e trazendo ainda mais músicas ambientes que acrescentam à atmosfera para caralho, além de refazer suas trilhas mais melódicas que acrescentam aos momentos-chave. Não tem como rasgar mais elogios, ele manteve sua qualidade nessa trilha sonora e ela continua maravilhosa. A única coisa que teria para reclamar é de novo alguns momentos onde ela fica mixada bem baixa. Além disso, as vezes tocam algumas músicas em locais que não pareciam que eram pra tocar. Em um momento em que estava explorando, começou a tocar a música destinada à morte de um personagem antes mesmo de o conhecermos, o que tira parte do impacto quando chegamos na cena onde era para ela ser destinada.
Teremos mais para falar sobre apresentação, mas agora vamos ver como é jogar Silent Hill 2 Remake.
Atualizando James.
Para as pessoas que estão familiarizadas com jogos atuais em terceira pessoa, aqui não existem tantas novidades. O combate era algo que claramente ia mudar já que temos uma nova perspectiva, mas não é diferente de outros jogos atuais. Você tem um ataque corpo a corpo, um à distância com as armas de fogo, e um botão para esquivar de ataques para vários lados, mas não importa que lado vá esquivar já que você ganha frames de invencibilidade (iframes) absurdos. É mais sobre acertar o timing, em alguns momentos isso vai ficar meio estranho visualmente, mas funciona bem.
As armas que James ganha são boas e relevantes até o final do jogo. Não existe nada que você nunca vai usar. Você pode zerar o jogo usando apenas corpo a corpo, mas sua pistola vai dar conta de todos inimigos comuns e alguns chefes, sua shotgun será ótima para derrubar algum inimigo e focar em outro, e seu rifle será ótimo para chefes ou dar hit kill em algum inimigo chato. Mas isso não é regra, você pode usá-lo de várias outras formas.
Os monstros também foram retrabalhados para encaixar nesse combate novo. Os Lying Figures ainda caem e saem rastejando, mas dessa vez eles tem um ataque que é telegrafado ao invés de só de encostarem em você causando dano no meio do rastejo; o mesmo vale pros Creepers, que mesmo assim acabaram ficando um pouco janky pela maneira que se movem pelas paredes. Perderam um pouco do impacto, algo que é ok para mim, já que era um inimigo chato. Os Prisioners não estão lá, e parecem só ser uma presença scriptada. As enfermeiras tem mais ataques e algumas até fingem fazer um ataque, ou seguram seu ataque corpo a corpo dando mais camadas na luta contra elas. Além dos seus movimentos anormais que ficaram excelentes e dão aquele ar de estranheza igual ao do original.
Mas acho que as mais retrabalhadas foram as Manequins, que agora lutam de uma forma mais ameaçadora; são extremamente agressivas ao invés de ficarem paradas no caminho tentando acertar o jogador. Agora elas pulam em cima de você e desviam de ataques, mas a melhor parte de todas: elas se escondem de você. Direto você vai estar explorando e ver uma passando para poder esconder em algum lugar, ou se deparar com alguma escondida em um canto toda dobrada, até engajar em combate ou mesmo ter uma vantagem sobre você ao te pegar de surpresa. Isso aumenta demais a tensão de ter algo lá te observando. As vezes você vê algo mexer e não sabe exatamente o que pode ser, além de que vai tomar vários sustos ao entrar em um quarto achando que está seguro e tomar uma pernada nas costas. Eu fiquei tão traumatizado que só de ouvir algo que remete ao som dela, aperto espaço no teclado, e as vezes nem tô jogando Silent Hill.
Em Resident Evil 4 remake senti que os inimigos acabavam unindo com o background já que ambos possuem uma tonalidade parecida, sem contar os detalhes extras que acrescentam na ambientação. Em um jogo de ação constante acaba ficando frustrante, mas nesse caso acertaram em cheio, o fato do ambiente ter mais detalhes e ser mais bem feito, além da iluminação limitada, faz as Manequins se esconderem muito bem ao se juntarem com o ambiente, e como elas são muito flexíveis, podem estar literalmente em qualquer canto. Foi de longe o tipo inimigo que ficou melhor na minha opinião.
