Nessa altura do campeonato, não há um shoot ’em up que não ao menos levante minha curiosidade. Sophstar lançou originalmente para PC em fevereiro como um daqueles mais especificamente throwback. Nada de bullet hell aqui, apenas balas e inimigos rápidos e erráticos contra suas diversas escolhas de naves especializadas. O título então foi lançado para Switch, Xbox e Playstation em outubro. Por mais que a versão não venha com conteúdo extra, ela já inclui as atualizações feitas na versão de PC.
Olha que curioso: ele é um jogo Brasileiro! Sophstar também é o primeiro do estúdio Banana Bytes, que já prova seu imenso potencial em sua primeira tentativa com o gênero tão nichado e complicado de ser desenvolvido. Eu nem sabia que ele era brasileiro até ver a versão de console lançar, pois isso não foi um ponto chave do marketing. Tinha o encontrado com o vídeo de Kanzaki Shintarou fazendo 1cc do jogo na dificuldade brutal. Shintarou é um Youtuber e agora desenvolvedor de jogos que ama se aprofundar nos jogos mais velozes (e por vezes alguns dos piores também) do gênero. O vídeo me impressionou tanto pela execução da run quanto pela pura intensidade do jogo, que parecia ter um sistema de pontuação interessante. Ou seja, isso acabou com eu querendo falar de Sophstar.
Sophstar se preocupa principalmente com seu admirável objetivo de trazer uma experiência arcade sólida com suas próprias regras e flow, mesmo que acabe afastando o público geral de si mesmo. Esse é meio que o objetivo da maioria dos shmups, um gênero tradicionalmente iterativo e ainda fiel ao legado dos arcades, provavelmente por se encaixar tão perfeitamente com o formato. O jogo não precisa trapaçar com aparição repentina de inimigos ou hitboxes grandes para o seu personagem, pois a dificuldade de um shmup já faz esse trabalho de graça, e ainda adiciona profundidade que não poderia ser replicada com um ataque inimigo injusto que te custou uma ficha e já fica manjado. Eu mencionei esse mesmo conceito no meu texto de Hazelnut Hex, então vou mantê-lo breve assim mesmo aqui.
De qualquer forma, a visão arcade não é a única que o gênero cobre. Alguns jogos como Radiant Silvergun, NeverAwake e até o (extremamente underrated) PANDARA também encaixam uma história que adapta as mecânicas do jogo para funcionar em prol dela. Os dois funcionam, mas a abordagem com alternativas concentradas em uma narrativa tem mais espaço para experimentos e ideias diversas surgirem do que a de criar uma experiência estritamente arcade. Por exemplo, a maneira que PANDARA entrega sua história é não ortodoxa e bizarra, então tudo bem a força do roteiro e das mecânicas principais não serem das melhores. Agora, no caso de Sophstar, ele pode ser inevitavelmente comparado a décadas de jogos do gênero, desde Raiden até, sei lá, Witch-Bot Meglilo, The Tawashi, Mecha Ritz (admitidamente exemplos estranhos, mas é o que conheço haha), etc…
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No caso de Sophstar, as mecânicas que ele coloca como carro-chefe são o teleporte e seu sistema de pontuação, que pode dar até 1000 pontos extras se você pegar o quadradinho verde que rapidamente diminui de tamanho em valor. Não importa o tamanho ou pontos de vida do inimigo, todos eles vão soltar apenas um deles. Ou seja, é algo que entra muito em jogo com os inimigos “pipoca” que vêm em grandes quantias e morrem quase instantaneamente.
Mas vamos com calma e falar do teleporte primeiro. Essa mecânica já foi explorada em outros jogos do gênero, mas os únicos que vêm à minha mente (ainda não sou uma enciclopédia de shmups, me perdoe) são Zangeki Warp e Witch-Bot Meglilo, ambos da Astro Port. Em Meglilo, a mecânica é tão indispensável para sua sobrevivência que funciona sob uma barrinha de energia e substitui o que seriam bombas em outros jogos. Muitos ataques foram feitos especificamente para serem evadidos dessa maneira, principalmente nas dificuldades maiores.
