Atomicrops = Stardew Valley + Minecraft (Análise)

Na minha vida já passei por algumas experiências bem diferentes nos games, desde jogos sem sentido até obras espetaculares que facilmente estariam disponíveis no Museu do Louvre caso o mundo dos videojogos tivesse um reconhecimento da sua relevância à altura que realmente merece na sociedade atual.

Dentro deste grande cenário das centenas de memórias que tenho envolvendo essa obra da humanidade, Atomicrops conseguiu um lugar definitivo na minha prateleira “é bom, mas falta algo”.

Já adianto, este roguelike (gênero no qual a morte é algo recorrente e a repetição de cenários com elementos aleatórios faz parte da experiência) não conta com um roteiro super bem escrito, como no aclamado Hades, nem tão pouco apresenta uma jogabilidade satisfatória e rica como em Dead Cells.

Porém, Atomicrops apresenta uma escala de diversão no grau certo para players que buscam por um bom jogo do gênero e não querem perder tempo criando builds enormes e se preocupando com qual inimigo irá enfrentar no próximo cenário.

Sua gameplay é simples, e talvez esse seja seu grande diferencial. Dentro disso, apresentarei a seguir alguns dos pontos que se mostram relevantes para você que quer embarcar no mundo radioativo de Atomicrops: um Stardew Valley que se passa em Chernobyl.

Uma fazenda incomum e radiante (em múltiplos sentidos)

Logo que resolvi experimentar Atomicrops, me surpreendi em poucos minutos. Afinal, minha expectativa para o jogo era que ele seria um dungeon crawler ou um roguelike genérico.

Porém, sua progressão em meio a um cenário pós apocalíptico se fez presente dentro de uma perspectiva inesperada que me prendeu facilmente durante as primeiras horas de jogatina.

Atomicrops
No começo do jogo, tudo é bem tranquilo e nada aterrorizante.

Dentro do cenário onde o roteiro se passa, tudo indica que houve uma explosão nuclear em alguma cidade parecida com Texas ou qualquer outro lugar que tenha o estereótipo de fazendas gigantes com gente armada até os dentes.

Nosso personagem foi, aparentemente, o único sobrevivente da catástrofe. Sendo assim, cabe a nós, os jogadores, reconstruir a fazenda ao realizar algumas tarefas que me lembraram bastante do bem sucedido simulador de fazenda Stardew Valley.

Durante o dia, temos a árdua tarefa de colher grãos, equipamentos e fazer plantios na nossa horta. Para isso, o jogador é obrigado a explorar o cenário, que conta com algumas “ilhas” repletas de inimigos.

Cada grupo de inimigo pode largar no chão sementes, picaretas (para quebrar e arar a terra), um bônus e mais outros pequenos fatores que podem auxiliar no cultivo das suas plantas.

Já durante a noite, você terá que interromper a exploração e voltar para a horta, já que inúmeros inimigos (geralmente divididos em três rounds) irão querer acabar com tudo que você construiu.

Vale dizer que os inimigos não são nada comuns. É necessário estar preparado para dar tiros em coelhos mercenários, árvores cuspidoras de fogos e mais um trilhão de coisas naturais-mas-não-tão-vivas que adquiriram vida e vontade própria após a radiação.

Nossa própria horta adquiriu vida após o acidente.

A ótima inteligência artificial

Me senti obrigado, inclusive, a destinar um único tópico desta análise exclusivamente para a ótima inteligência artificial dos inimigos.

Em jogos desse tipo (que eu costumo definir como “jogos onde só quem joga sabe o que está acontecendo na tela”), é comum que nossos adversários programados apenas avancem e atirem sem parar, como uma verdadeira mistura de Rambo com Tony Montana.

Porém, ao contrário da minha perspectiva diante de outros roguelikes ou jogos do tipo, que envolvem turnos de milhares de inimigos, todos os “diabólicos seres da natureza” presentes em Atomicrops possuem uma inteligência surpreendente.

Além de serem únicos em todos os sentidos (design, armas utilizadas, objetivos, maneiras de locomoção, velocidade e outros aspectos), eles agem em bandos e, graças à eficácia dos desenvolvedores, conseguem demonstrar esperteza nas tomadas de decisão dinâmicas.