Infelizmente isso não serve para todos, Mandarim também sofreu alteração mas acabou ficando mais irritante do que interessante, o ataque em si não é um problema e existe um timing certo que tem um espaço para entender como desviar, mas o problema real é que um dos ataques é dar um grito, que faz James ficar com as mãos no ouvido e o trava um tempo. acaba sendo bem chato e, se estiver desesperado para correr, James fica parado até você dar o comando de novo. Eu entendo o intuito de fazer esse ataque e mostrar melhor o que aquele monstro representa, mas na execução só causou estresse, especialmente considerando que enfrentar ela é chatinho. Para derrubá-la no além, você deve atirar em suas mãos, só que se demorar demais ela se apoia de novo; então você derruba uma mão, ela grita, você fica atordoado, e aquela mão volta.
Temos também algumas evoluções de inimigos, como um Lying figure que cai mais fácil, porém despeja ácido em volta de onde morreu, uma enfermeira com ataques mais rápidos usando uma faca, e um manequim que escala paredes e anda sobre quatro patas te atacando, que me irritaram demais e tem bugs únicos pela forma que se movimentam pela parede — mas é legal olhar para o teto e ver várias se movendo tentando escapar da luz ou vindo para cima de você.
O problema é que o jogo começa a enfiar vários inimigos e o combate contra grupos não é nada fluido. Chega a ficar frustrante, já que todos inimigos tem seus tipos de ataques e formas de lutar que funcionavam melhor individualmente. O maior problema é que com a câmera grudada no pescoço de James, você mal vê o que os outros inimigos à sua volta estão fazendo porque está focando no ataque com um e o auto aim do combate corpo a corpo é terrível, focando em coisas que você não quer, resultando em você quebrando vidros ou batendo em inimigos mortos ao invés de bater no que está vivo logo ali. Tiveram vezes que tentei várias vezes quebrar o vidro porque tinha um inimigo morto próximo e o James continuava acertando ele, e as vezes James não quer pisar no inimigo e sim marretar ele. Não é à toa que a conquista de pisar em 75 inimigos está com poucas pessoas, eu estaria bem sabendo que removeram a pisada já que posso enfiar a porrada com algo que parece bem mais forte que o pé de James, afinal, ele não é o Isaac Clark.
As arenas com vários inimigos acabam ficando frustrantes por conta desses problemas mesmo que boa parte seja opcional tirando chefes, a primeira luta e umas lutas rápidas mais pra frente. Se estamos explorando uma loja, podemos ficar cercados com inimigos que nos seguirão até fora dela. Isso traz um dinamismo que curti, como podemos ver o que está lá fora e nunca ficamos seguros só porque carregou uma próxima área. O problema é que podemos ficar cercados muito facilmente, e os inimigos te alcançam muito facilmente também.
Existem métodos para poder se defender melhor, porém é só mais para metade do jogo quando ganhamos a shotgun e uma arma corpo a corpo melhor que os desenvolvedores tiram proveito disso para enfiar ainda mais inimigos para cima de você, e várias armadilhas quando cumpre um objetivo, te deixando cercado de novo. As preparações para uma setpiece são legais! Por vezes vemos vários corpos espalhados e não sabemos se pode ser algo pior que os inimigos básicos ou essas emboscadas, então temos como ter uma ideia prévia de que vai dar merda. Infelizmente, isso nos retorna ao problema de combate contra grupos que venho apontando.
O problema é que, assim como o original, o combate vai ficando repetitivo rápido pela falta de variedade de inimigos, e todo lance do inimigo te agarrar em um quick time event ficou chatinho e sem sal.