Agora, eu não vou comparar isso diretamente com a de Sophstar. São jogos diferentes com objetivos diferentes, afinal. Mas vale dizer que a mecânica de teletransporte de Sophstar é mais uma ferramenta de evasão de emergência apenas. Os padrões de bala inimigos as vezes até fazem a mecânica ser perigosa se você acabar teleportando pra cima deles, o que adiciona uma camada de estratégia legal. Já que cada nave tem um tipo diferente, alguns até aleatórios, isso fica ainda mais excacerbado. Eu não vou falar mal do sistema, mas posso dizer que esqueci da existência dele em algumas das minhas runs por serem muito situacionais.
Por outro lado, temos o sistema de pontuação, que é muito viciante. Os já mencionados quadradinhos verdes te incentivam a basicamente grudar nos inimigos pra tirar proveito da falta de hitboxes físicas deles e pegar os negócios assim que puder. Eu ainda não sou bom o suficiente pra meter 1cc em todo shmup que jogo sem muito treino. Tenho alguns, mas nada demais. Boa parte de minhas runs são focadas em pura sobrevivência, então aprecio quando o sistema de pontuação me ajuda a pegar vidas extras regularmente também ao invés de uma vez no jogo todo. Claro, isso não significa que os veteranos buscando pontuação vão ficar com fome, muito pelo contrário. Runs como a que eu mencionei do Shintarou demonstram o quão sólido Sophstar é para esse fim.
Mas de qualquer forma ainda tem duas coisas que machucam um pouco o fator replay do jogo para mim… Uma delas é o ritmo. No geral, shoot ’em ups duram entre 20 e 40 minutos por run, e daí as horas e horas de jogo que você vai potencialmente dedicar à um vêm da rejogabilidade. Sophstar não foge disso; cada run dura uns 35 minutos, que é um só um pouco mais longo que o comum. O problema é dentro das próprias fases: elas pecam em espetáculo visual. Tem momentos que você fica um período estendido de tempo só matando inimigos “pipoca”, ou só avançando num ritmo lento demais. Isso é um problema principalmente nas primeiras quatro (das oito no total!) fases e vai esvaecendo conforme a dificuldade aumenta. A resposta para uma crítica dessas pode parecer “só coloca numa dificuldade maior”, mas como qualquer outro shmup, Sophstar tem um aumento de dificuldade enorme nas suas últimas fases, então deixar a dificuldade no Brutal só vai deixar sua vida impossível. Por mais que as naves sejam balanceadas entre si, as fases em si são desiguais demais.
Por último temos a falta de upgrades para seu tiro. Não tô dizendo que era pra ter, mas sim que continuar com o exato mesmo estilo de tiro pro jogo todo com a nave com tiro homing, por exemplo, dói a alma. Tem algumas naves que escalam tão mal com o tempo que eu me arrependi de começar uma run com elas. A homing foca no inimigo que está ao contrário de onde você está mirando também, o que não ajuda. O problema aqui não é nem balanceamento — elas aguentam várias situações — mas claramente existem algumas vencedoras como a Reyka, que é versátil, rápida, possui uma bomba como tiro secundário e dá dano pra caramba.
Eu gostei da minha experiência com Sophstar e suas ambições arcade fazem dele indispensável para quem ama o gênero e busca a perfeição, mas até para alguém no meio da escala de habilidade como eu ele peca em ganchos para manter o interesse de quem ainda não comprou todas as mecânicas. Para quem é um completo iniciante, o jogo ainda te entrega alguns continues extras conforme você vai dando game over, mas eu não sei o que faz você desbloquear um novo e, bem, vão demorar umas boas tentativas pra você conseguir terminar a dificuldade intermediária se for inexperiente com o gênero. Quanto melhor você fica, mais continues o jogo te dá num nível sistêmico. Meio contra-intuitivo, não? Ok, pra mim tudo bem ser assim pois eu já comecei Sophstar com a expectativa de fazer um monte de runs, mas fica difícil de vendê-lo para um iniciante com esse ritmo, ainda mais quando a dificuldade mais fácil chama “Infantil”.
Mesmo assim, desejo tudo de melhor para a Banana Bytes em seus futuros projetos, e mantenho minha recomendação para jogadores amantes de sistemas que não ligam tanto para a falta de espetáculo. Sophstar ainda pode brilhar nas mãos certas.
Uma cópia gratuita de Sophstar para Nintendo Switch foi concedida pela Red Art Games para análise no Recanto do Dragão.