Foi comum ver inimigos correndo para muito longe ao se depararem com meu personagem atirando sem parar em suas direções, ou até mesmo se esconderem em partes do cenário onde, na teoria, seríamos incapazes de enxergar (isso não acontece se levarmos em conta que o campo de visão do player sempre é favorecido).

Por fim, não são apenas os inimigos que foram programados com máxima responsabilidade e carinho. Neste game, podemos ter a presença de aliados em batalhas e animais responsáveis por cuidar da nossa plantação.

Enfim… Casados

Ainda fazendo um paralelo com Stardew Valley e permanecendo no tema de inteligência artificial, como eu mencionei ao fim do tópico anterior, em Atomicrops poderemos evoluir relações com aliados e até mesmo… casar.

Eu sei. Atualmente, não são todos os seres humanos da face da Terra que procuram um parceiro ou parceira para viver o resto da vida ao seu lado. Mas digamos que, quando enfrentamos ondas gigantescas de animais inteligentes e armados, uma mão amiga sempre será bem-vinda.

Diante desse ponto de vista, procurar por uma pessoa (que pode até ser um não-humano) para defender sua horta é algo crucial, mas nada simples de se fazer no jogo.

Ao contrário de The Sims, ou até mesmo Stardew Valley, em Atomicrops não temos que partir para alguns minutos de diálogos que servem como pretexto para sua óbvia intenção. Neste game, construímos nossas relações com bases em presentes (assim como no já citado inúmeras vezes jogo de fazenda) que vão evoluindo o grau de amizade. Concordo que essa parte não é extremamente bem trabalhada, porém, o que mais importa é ter um ser que esteja lutando ao seu lado na guerra.

Além do casamento, o jogo fornece outros aliados que ajudam no seu dia a dia, como vacas que molham a horta, abelhas que deixam tudo fertilizado, drones que te acompanham nas explorações, porcos que aram a terra e mais um turbilhão de opções inteligentes estarão disponíveis durante sua jornada.

Faça sua festa, jovem fazendeiro

Depois de alguns minutos explorando durante o dia e defendendo durante a noite, me questionei se era só isso que o game tinha a oferecer. Mas, ao contrário do que eu estava pensando, não, não era só isso em que o jogo se baseava.

Óbvio, tinha que ter algum objetivo central para você vender suas plantações e poder sobreviver a cada ciclo do jogo (que se baseia nas estações do ano, cada uma dividida em três dias e três noites).

Ao fim da estação, você é levado para uma espécie de mercadão na cidade principal onde o jogo se passa. Lá você poderá conhecer seus parceiros, falar com a prefeita sobre suas colheitas, trocar de armas, comprar upgrades e fazer mais algumas negociações que mudam pouco o aspecto da jogatina.

A venda é automática, o que faz com que sua mente queira que você plante o máximo de sementes possíveis no menor tempo disponível.

E a mecânica que eu mencionei sobre a prefeita é, pelo menos ao meu ver, o principal objetivo do game, perdendo apenas para o de terminá-lo ou recomeçar com algum upgrade que poderá auxiliar contra os inimigos cada vez mais fortes e espertos.

Sua principal função é estabelecer o mercado de compras e vendas de itens da cidade, ou seja, já que sua fazenda é a única ainda de pé, nosso personagem é o único que consegue circular a economia desse “Texas” fictício.

Inclusive, a cada fim de ciclo, sua conversa com a prefeita é o que mantém toda a colheita da sua horta ativa. Assim, tudo que foi coletado durante os três dias de cada estação será trocado por diversos benefícios garantidos pela mulher que controla a cidade do jogo.

Diante disso, o sistema de recompensa acaba sendo muito forte e altamente satisfatório. A sensação de ter feito um trabalho bem sucedido durante os dias de batalha e chegar na cidade carregando diversos itens que serão trocados por aliados, bônus de níveis e outros fatores cruciais na sobrevivência coçam a parte certa do cérebro.