Os chefes também foram todos retrabalhados e possuem fases e formas diferentes para enfrentar, todos ficaram legais e combinaram com a nova gameplay, só que teve um em específico que vai deixar um ótimo impacto de surpresa quando você encontrar ao jogar.
A Bloober Team também deu um senso de urgência maior no jogo; no original examinar certas partes ou coletar itens te deixava exposto. Aqui não é diferente, mas agora até conferir o mapa te deixa exposto, então você não vai conseguir parar tudo para olhar onde tem que ir, o que deixa o combate mais no primeiro plano — você terá que limpar uma área para ver o mapa. Apesar dos problemas com o combate esse mapa em tempo real combinou com estilo do jogo. Na pequena sessão que estamos com a Maria eles realmente fizeram ela não atrapalhar. Os inimigos focam em você, não tem como acertar ela sem querer, e em todas rejogadas o único momento que senti que podia acontecer algo com ela é bem curto.
A exploração do jogo teve um destaque excelente. Você tem muitas áreas extras, algumas até exigem formas não tradicionais de entrar, seja por um atalho ou puzzle, que deixa ainda melhor de explorar. Boa parte é recompensador, acho que só pro final começa a não ser tanto, já que você ficará preso em quartos com dois inimigos para pegar duas balas para sua arma. Mas no início é muito legal descobrir uma forma de entrar em um quarto ou loja e ir abrindo gavetas e armários atrás de mais suprimentos, que é algo que temos que fazer já que diminuíram o tanto que ganhamos se comparado ao jogo original, mesmo com o inventário ilimitado. Isso dá mais motivo para explorarmos. Além disso, James agora é um vândalo que quebra vidraças de lojas, vidros de carros e de armários para conseguir algum item. Essa adição te dá uma dopamina rápida… todas essas adições à exploração aumentaram o sentimento de sobrevivência do jogo e pra mim foram muito bem vindas.
O ato de James as vezes passar por frestas ou coisas do tipo serve bem por as vezes esconder loadings, mas as vezes também podem ser atalhos para evitar combate, o que achei legal, deixa o mapa mais aberto para opções. Só algumas repetições me incomodaram, como quando você vai pular em um buraco ou mesmo enfiar a mão em um ou na privada, você tem que ficar apertando a tecla de ação até James fazer, Acaba ficando chato e tira um pouco do tom do jogo original quando da as mesmas ações para ele, de que ele faz porque ele não está mais se importando consigo mesmo. Aqui fica com um tom de “tem certeza?” “absoluta?” “sem dúvidas?” aí pula.
Também temos alguns coletáveis, como os memorandos que são os documentos complementando a história e ambiente, temos também as fotos polaroides, que são legaizinhas, e os echos, que são referências ao jogo original ou até mesmo outros jogos da série. São easter eggs legais, só queria que tivessem menos pois acabam tirando um pouco meu foco. Porém, eles trazem algo a mais: alguns personagens conversam sobre esses echos e têm alguns diálogos que dão a entender que o jogo original aconteceu. As coisas ficam bizarras, e vindo de um jogo igual Silent Hill, dá para teorizar o suficiente até se tornar o Final Fantasy VII: Rebirth.
Bem, não só para essas áreas extras, mas também para progredir teremos que resolver puzzles. Eles são bem trabalhados e divertidos; têm uma dificuldade interessante até você sacar o que fazer, mas você também não vai ficar preso séculos com puzzles que exigem um conhecimento muito fora do padrão como Silent Hill 3 faz quando coloca puzzles no hard. Não são puzzles com designs maravilhosos como de outros jogos, mas com certeza suas simplicidades funcionam bem. Mas existem alguns puzzles que parecem mais uma tentativa e erro que ficaram meio chatos, podiam ter colocado um pouco mais de esforço lá, e se fossem só em áreas extras não iria pesar tanto.
O que é triste é que mudar a dificuldade altera poucos puzzles, e as vezes a solução é a mesma, só localização de algumas pistas que muda e muda bem pouco. Isso era algo que ocorria no original e poderia ter sido melhorado aqui, com todos puzzles sendo diferentes, porque os que são também são divertidos no hard e dão um desafio extra legal, faria com que rejogar no difícil não fosse tão monótono.
E você vai usar do combate, exploração, puzzles e coleta de itens para progredir; Silent Hill 2 faz um ótimo trabalho com sua iluminação para guiar o jogador em pontos de interesse. Como o jogo limita a visão do jogador com névoa e escuridão, a iluminação nos guia de forma natural para objetivos. Direto teremos uma pequena fresta passável sendo destacada com um feixe de luz, ou uma porta para conseguir algum item que está aberta e também bem iluminada. Ainda temos algumas formas de guiar o jogador sem ser por iluminação como faixas, mas no geral você vai saber os pontos de interesse sem sentir que foi entregue demais a ponto do jogo te levar de mão dada até o final. Porém, você também não ficará perdido ou negligenciará aquela pequena área que tinha o último item que faltava para progredir. O único problema no ritmo dessa progressão é que alguns itens ficam muito próximos de onde você terá que usar, o que quebra um pouco a parte de exploração e parece um desperdício não ter usado em outros locais até entendermos onde tem que usar o item.
Eu também disse no começo do texto que o jogo manteve a estrutura do original, mas a expandiu, teremos áreas “novas” que antes podíamos ignorar e nesse jogo temos que passar para ir até o final. Essas áreas adicionais são legais e criam uma progressão orgânica, além de não levarem tanto tempo se você souber o que tem que fazer. Como quase todos puzzles e senhas não possuem o fator RNG, elas vão passar cada vez mais rápido à medida que rejoga.
Porém achei algumas decisões dessa progressão meio esquisitas. De início nós somos incentivados a explorar a cidade para conseguir progredir procurando por itens. Um desses itens está em uma mini dungeon, que serve como tutorial de progressão então, quando chegamos na primeira dungeon e boa parte dela é linear, acaba ficando meio chato. Isso acontece especialmente pois no original havia um momento que ela se abria por completo — eu imagino que sei o motivo pelo qual fizeram dessa forma, que para falar sobre precisaria spoilar, mas acabei não gostando dessa direção. Ainda teremos quartos extras e um momento especifico que a dungeon dá uma pequena abertura para pegar dois itens na ordem que quisermos, só que a linearidade volta logo em seguida e acaba ficando meio repetitivo em outras jogatinas. O bom é que as outras dungeons são bem mais abertas, e o jogo acredita no jogador, então você pode ignorar áreas inteiras por já saber a solução para aquele puzzle.
Todas áreas aumentaram sua duração e sofrem com isso. Elas ficam monótonas já para o final, como a nova área dos labirintos. Essa parte pesa um pouco mais porque o ritmo do original era quase perfeito — tem uma ou outra parte que consigo pensar em simplificar, mas estender tudo isso quebra uma certa dinâmica com os personagens e o mantimento dos mistérios do que está acontecendo frescos na memória.
O diferente caminho até o travesseiro.
Eu já fui para esse jogo aguardando mudanças tanto boas quanto ruins, porém quando finalizei a primeira vez tive o mesmo sentimento que tive assistindo Star Wars: O Último Jedi. Para toda cena que eu gostava, vinha outra que desgostava. isso claramente vai de cada um; eu jogo Silent Hill desde pequeno, então cresci jogando e rejogando esses jogos e fui absorvendo as cenas com novas interpretações ao longo dos anos conforme ia amadurecendo. Eu sei porque me interessei por Silent Hill, e sei porque ele foi melhorando à medida que o tempo ia passando. Eu tenho o costume bem forte de rejogar alguns jogos, então acabam ficando frescos na memória e acabo tendo novas interpretações para eles. Sei muito bem que nenhum remake vai conseguir me agradar 100% nesse aspecto — até Resident Evil 1 remake, que considero melhor que o original, ainda causa esse sentimento, por menor que seja. Mas têm coisas do original que eu era apegado e não estão no remake. Então é obvio que acabei descontente com muitas mudanças. Mas acho que isso vai um pouco além de só descontentamento e também parece uma insegurança ou pressão por parte da Bloober Team de inserir um novo tom à história (que eu ficaria mais satisfeito), mas tentando reinserir o tom antigo nessa nova direção.