Atomicrops é cansativo como um roguelike não deveria ser

Já evidenciei como o jogo vai levando o sistema de progressão e evolução de fases. Mas, é válido destacar que tal fator é prejudicial a partir de certo momento do gameplay. 

Atomicrops se passa por “10 anos”, ou melhor dizendo, 10 fases. Cada uma delas possui quatro estações que duram cerca de 10 minutos cada. Claro, a duração que passei em cada um dos anos foi se elevando graças ao sistema progressivo de dificuldade.

Porém, imagine a seguinte situação: levando em conta que os primeiros três anos levaram cerca de 2 horas e meia para serem concluídos, o restante poderia ser finalizado em 10 ou 15 horas (chutando para mais porque a dificuldade vai progredindo). Porém, a dificuldade se eleva muito inesperadamente…

Não que isso seja ruim, longe disso. Um jogo precisa ser minimamente difícil, ainda mais se tratando de um roguelike. Entretanto, a curva que leva o Atomicrops de um jogo casual para um verdadeiro desafio é quase que instantânea.

Resumindo, demorei 12 horas para chegar no sétimo ano, e ainda faltavam mais três anos que seriam angustiantes tendo em vista a pouca mudança de cenário. Na verdade, o cenário tem uma adaptação muito mínima. O que realmente se destaca conforme o jogador avança são os inimigos, esses sim se modificam de um jeito extremamente desafiador e, na minha opinião, muito bem feito.

Atomicrops
A única mudança durante os anos é o tamanho da sua plantação, que vai progredindo lado a lado com sua habilidade no game.

Mas sim, no geral, tudo se torna bem repetitivo e cíclico, de um jeito que me fez enjoar de todo aquele mundo texano depois da marca das dez horas de jogatina. Era sempre a mesma história, com poucas mudanças, e o número de fatores que me faziam continuar jogando por horas e mais horas só diminuía.

Conclusão: Atomicrops mostra como recompensas são uma maneira ilusória de te prender em ciclos infinitos¹

Eu sou um apaixonado por esportes. Futebol, futebol americano, fisiculturismo, tênis e Fórmula 1. Estes esportes fazem parte da minha vida desde que me conheço por gente. Tal paixão fez com que em 2020 eu resolvesse apostar algumas fichas (ou melhor, dinheiro) no mercado de apostas esportivas.

Talvez se eu tivesse estudado mais esses jogos, ou até se tivesse me dedicado mais, teria conseguido ganhar algo com isso; afinal de contas, já vi vários exemplos na internet de gente que ganha quantias boas de dinheiro em tal mercado.

Porém, chuto que perdi cerca de R$ 400 nesse meio. Óbvio, não culpo ninguém, entrei por conta própria e perdi meu dinheiro. Agora você deve se perguntar o porquê de eu estar lhe dizendo isso, certo?

Bom, o mercado de apostas esportivas é altamente viciante e recompensador, fato que faz com que você queira apostar cada vez mais, mesmo que a cada 10 apostas você ganhe apenas duas.

Estas pequenas vitórias que fazem seu patrimônio acumular e crescer te estimulam a, de novo, depositar mais e mais dinheiro. E sim, estou falando não só de mim, mas de várias pessoas que infelizmente se tornam viciadas em mercados de jogos de azar.

Diante disso, eu coloco tal mecânica frente a frente com o jogo Atomicrops. Seu sistema de recompensas a cada final de ciclo é muito satisfatório. Ele condiciona seu cérebro a querer jogar mais e mais, fazendo com que você não se importe se terá que enfrentar os mesmos inimigos ou ficar olhando para um cenário quase igual por mais duas ou três horas.

Atomicrops
Além do dinheiro da prefeita, os itens que são dados após trazer diversas plantações para a cidade garante que o jogo fique bem mais equilibrado.

Não quero dizer algo negativo quanto ao game, longe disso, já falei e repito: Atomicrops é divertido e instigante, te faz querer revisitar o cenário e progredir gradualmente com suas armas e companheiros.

Porém, tal fator de repetição chega a ser excessivo, deixando-o com uma gameplay que, a partir de certo momento, se torna algo bem superficial e desencantador, já que, assim como as frutas e verduras da fazenda, tudo perde seu frescor depois de um tempo.