O jogo segue a mesma premissa do original e também reflete sua progressão: conhecemos os personagens, conversamos com eles, vamos aprofundando o porquê James está ali junto com esses personagens, e isso tudo funciona! Ainda temos a revelação tão famosa, ainda temos as cenas importantes, mas houve uma mudança de direção, sendo algo mais direto ao ponto e uma atuação com mais naturalidade que altera parte do tom do original, mas mesmo assim acaba combinando com esse realismo todo. Isso é algo ok para mim, mudar o tom ou a direção não a torna necessariamente ruim. Alguns personagens criam uma ligação mais direta com James no remake e existe um trabalho a mais colocado nele para parecer o mais esquisito ali que está tentando mostrar que suas ações são as de uma pessoa sã, com bordas de insegurança transbordando à medida que ele fala. E esse tom foi adotado pelo jogo todo; ao invés de itens-chave esquisitos, eles são mais objetos corriqueiros, ao invés de você ir devagar para a noite em conjunto da ida para o mundo pesadelo que vai aparecendo aos poucos à medida que vai avançando, você já ganha um mundo pesadelo logo de início estabelecendo que é algo comum. Não vemos restos de surrealismo no mundo comum até chegar no mundo pesadelo, mais uma vez em prol de ser mais direto e mais natural. Provavelmente tomaram essa atitude para combinar com esses gráficos atuais e não gerar tanta estranheza quando saímos de um apartamento para um lugar incompreensível. Tira um pouco o senso de escala e de que estamos se aprofundando na mente de James para descobrir tudo, mas nos dá mais áreas interessantes para investigar.
Seguindo essa ideia de ser algo mais direto, James agora vai conversando enquanto o jogador está no controle dele. Isso claramente deixou as coisas mais reais do que ele esperar a cinematic para falar algo. Maria se mostra mais curiosa sobre James, e reage à certas coisas, como James salvando ela, sendo vândalo, indo nas direções erradas ou em alguns momentos da história, além de o ajudar um pouco. Nada do tipo entregar soluções de puzzles, apenas dando um norte em uma parte de um objetivo e algumas dicas simples como pegar um mapa caso tenha ignorado. Nada demais e nada que fica irritante para o jogador. Eu estava com medo de virar aquele personagem do jogo que segura sua mão, mas esse jogo rejeitou parte dessas ideias, até na parte que fica desarmado não se torna um “não pode ser visto se não morre”, algo que combina com alguns jogos, mas em um jogo do estilo de Silent Hill 2 só ficaria esquisito.
Tivemos mudanças em seções scriptadas, como a Laura, que sempre foge de James no remake, o que dá um senso maior que sempre estamos muito próximos de encontrá-la. Assim, alguns scripts para progredir fluem de forma mais orgânica, só fica bizarro quando James está correndo atrás de Laura falando para ela esperar porque ele é do bem no mesmo segundo em que coloca cartuchos na shotgun.
O icônico monstro Pyramid Head ganhou mais presença em Silent Hill 2 remake, algo que não me incomodou, porque ainda são momentos legais que encaixam com suas aparições. Eles me mantiveram tenso e não se estenderam demais em prol de usar a imagem mais famosa do jogo. Além de as vezes termos dicas de que ele está por vir, o que cria uma certa tensão em algumas partes e utiliza dessa noção para causar insegurança no jogador.
Eles também adicionaram dois finais novos em cima dos seis que eram presentes no jogo original, o que faz a gente ter mais motivos para rejogar. Eu gostei deles, não tem um impacto tão grande quanto outros, mas ainda funcionam bem, uma pena que são apenas para Novo Jogo +. Também mudaram a forma que você alcança todos os finais para torná-los mais naturais. No caso de alguns dá para perceber que você está indo para aquele final caso saiba da existência dele, outros são mais sutis, mas no geral funcionam bem e condizem muito bem com os finais que vamos pegar. Os diálogos dos finais também sofreram algum tipo de alteração e em sua maioria também condizem com o final que está tentando pegar, além de justificar melhor a luta final do jogo, mesmo que alguns finais explicam exatamente o que você vai fazer — mas ainda assim não fica fora do tom do jogo quando estamos nesse momento.
Então até ai tudo certo com algumas esquisitices que dão para passar despercebidas, só que esse novo tom e direção também causaram alguns problemas. Alguns menores tipo no diálogo com Eddie, onde não temos a dica de que ele e James veem monstros diferentes; aqui no remake é implicado que eles veem outros mais fortes. Sem contar a tentativa de recriar diálogos 1:1 com o original que não combinam com a direção nova ser mais direta e naturalista, o que causa uma desarmonia no fluxo da narrativa. Se eles tivessem abraçado 100% esse novo tom, provavelmente ficaria melhor, mesmo com os problemas que carregaria.
Se fossem apenas os problemas dessa nova narrativa, não iria chamar tanta atenção, mas algumas mudanças geraram estas bizarrices e ainda temos muitos momentos que tentam replicar a direção narrativa do original. Eles acabam ficando destoantes quando comparados ao que o jogo apresentou até agora. De início parece que são os atores que não estão entregando bem, mas realmente é a direção, que trás um naturalismo e valoriza o mundano. Assim, algumas evoluções de uns personagens acabam ficando esquisitas e sem nexo, como se fosse apenas uma brincadeira. Claro que nem tudo foi ruim; a evolução da Angela e a forma que Eddie cria um conflito com James ficam mais aparentes e ficaram excelentes. James também demonstra mais suas inseguranças e ele ganha um certo destaque nessa atuação pela forma tão diferente de agir comparado com os outros personagens, enquanto no original era ao contrário.
No fim, Silent Hill 2 Remake é um jogo bom de se jogar, com visuais incríveis, mas fico triste com essa constante mudança de tom em prol de manter as coisas muito próximas o original. O principal motivo que sempre joguei Silent Hill é pela história. Apesar de amar a gameplay, acho a história é muito bem contada mesmo com momentos que não cabem tanto, e por mais que amei jogar Silent Hill 2 Remake várias vezes para ver todos finais; considerando o combate repetitivo, puzzles iguais, uma linearidade em algumas partes que se estendem demais, e uma insegurança na narrativa por insegurança, quando eu for rever a história de James será pelo o original e não pelo remake de 2024. Talvez rejogar só algumas partes especificas…
E claro, vem o fato de que o remake de Silent Hill 2 veio antes do 1, que é mais antigo e está até hoje preso no Playstation 1, além da Konami não parecer ter nenhum plano em relançar os clássicos em alguma coletânea como foi o caso do Metal Gear Solid, que agora são acessíveis. O que me deixa um pouco chateado é que existe um esforço e um dinheiro violento sendo gasto para refazer esses jogos que funcionam bem já ná época que foram feitos. Mas, muitos jogos a frente de seu tempo e muitos limitados pela tecnologia se favoreceriam de um remake, mas ficam presos para sempre em suas plataformas originais. Sem contar que a Konami correu para refazer apenas os mais famosos da série (Metal Gear Solid 3 também foi cotado para um remake antes de seus antecessores) e nem seguiu uma linha lógica, como Dead Space e Resident Evil fizeram mesmo tendo muitos remakes que também considero de certa forma desnecessários.
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